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terça-feira, março 31, 2009

Escolas públicas para a Classe A

Luiz de Aquino

 

 As cenas são chocantes, e não são cenas de cinema, não… Flagrantes da vida real colhidas em câmeras de vigilância, ou câmeras ocultas de repórteres investigativos ou ainda de telefones celulares, exibidos pela TV Record em seus telejornais devem se tornar temas de reuniões nos ministérios da Educação, em conjunto com as secretarias estaduais, e da Justiça, envolvendo a Polícia Federal e as coordenadorias de segurança pública que se relacionam com as polícias civis e militares.

O sistema nacional de Educação deveria levar a sério a formação e a valorização de professores. Por ter relaxado na qualidade e na fiscalização, as escolas superiores recebem alunos mal preparados nas esferas de base e média. Como resultado, temos vestibulandos que entendem profundamente de teorias de física quântica, mas não têm a menor noção de regência de verbos e substantivos, para ficar no mínimo; e profissionais de nível superior totalmente despreparados – haja vista os exames da Ordem de Advogados do Brasil.Ah!, as instituições que realizam concursos de empregos nas esferas públicas deviam divulgar as “pérolas” colhidas em suas provas, tal como se faz com o Exame Nacional do Ensino Médio.

Há dias, um médico de alta especialização, orgulhoso de seu trabalho no Hospital de Urgências de Goiânia (HUGO) definiu a otimização de resultados: “O HUGO dá certo porque lá são atendidos os acidentados de qualquer nível sócio-econômico; se atendêssemos somente pessoas do povo, gente anônima, o Hospital não teria a estrutura que tem”, disse-me ele. “Viajei” imediatamente para a Educação. Ele, o médico, foi também aluno do Liceu, como Ciro Palmerston, Mário Alberto Campos, Beatriz Siqueira, Martha Azevedo, Moema Olival, eu e os presidentes do Banco Central Gustavo Loiola e Henrique Meireles (e mais os governadores Irapuan Costa Júnior, Iris Rezende Machado, e Alcides Rodrigues).

Vejam que ,no parágrafo anterior, a única pessoa grafada em minúscula foi “eu” - construção atrevida, esta, não é mesmo, Leda(ê) Selma? -. Foi proposital. Citei pessoas importantes, mas este escriba é gente do povo, filho de uma professorinha leiga (coisa comum em Goiás daquela época: cada um ensinava o que sabia) e de um comerciário. Como se vê, a gente se misturava, meninos do povo com os da classe dominante. Alguns do povo tornaram-se poderosos, como os governadores citados; e alguns de famílias de realce não construíram seus nomes. Mas a possibilidade de convívio abriu horizontes.

Dona Umbelina de Matos, minha professora de Geografia no Colégio Pedro II em 1961, diz, com propriedade e mais de meio século no ofício do Ensino, que foi um grave erro construírem escolas e postos de saúde nas favelas. É que, antes, os favelados vinham às escolas e postos de saúde em que iam também os que tinham referências, e assim se criava a convivência. Após o advento dos CIAC E CIEP, ficou decretada a segregação.

O  pior é que as classes dominantes, com espírito de segregação, tiraram seus filhos das escolas públicas. Com isto, não havendo força na voz das classes menos favorecidas, esculhambou-se o calendário, com greves e mais greves, porque os governantes, não tendo seus filhos nas escolas dos governos, pouco se ocupa da qualidade profissional e da valorização dos educadores.

Estranhamente, os professores das escolas particulares são os mesmos da rede pública. Muitos têm dois empregos (um público, outro privado) mas tratam os alunos de modo diferente. Em Goiás, bom exemplo é o dos colégios da Polícia Militar: os mesmos professores, lecionando para clientelas do mesmo nível social, dedicam-se mais nos da PM do que nos colégios da Secretaria da Educação, porque há (ou, ao menos, havia) uma gratificação extra que praticamente dobrava os salários.

Agora, leio que o senador Cristóvão Buarque propõe, no Congresso, a obrigatoriedade de os políticos eleitos, executivos e parlamentares, nas três esferas de poder, manterem seus filhos em escolas públicas.

Estejam certos, leitores. Se isso acontecesse, teríamos nas escolas públicas a mesma qualidade que se tem no HUGO. Certamente, haveria qualidade no ensino e segurança para estudantes e professores. E, sem dúvida, os salários dos profissionais da Educação não seriam tão aviltados.

 

 

Luiz de Aquino é jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras. E-mail: poetaluizdeauqino@gmail.com.

sábado, março 28, 2009

Visita ao ontem

Luiz de Aquino

 

De novo, a visita aos meus arquivos e a exposição de velhas falas. A crônica abaixo, publicada no DM, em 13 de abril de 2001,mexeu com minhas lembranças. E neste final das águas (que foram poucas), começo de uma nova estação de seca e de flores, gostei de reviver  aqueles momentos.

Bem... Vou dar vez ao tempo:

 

Orgasmo de cor e beleza

 

Nas últimas semanas, estou dedicado à leitura e redação de uma monografia, exigência para o término de um curso que faço, à distância, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Pois bem: viciado no tema, dificilmente converso sobre outra coisa. Vai daí, conheci a professora Jaires Bravim Vitorino, de Aimorés, Minas Gerais (incrível essa minha afinidade com Minas; terra de minha mãe, de estirpe italiana, mas orgulhosa do torrão de Tiradentes e Drumonnd). Deu para sentir que ela é “viciada” em educação. Em poucas palavras, deu-me inúmeras dicas, citou-me vários autores e passou-me uma breve bibliografia. Ênfase para Rubem Alves, educador respeitável, autor de inúmeras obras, tanto no âmbito da educação quanto da literatura infantil.

Numa livraria local, encontrei “Entre a ciência e a sapiência”. Jaires me enviou, pelo sedex e por empréstimo, alguns livros do guru. Agora, finalmente, achei o ponto de partida para a monografia e, com isso, meu feriadão da Semana Santa está compromissado, nada de Pirenópolis ou Goiás Velho, mas meu minúsculo escritório, dedos sobre o teclado e algumas dezenas de livros abertos, previamente demarcados, juntando conceitos e citações na montagem do texto final.

Os primeiros textos de “Entre a ciência e a sapiência” têm forma de cartas. Cartas a ninguém menos que Roberto Marinho, o todo-poderoso do sistema Globo. Vejam que pérolas, colhidas na primeira carta: “O senhor já notou que os ipês florescem no inverno? Sabe por quê? No inverno é frio e seco. As árvores ficam com medo de morrer. Por isso produzem flores e ejaculam sementes ao vento. Antes de morrer, um grande orgasmo de cor e beleza. Querem plantar suas sementes no ventre da mãe-terra”.

Que coisa linda! A última frase deixa claro e indiscutível que, na natureza, não há incesto – as árvores plantam sementes no ventre da mãe-terra. Mas é também de incomparável beleza a imagem do orgasmo de cores que são as florescências não apenas dos ipês, mas de tantas outras árvores que, ao fim do outono, explodem de cores o marrom dos cerrados que só reverdecem quando a primavera permite as chuvas que vão marcar o verão.

Batista Custódio, o dono do Diário da Manhã, é fanático por natureza – haja vista o jardim que enfeita nossa sede e o tratamento que ele dá à sua fazenda em Baliza, lambida pelas águas do Araguaia e regurgitando de vida natural simplesmente porque ele decidiu que ali não se mata nem se extrai. Quando, há uns seis ou sete anos, Batista decidiu pelo jardim na sede do DM, contou-me de um diálogo com um peão na fazenda: “Não vou mais trabalhar pro senhor, minha mulher não quer”. Ele quis conhecer as razões da mulher do peão. “O senhor quer que eu mexa com flores, isso é coisa de fresco”.

Coitado! Jamais vai saber que as flores são a genitália das plantas...”.

 

 

 

Luiz de Aquino é escritor e jornalista, membro da Academia Goiana de Letras.

E-mail: poetaluizdeaquino@gmail.com

quarta-feira, março 25, 2009

Nada mudou, nada muda...


Nada mudou, nada muda...


Luiz de Aquino

 

Visitando velhos arquivos, entre as matérias do meu punho publicadas no DM, em 1994 e 95, destaquei esta: “Um novo visual para a Cidade”. Era uma entrevista com o então presidente do Iplan (Instituto de Planejamento Municipal, hoje Secretaria de Planejamento), Sebastião Juruna. A seguir, trechos pinçados da tal matéria:

 

“Era o tempo em que reinavam solenes o Lanche Americano, o Restaurante Acapulco o Cine Casablanca (frequentado por famílias e até pelo fundador da Cidade) e o Samburá, todos na Rua 8, pedaço hoje conhecido como ‘Rua do Lazer’; o Tip-Top e o Café Central, ainda o centro de referências para políticos e intelectuais, na Rua 7; o Bazar Oió (do casal Francisca e Olavo Tormin) era a livraria preferida, seguido de perto pelo Bazar Municipal e Livraria Figueiró. Na Rua 3, (...) ponteava a Ciclone Turismo, de Valdir Frauzino, eternamente de gravata borboleta.

Os canteiros centrais da Avenida Goiás, da Praça Cívica à Estação Ferroviária, era todo ajardinado (quando prefeito, Pedro Wilson restabeleceu os jardins da Avenida Goiás) e o Grande Hotel ainda ostentava a solenidade dos tempos em que hospedara expoentes como Getúlio Vargas e Pablo Neruda. Era a Goiânia boêmia, imortalizada por Jesus de Aquino Jayme em seu Cometa de Halley e cuja primavera, que fazia elevar sobre as cabeças humanas uma alcatifa de flores flamejantes, foi cantada por Ieda Schmaltz num poema antológico: Goiânia, convite e roteiro.


(...)

E aí veio, então, a proposta do Iplan para o Centro, que descrevi mais ou menos assim:

“A lista de intenções do Iplan não é muito longa. (...)  Resumidamente, o objetivo é não permitir a deterioração do Centro. (...). Segundo o texto divulgado pelo Iplan, o desenvolvimento da cidade acabou legando ao Centro a posição de área decadente. (...) A proposta do Iplan está fundada em seis pontos: trânsito, densidade, sociologia, vegetação, maquiagem e propostas estruturais”.

O que se pretendia sobre o trânsito era “discutir e pôr em prática uma nova política de transporte coletivo na área, e a sugestão dos empresários do Centro (era) no sentido de erradicar o fluxo de transporte coletivo da Avenida Anhanguera”. Pedia-se também a “criação de um anel viário central”.

O então presidente do Iplan, Juruna, enfatizou também um estudo de cunho sociológico: queria “definir o perfil do usuário do Centro - moradores, comerciantes, banqueiros... -, incluindo-se discussões sobre segurança e a possibilidade de o Centro tornar-se uma zona de cultura e lazer, favorecendo-se as iniciativas nesses segmentos.

E sobraram atenções também para a vegetação: “O Iplan anota quatro pontos para melhoria do aspecto da flora. O primeiro inclui a reposição da vegetação decadente; outro é uma campanha sob o chamativo "Plante mais"; uma terceira idéia é a reavaliação do paisagismo existente com vistas a valorizar pontos históricos; e o último é a discussão da baixa iluminação nas ruas, em função dos prédios, estudando-se alternativas, inclusive quanto à altura do posteamento”.


Curiosamente, há quinze anos a administração municipal de Goiânia se preocupou com a limpeza, mas a coisa não saiu do papel. A expressão foi essa mesmo: faxina.


“Há edifícios centrais que, em 30 anos, jamais passaram por um tratamento de suas fachadas”. E, paralelamente, havia a preocupação com o aspecto histórico: "Rever o desenho urbano, criar identidade no mobiliário urbano, redesenhar calçadas, rever a sinalização de placas" foram destaques da proposta do IplanMais adiante: “Ainda no item maquiagem, há a caracterização do patrimônio tombado e a tombar, aspecto este que ficará a cargo da Secretaria Municipal da Cultura.

Pois é... O tempo passa, as pessoas passam e os problemas ficam. Os jardins da Avenida Goiás estão de volta; alguns eventos culturais significativos acontecem no Centro Histórico, mas existem grandes edifícios desocupados, os vultos humanos que fizeram história desapareceram. São de minha época de juventude o Alemão da banca de jornais, Waldir Frauzino, o da gravata borboleta,  o editor Taylor Oriente e os costumeiros comerciários e bancários que, entre profissionais liberais, davam ao Centro uma cor diferente e mais feliz.

Acho que, definitivamente, os Centros de cidades, no Brasil, restringem-se apenas ao bucolismo das pequenas cidades. Das bem pequeninas.

 

 

Luiz de Aquino é escritor , membro da Academia Goiana de Letras. E-mail: 

sábado, março 21, 2009

A Língua em risco

A Língua em risco

Luiz de Aquino

 

“Inicializar; vivenciar; experimentalizar”. Está na moda inventar palavras. Tão modal quanto “gerundiar” para construir frases em Português tal como em Inglês, ou seja, instituir no Brasil um “presente contínuo”, tempo de verbo fartamente usado no idioma do Príncipe Charles.

“Variabilidade”. Poxa! Essa, ouvi-a de uma cientista do tempo, quero dizer, uma meteorologista (na tevê). Claro, isso não me surpreende porque, ao longo de seis décadas, sempre ouvi os mal falantes dizerem que sua profissão nada tinha a ver com a Língua. Ledo engano! Todos nós temos de proferir e compreender bem a Língua, ou não nos comunicamos bem e, não nos comunicando bem, comprometemos nosso próprio trabalho, seja o da coleta de lixo ou o das orações de fé.

A propósito, como a gente ouve religiosos falando mal, hem? Também, não é para menos: recentemente, recebi, pela Internet, a oferta de um curso, nivelado a mestrado, que se conclui em apenas noventa dias. Que curso? O de pastor. Claro, isso não acontece em todas as “denominações” (apelido novo para seitas protestantes; é que as pessoas acham que “seita” é uma palavra pejorativa). Mas será mesmo possível formar-se um sacerdote em apenas noventa dias? Sei não... Vá lá, depende da qualidade do profissional que se pretende.

Já vi, em textos, até mesmo professores da Língua confundirem as palavras “há” e “a” (claro, as vogais “a” e “o” são palavras, em alguns casos). Já vi engenheiros corrigindo o linguajar de bacharéis de Direito (esta semana, um advogado, obviamente com carteira da OAB, escreveu-me; havia sérias confusões de regência e concordância e uma mistura triste de “mau”e “mal”). Profissionais das áreas de biologia e exatas costumam dizer que “Língua Portuguesa não é do meu ofício”. Mas é, sim. E como o é!

Viajemos no tempo. Em dezembro de 1961, publicou-se a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação no Brasil. Os professores de Grego, Espanhol, Latim e Francês tiveram de migrar para o ensino de Português; os de Canto Orfeônico e Trabalhos Manuais perderam seus empregos (só alguns anos mais tarde apareceram as disciplinas ligando arte a educação). Parece-me que os professores das esferas das ciências exatas e biológicas ligaram suas antenas e conseguiram realizar uma importante reserva de mercado. É que, dez anos depois, outra reforma deu força estranha aos cursinhos pré-vestibulares, instituindo o tal de vestibular único, que exige dos candidatos às universidades conhecimentos cada vez mais profundos de física e de química.

Os professores de Português, não. Acharam que, por ser o idioma indispensável à comunicação no Brasil, teriam sempre o seu lugar, mas, ao fraquejarem nesse comodismo, permitiram a queda brusca na qualidade da Língua falada e escrita pelos profissionais nacionais. Chegamos ao ponto de um profissional de nível superior não compreender o que lê. Então ele pede que alguém leia e lhe explique verbalmente o escrito. Já vi médico pediatra escrever “frauda”e jornalista publicando texto assim: “A loja promete trocar todos produtos com defeitos” (no caso, “todos” vem a ser a combinação das palavras “todos”e “os”, assim: “tod’os”; isso parece ter sido a lógica de raciocínio do autor do texto, se é que isso tem alguma lógica).

Enfim, alguma coisa precisa ser feita, e já! Ou continuaremos a ouvir os ícones do telejornalismo nacional a repetir “sofria da doença havia seis anos” ou a tentativa de nos convencer de que “risco de vida” está errado, que o certo é “risco de morte”.

 

 

Luiz de Aquino é escritor e jornalista, membro da Academia Goiana de Letras e escreve aos domingos neste espaço. (E-mail: poetaluizdeaquino@gmail.com).

 

quarta-feira, março 18, 2009

Calçadas impróprias

Calçadas impróprias

Luiz de Aquino

 

Qualquer pessoa medianamente observadora sabe que, quando da construção de Goiânia, lá pelas décadas de 1930/40, as calçadas receberam, como pavimento ladrilhos hidráulicos em tom natural de cimento. Lá pela década de 70, a calçada do Banco do Estado de Goiás (hoje, do Banco Itaú) recebeu ladrinhos especiais, como é da praxe de comércio, mas ainda ladrilhos hidráulicos.

No final dos anos 80,  participei de reuniões, na Prefeitura, em que se discutia um novo caminho para as calçadas. Muitas delas já aparentavam grave desgaste, em boa parte causados pelas raízes dos flamboyants e mongubas.  Como é fácil de se deduzir, aquelas foram reuniões inócuas.

Foi justamente naquele final da década de 1980 que a Prefeitura abriu a Avenida Quinta Radial, mais a T-63, emendando-as com ruas de outros bairros além do Pedro Ludovico, do Bela Vista e do Bueno, criando a Nova Suíça e valorizando o Jardim América, e o Parque Anhanguera, aplicando-lhe um só nome – Avenida T-63. E, para compactar o solo que receberia pista dupla de asfalto, optou-se pelo mais fácil: as máquinas perambularam pelas ruas dos setores Bueno e Bela Vista, afundando seus pisos que, em seguida, foram também asfaltados, mas sem as galerias de esgoto pluvial.

Ao pavimentar as ruas transversais (e também as paralelas) à T-63, a Prefeitura escolheu aumentar a largura das calçadas, que então já mostravam graves desníveis entre a divisa dos terrenos e a linha do meio-fio. O resultado está aí, à mostra, há mais de vinte anos, sem qualquer providência satisfatória.

Ao inaugurar a T-63 renovada, a via até então chamada de Rua S-1 ganhou, também, pista dupla, como extensão da Avenida 85. E ganhou também o nome da avenida que vem desde o Setor Sul. Mas, agora, descobriu-se que o velho nome S-1 não foi corrigido para Avenida 85, tal como se fez com a T-63. E, para maior mal-estar, as calçadas do trecho da antiga S-1, especialmente o lado leste da avenida, também ostenta desníveis enormes no perfil das calçadas.

Esses passeios são impróprios para pessoas comuns. Imaginem, agora, deficientes físicos e visuais, idosos com limitações e bebês em carrinhos. Um arquiteto meu amigo diz que, em Goiânia, cuida-se muito do urbanismo e das obras, mas sem se levar em conta o acabamento da cidade.

Curiosamente, a própria Prefeitura, ao entregar ao público o Viaduto João Alves de Queiroz, cuidou de trocar o piso das calçadas próximas. Só que escolheu o piso errado, em pedras portuguesas, de perfil ruim (especialmente para quem usa salto alto, como as mulheres elegantes) e... sem corrigir o desnível!

Ao que parece, moradores e transeuntes (eta! Esta palavra eu busquei num arquivo antigo memória) da parte alta do Setor Bueno, bem como os do pequenino Setor Bela Vista não têm uma associação de moradores. E, parece-me ainda, também não têm um vereador sequer que os represente.

Terei prazer em convidar o prefeito Iris Rezende (ele e os que o antecederam, desde a segunda metade da década de 80) e seus auxiliares para um passeio a pé por esses bairros. Tenho certeza de que, em poucas horas, a quase totalidade deles, em sua condição de pedestres, procurarão ortopedistas e fisioterapeutas para repor suas colunas no devido lugar.

 

 

Luiz de Aquino é jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras. E-mail: poetaluizdeaquino@gmail.com.

sábado, março 14, 2009

Da Lei, do pecado e da Poesia

Da Lei, do pecado e da Poesia

Luiz de Aquino

O dia 14 de março é festivo para a Literatura Brasileira. É aniversário de Castro Alves (1847/74) e, por isso, foi instituído Dia Nacional da Poesia. Quem me lê sabe que, todos os anos, evoco a referência nacional ao vate baiano, que tenho na conta de principal mentor da abolição da escravatura em nossa terra. Mas, para nossa maior alegria, há alguns anos a Unesco instituiu o dia 21 de março como Dia Internacional da Poesia. Com isso, os poetas brasileiros festejam a Poesia por uma semana inteira, de 14 a 21 de março.

Mas, este ano, chegamos à data com algumas pulgas na orelha. Falo dos fatos complicados no segmento policial. E os fatos policiais estão se espalhando por campos muito mais amplos do que imaginávamos há poucos anos. É que a facilidade de comunicação e a coragem das vítimas em fazer denúncias tornam públicos, de modo negativo, vultos nos quais devíamos confiar, como parentes, médicos e policiais.

Em Pernambuco, o arcebispo de Olinda e Recife, ignorando as leis brasileiras, sob o argumento de que “a Lei de Deus é superior à lei dos homens” (concordo plenamente, desde que ele me convença de que a “Lei de Deus” a que se refere não foi escrita por bispos e outros sacerdotes como ele, humanos e cheios de falhas), excomungou os familiares da menina grávida (menos o padrasto estuprador) e alguns médicos, entre estes o ministro da Saúde

Valesse a Lei de Talião, o ministro da Saúde condenaria o arcebispo à morte. Mas não é necessário, o ministro Temporão tem consciência de que todos já nascemos condenados a morrer.

Do Vaticano, um cardeal que, na hierarquia da Igreja, tem cargo equivalente ao de ministro, referenda a ação do arcebispo. Foi mais um passo atrás, digno de figurar entre a condenação ao uso de preservativos sexuais e a recusa sistemática de se batizarem bebês cujas mães não se casaram sob as leis da Igreja.

Um poeta popular, Manezim da Princesa, morador em Brasília, mas filho da Paraíba (e, como tal, excelente cordelista), escreveu:

 

“ I - Peço à musa do improviso / Que me dê inspiração, / Ciência e sabedoria, / Inteligência e razão, / Peço a Deus que me proteja / Para falar de uma igreja / Que comete aberração”.

 

São dez estrofes nesse ritmo cadente e sonoro, em critica bem sustentada, ao modo dos bardos corajosos. E Manezim da Rainha arremata assim o seu canto:

 

“X - E esta quem me contou / Foi Lima do Camarão: / Dom José excomungou / A equipe de plantão, / A família da menina / E o ministro Temporão, / Mas para o estuprador, / Que por certo perdoou, / O arcebispo reservou / A vaga de sacristão”.

 

Pois é! Com tanto caso de pedofilia na Igreja, acertou o poeta Manezim e a outra, Leda(ê) Selma (“Bem mais que estupidez humana”, publicada ontem, 14/03/09, aqui no DM). Terá o bispo poupado o estuprador com o intuito de não esbarrar na própria casa?

 

 

 

 

Luiz de Aquino é poeta e jornalista, membro da Academia Goiana de Letras. E-mail: poetaluizdeaquino@gmail.com

terça-feira, março 10, 2009

Recados à AMMA


Luiz de Aquino


Depois daquele entrevero sobre o corte de uns trinta exemplares de ipês na Avenida 85, encontrei-me com o titular da Agência Municipal do Meio-Ambiente de Goiânia, Clarismino Júnior. Convidou-me a visitá-lo na Agência, a AMMA, e fui. Gostei do que vi, gostei das horas que curti lá, era manhã de sol. Conheci cada gerência, cada seção e um número grande de funcionários e voluntários. São muitos jovens com graduações específicas, como biólogos, geógrafos, engenheiros agrônomos e florestais, profissionais vários, enfim, incluindo bacharéis em economia e direito, todos voltados para a causa ambiental.

O ambiente é dos melhores, quebra radicalmente o (mau) conceito dos que imaginam um órgão público como a caricatura que se fazia, há décadas. Ali, ouvem-se de gente altamente especializada informações sobre qualidade do ar, condições das águas, situação de árvores e arbustos, interferência das redes de energia e telefonia, bem como de água e esgoto no sistema de arborização, ocorrência de animais silvestres no espaço urbano... Uma bióloga contou-me, feliz, uma descoberta: um ouriço cuja espécie não estava, ainda, catalogada (desculpem-me, foram tantas pessoas muito agradáveis no trato que não pude registrar os nomes; da próxima vez, agirei como repórter e trarei dados precisos, tais como nomes e números).

Sempre observei com certo carinho radical a situação dos jardins e da arborização da cidade. Vem daí minha boa briga contra a erradicação dos ipês. Fiz a cobrança ao presidente da AMMA, e Clarismino assegurou-me que plantará muito mais ipês em cada um dos novos parques, como compensação. Tudo bem, lamento ainda pela modificação na paisagem, mas senti-me recompensado.

O quotidiano envolve-nos sempre. Muitas vezes, sinto-me tentado  a ligar 161 – o “telefone verde” –  para denunciar situações irregulares. Em algumas ocasiões, fiz isso e gostei do efeito, e eram relacionados a abuso de som em automóveis. Quanto a árvores, duas situações perturbam-me: quando removem uma árvore sem razão aparente, senão abrir espaço para exibir a fachada de algum comércio, e quando, serrando a árvore pelo caule, deixam na calçada o imenso toco com as raízes, em frontal ameaça aos passantes. Na maioria das vezes em que essa situação dupla acontece, a árvore foi, antes, envenenada para ser removida.

Dia desses aí, eu pagava uma prestação de consórcio na Avenida T-11, quase esquina com a Avenida 85 (no mesmo trecho de onde removeram-se os ipês) quando caiu uma forte chuva. Meu carro, estacionado na faixa que outrora foi o jardim da casa que se tornou escritório, ficou sob risco. Um dos funcionários disse-me que a árvore poderia cair, pois haviam posto “tordon”ou algo parecido para que ela morresse. Pensei: é um caso para a AMMA.

Na calçada frontal do Hospital Geral de Goiânia, na Avenida Anhanguera, as amendoeiras que enfeitam o local e dão sombra agradável já elevaram placas da calçada em mais de 30 centímetros, além de ostentarem muitos galhos podres, nítida ameaça aos milhares de pedestres de cada dia. Mais um caso para a AMMA.

Digo isso porque, sei, existe um projeto, já em andamento, de substituição de espécimes na cidade, sob critérios científicos e de adequação. Deixo aqui, em vez de telefonar para 161, esta contribuição simbólica (outras, cuidarei de levar pela via regular do telefone). Apesar da minha manifestação severa contra a remoção dos ipês, acredito nos bons princípios de Clarismino e sua equipe. E espero que o bom senso ultrapasse os períodos eleitorais, pelo bem da comunidade.

 

 

Luiz de Aquino é jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras. E-mail: poetaluizdeaquino@gmail.com

sábado, março 07, 2009


Mulher,
imprensa e poesia

Luiz de Aquino

Ao realizar a série de entrevistas “Onde anda?”, em 1994 (que reuni em livro, "Deu no Jornal", em 2000), na Editoria de Especiais do DM, sob a chefia de Jayro Rodrigues, tentei inserir entre os meus entrevistados o governador José Feliciano (ele governou Goiás num mandato curto, 1958/60). Delicadamente, o velho político declinou-se, alegando viagem, falta de tempo... Só então a ficha caiu: foi a 5 de março, no início de seu governo, que a polícia “combateu, heroicamente”, uma manifestação de estudantes. A data deu nome ao mais combativo jornal da imprensa goiana em todos os tempos.

Manifestações de estudantes eram coisas normais no Brasil democrático de 1946 a 1964 (e mesmo após o golpe militar), mas a polícia tinha outra visão sobre as atividades do povo. A polícia (e alguns civis) rejeitam mudanças. Fosse possível isolá-los, estariam ainda usando ventosas e sanguessugas, escarradeiras e urinóis, escrevendo com penas e tinteiros e usando guarda-pó nas viagens por superfície.

O dia 5 de março é o mesmo de uma ação empreendedora acontecida em Meia-Ponte (Pirenópolis) mais de um século antes: em 1830 circulava pela primeira vez um jornal em terras do Centro-Oeste brasileiro, a “Matutina Meiapontese”, por inspiração e atrevimento do comendador Joaquim Alves de Oliveira. Seu principal jornalista (redator; hoje, editor-geral) era o padre Luiz Gonzaga de Camargo Fleury.

Nos primeiros cinco anos, o semanário de Batista

Custódio, Telmo de Faria e Consuelo Nasser, tendo como figura de referência o político e intelectual Alfredo Nasser, com sua linha editorial independente era um repositório da liberdade (“Nem Washington, nem Moscou, nem Roma: tudo pelo Brasil”, lia-se em seu logotipo). E após a quartelada de 1964, tornou-se bastião de resistência, a guarida em que a dignidade era respeitada. Ao menos, tentava-se, pois, naquele mesmo ano de 1964, o governador Mauro Borges determinou ou aceitou uma ação arbitrária da Policia Militar, que empastelou a gráfica.

Hoje estou usando termos que entendíamos bem na época, mas que pedem explicações nos dias de hoje. Mas não vou esclarecer, não; o leitor mais moço que procure saber o que vem a ser empastelar (no jargão jornalístico), ventosa, urinol, sanguessuga, escarradeira, tinteiro, pena de escrever, e guarda-pó. Não é preguiça minha, nem falta de respeito para com os moços, mas uma tentativa de induzi-los a pesquisar o vocabulário, ou a conversar com pais e avós, práticas (ambas) em desuso, tal como os objetos que relacionei.

De leitor dedicado, fã dos textos de Anatole Ramos, Carmo Bernardes, Javier Godinho, Antonio José de Moura, Alfredo Nasser, Marco Antonio Silva Lemos, Sebastião Póvoa e tantos mais (sei, sei, dirão que me esqueci de A ou B, mas não fujo; não é injustiça, é falha de memória mesmo), tornei-me repórter, indicado por Luiz Contart e aprovado por Eliezer Pena. Tive como chefe Valterli Guedes e Sônia Penteado, depois Marco Antônio S. Lemos e fui parar no novíssimo e revolucionário “Diário da Manhã”.


Neste domingo em que se festeja a mulher, centralizo a semana por duas quintas-feiras: dia 5, o Jubileu de Ouro do “Cinco de Março”; dia 12, os 29 anos de DM. Muita festa, pois! Sem esquecer que, dia 14, aniversário de Castro Alves, é Dia Nacional da Poesia.


Luiz de Aquino é escritor e jornalista, membro da Academia Goiana de Letras. E-mail: poetaluizdeaquino@gmail.com.