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sábado, abril 27, 2013

Marechal Hermes, 100 anos

A mais bonita dentre todas as estações do Rio de Janeiro; aí, por seis anos, tomei o trem diariamente para ir às aulas.


Marechal Hermes, 100 anos


Era março, dia 11, 1956. Deixamos Caldas Novas, numa carona aérea, rumo ao Campo de Marte, em São Paulo, por volta de nove horas da manhã – comigo, as tias Leda e Vitala. O avião era de uso do comandante da base aérea de destino, e o convite fez-nos o então tenente Augusto Rodrigues da Cunha.

Pernoite em São Paulo, na casa do “tio” Augusto. Na madrugada do dia 11, um ônibus para o Rio de Janeiro. Eu, aos dez anos, gostava de ler revistas e jornais, além de livros e gibis. Conhecia, pelas propagandas em O Cruzeiro – a revista mais nacional de todos os tempos – a marca (logo) da famosa companhia de ônibus Cometa – um cachorro galgo, simbolizando rapidez.

Depois, um táxi da Praça Mauá (onde era a rodoviária do Rio) até a Central do Brasil, e, finalmente, Marechal Hermes! As duas palavras, que significavam nada, isoladamente, para o menino do interior de Goiás, viraram paisagem. E ali vivi até julho de 1963, o que equivale a um conceito final: minha adolescência tem as formas e cores de Marechal Hermes e do Colégio Pedro II, com a Escola Evangelina Duarte Batista a lembrar-me os tempos de preparatório para o Ginásio – um empenho que, para mim, exigia mais que os vestibulares que prestei anos depois.

Era o tempo da minha nova família – a família de minha mãe. Dona Lilita decretara, eu iria morar com a Vó, ser tutelado pelo tio Ângelo e sempre norteado, também, pelas tias: Vitala, Wanda, Norma, Leda e, fora do ambiente daquele sobrado 1.495 da Rua João Vicente, a tia Míriam. Restam-me duas dessas mães que faziam as vezes de Dona Lilita – Vitala, que mora em Porto Alegre, ainda lúcida e saudável aos 96 anos, e Míriam (as demais reúnem-se com minha mãe no Plano Superior).

Fora de casa, Marechal era aquela estação de trens – a mais bela do Rio de Janeiro. E é também o bairro dos sobrados “do lado de cá” – e, do “lado de lá”, a fábrica de vagões e o largo onde se montava o coreto a cada carnaval. No quotidiano, a Escola Evangelina (na praça frontal, no próximo Dia do Trabalhador, 1º de maio, haverá a festa do Centenário); o cursinho de Dona Líbia, na Rua 7 (Eng. Assis Ribeiro) e, aos domingos, a reunião na tropa de escoteiros sob o comando do Chefe Cidade, no pátio da Igreja Nossa Senhora das Graças – perto do Teatro Armando Gonzaga, do Hospital Carlos Chagas e da Delegacia que, na época era, se bem me lembro, do 20º DP.

Por arremate destas lembranças, o trem – condutor diário até São Cristóvão, perto do Morro da Mangueira e do Maracanã – e o caminhar de dez minutos até o colégio. O cinema Lux, “o redondo” na Praça Montes; o “footing” na praça – que, a rigor, não era a praça, mas a avenida General Osvaldo Cordeiro de Faria –, as lindas meninas que representavam o Clube Marã (algumas tornaram-se vitoriosas nos concursos de misses). E o palacete onde, por uns tempos ainda, viveu a famosa Nair de Tefé, a segunda mulher do Marechal que criou o bairro e presidiu o Brasil.

Não posso ir à festa do Centenário, mas um amigo daqueles tempos – o tenente-coronel Paulo Pedro Pinto, da FAB, menino dos meus tempos iguais, morador do conjunto habitacional junto ao Colégio José Accioli – há de contar-me de tudo, para meu deleite, pois a informação, ao seu modo, supre carências.


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sexta-feira, abril 19, 2013

É festa!


É festa!


E já começou. Logo após a Missa de Sétimo Dia pelo passamento de Mauro Borges – e ainda que ele fosse pouco lembrado como membro da Academia Goiana de Letras – aconteceu o primeiro telefonema. Jefferson Bueno ligou, conversamos longamente, eu já o conhecia de nome e de uns raros encontros em que não lhe despertei qualquer interesse – ainda que, de certa forma, fôssemos colegas de trabalho sob a sigla do Banco do Estado de Goiás.

Passaram-se outros dias e recebi o segundo telefonema – dessa feita, de uma escritora com quem troco ideias e conceitos acerca das letras e ainda muitas considerações sobre nosso ofício comum; amiga, pois. Outros mais se movimentam, mas não chegaram a mim; soube, por exemplo, que um famoso publicitário, autor de livros publicados em outro âmbito, procura também se fazer notado entre os 39 eleitores, membros efetivos da AGL.

As pessoas ainda não se manifestaram de pronto, até porque a Academia ainda marcará a data da Sessão da Saudade, quando um de seus membros discursará em homenagem ao confrade falecido. Certamente, serão exaltados as qualidades e os feitos do pranteado ex-governador e, ao término, o presidente da entidade, o acadêmico Getúlio Targino Lima, declarará aberta a vaga e anunciará o período de inscrições de candidatos.

Oficialmente, é nesse momento que começam as campanhas – os contatos indispensáveis, por norma e tradição, com visitas aos votantes e muitos telefonemas, e-mails e outras formas de que se valerão os pleiteantes.

Ainda assim, crescem – à boca miúda, ou talvez nem tanto – as referências ao professor Nasr Chaul – historiador, compositor (letrista) e gestor cultural. Talvez o próprio sequer tenha se manifestado, ainda. Nos contatos com os acadêmicos, senti que há essa predisposição em tê-lo entre os imortais goianos, mas é preciso que ele próprio se interesse, e isso se demonstra não apenas nos contatos com os eleitores, mas inevitavelmente com a formalização da candidatura.
As exigências são claras e simples: o candidato precisa ser autor de livros (quero lembrar que livro tem definição legal: além da forma, sobejamente conhecida, há de ter 50 ou mais páginas, dispor de ficha catalográfica e o indispensável ISBN – um registro que se obtém na Biblioteca Nacional; esclareço isso porque já ouve casos de se eleger, na própria AGL, autores que não atendiam a tal exigência, e o senador Fernando Collor foi eleito na Academia de Letras de Alagoas sem ter, ainda, publicado seu livro, que, segundo se contou à época, estava no prelo).

No caso específico da AGL, o pretendente há de ser goiano nato ou ter vivido no mínimo cinco anos em Goiás (o estado). E, obviamente, há que se juntar cópias de documentos pessoais e comprovante de residência. A eleição se dá em data marcada pela presidência e anunciada nos jornais locais e há que se levar em conta o “quorum” mínimo para instalação da sessão eleitoral; o eleito terá de atingir uma quota mínima de votos e há uma variante na hipótese de candidatura única ou com a competição entre dois ou mais candidatos.

Eu, particularmente, aguardo a manifestação de alguns escritores que, noutras ocasiões, demonstraram-se interessados em integrar a Academia Goiana. Terei, é certo, dificuldade caso eles se candidatem, pois já lhes manifestei, antes, minha preferência – mas na hipótese de haver dois dos meus preferidos candidatando-se, terei de escolher entre um deles, situações a quem já me expus, por exemplo, quando da disputa entre Delermando e Adelice e eu já havia declarado meu voto à romancista, quando o poeta enfim decidiu-se.

Uma coisa é certa: quando eu definir o voto e declará-lo previamente, essa escolha é a que consagrarei na urna (que no nosso caso não é uma urna, mas dois chapéus em que colocamos a cédula – o primeiro, de Zoroastro Artiga e o segundo, de Altamiro de Moura Pacheco). Fixei este procedimento no dia em que fui eleito, pois, dentre os que compareceram para votar, eu contava com tantos votos, mas o resultado mostrou-me que três deles mudaram sua escolha à última hora.


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sábado, abril 13, 2013

A vaga de Mauro Borges na AGL



A vaga de Mauro Borges na AGL
           


Passada a primeira semana do falecimento de Mauro Borges, começaram os movimentos dos possíveis candidatos à Cadeira 15 da Academia Goiana de Letras. Como se sabe, os membros eleitos das academias de letras têm presença vitalícia nessas entidades, condição estabelecida pela Academia Francesa, criada em 1635. Sob o seu modelo, criou-se no Rio de Janeiro, então Capital Federal, a Academia Brasileira de Letras, em 15/12/1896. As academias regionais de cada unidade federativa seguem o exemplo da “mater” nacional.

A ABL, idealizada por Lúcio de Mendonça e que teve Machado de Assis como seu primeiro presidente, adotou um dístico com a expressão latina “Ad Imortalitatem” (à imortalidade). Lendo isso, um cidadão carioca abordou o poeta Olavo Bilac na Confeitaria Colombo, “point” dos boêmios e literatos cariocas daquele final de século: “Quer dizer que vocês são imortais? Como é isso?”, ao que o autor de “A flor do Lácio” respondeu: “Sim, sou imortal, pois não tenho um couro em que cair morto”.

A “imortalidade” é uma característica – metafórica, felizmente – dos membros das academias de letras que seguem o padrão da “Brasileira”, como a chamamos com certa “familiaridade”.


Voltando ao propósito: a Cadeira 15 está sem ocupante e brevemente o presidente Getúlio Targino Lima, ao término da Sessão da Saudade, a declarará vaga, anunciando o prazo para inscrição de candidatos. Os que se inscreverem – apresentando currículo, provando sua condição de goiano nato ou de morador no Estado por pelo menos cinco anos e comprovando sua condição de autor de livro – serão avaliados por uma comissão, que confirmará ou não a candidatura; em seguida, e de acordo com as exigências estatutárias da Academia, haverá a eleição.

Entre a segunda-feira, dia 8, e a manhã de sexta-feira, dia 12, recebi quatro telefonemas de possíveis candidatos. Contam-me que há movimento de pelo menos outros três autores de livros – obras literárias e técnicas, em áreas diversas. Não me comprometi, pois espero a manifestação de dois autores com quem já me comprometi em pleitos anteriores.

Sabe-se que costumo proclamar com antecedência o meu voto. Não o farei mais, a partir deste evento. É que, na penúltima eleição para novo membro, anunciei meu voto, empenhei-me na consolidação da opinião de alguns confrades e conseguimos eleger o poeta candidato; pois este, tão-logo se viu laureado com os votos, e antes mesmo de empossar-se na Cadeira, cochichou a um notável jurista desta terra (seu amigo, é claro) e este espalhou um conceito sobre mim: “É desonesto”.

Sim, devo sê-lo: afinal, convenci alguns pares em dúvida quanto ao voto de que ele, aquele poeta, era o melhor candidato. Por isso, sou obrigado aqui a desculpar-me ante o público afeito às lides literárias e sobretudo ao candidato por ele derrotado. Sempre manifestei-me com preferência para os literatos, mas errei feio naquela ocasião.

Doravante, só declaro voto ao candidato que me sensibilizar com seu currículo, sua obra e seu comprometimento com a causa das letras. É que, para mim, a Academia Goiana de Letras é o relicário onde os afeitos às letras literárias devem abrigar-se. Os demais, que se instalem nos sodalícios de seus ofícios primordiais.


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sexta-feira, abril 05, 2013

A homenagem inesperada




Em 1979, o ano da Anistia, entrevistei Mauro Borges padra o jornal Cinco de Março, quando ele era eleito presidente do MDB, que muito em breve seria PMDB.

A homenagem inesperada




Memórias de um estadista



No decurso de 2002, enquanto trabalhava a edição do livro Tempos Idos e Vividos – Minhas Experiências, de Mauro Borges, fui procurado pelo prof. Alfredo Ribeiro da Costa, da UFG – queria o currículo do eterno governador para propor uma homenagem. Eu lhe disse que Mauro Borges merecia, “no mínimo”, o título de Doutor Honoris Causa. Deu certo; para documentar, publiquei o artigo abaixo, no Jornal Opção de 24/22/2002.



Mauro Borges, Doutor
Honoris Causa



Nesta quinta-feira, dia 28 de novembro de 2002, o governador Mauro Borges, cujo mandato foi violentamente interrompido em 26 de novembro de 1964, foi homenageado pela Universidade Federal de Goiás na mais alta distinção que a universidade brasileira concede – o título de Doutor Honoris Causa.

A reitora Milca Severino, acompanhada de professores membros do Conselho Universitário, esteve na casa de Mauro Borges no dia 22 de outubro. Integrava a comitiva o professor Alfredo Ribeiro da Costa, da Escola de Engenharia, autor da propositura, que teve aprovação unânime. Mauro recebeu-os com ingenuidade, pensando tratar-se de mais uma das incontáveis visitas que recebe. Apenas mostrava-se feliz por receber a reitora da UFG e professores com quem, ao longo dos anos, já convivera de alguma forma. Milca contou-lhe, por exemplo, que fizera o primário no Grupo Escolar Mauro Borges, em Quirinópolis. Glacy Antunes, diretora da Escola de Música e Artes Cênicas, recordou a amizade de MB com seu pai.


Eu e Mauro, em 2002


Senti-me obrigado a confessar que surrupiara, discretamente, o currículo de Mauro Borges e o entregara ao professor Alfredo para dar sustentação à sua proposta de homenagem ao grande estadista, vítima da sanha de vingança de alguns generais da chamada linha-dura – a cúpula do golpe militar de 1964. Aliás, no próximo dia 17 de dezembro, será lançado o livro Tempos Idos e Vividos – Minhas Experiências, que vem a ser a síntese das memórias de Mauro. No livro, ele recorda sua infância em Rio Verde, a adolescência na Cidade de Goiás e juventude como aluno da Escola Militar do Realengo; conta de seus contatos com o presidente Getúlio Vargas, de cuja guarda pessoal foi comandante. Diz de sua experiência de administrador da Estrada de Ferro Goiás, conta dos tempos de deputado federal no Rio de Janeiro e da mudança do Congresso para Brasília; a campanha para o Governo de Goiás, o convívio com o pai, Pedro Ludovico Teixeira.

Momento decisivo foi aquele em que, aliado a Leonel Brizola (governador do Rio Grande do Sul), em 1961, ofereceu resistência legalista à tentativa de golpe militar contra a posse do vice-presidente João Goulart quando da renúncia de Jânio Quadros. Dois anos e meio depois, os mesmos militares fizeram a revolução de 1964. E, com o estímulo da até então inexpressiva UDB de Goiás, os militares revanchistas cuidaram de tirar Mauro Borges do Governo de Goiás. Mas não conseguiram apagar seu nome, sustentado num trabalho sistemático de planejamento a partir da constatação das necessidades do Estado. Mauro Borges implantara, em Goiás, uma estrutura administrativa que nem mesmo seus mais ferrenhos adversários conseguiram mudar.

Quando a reitora Milca Severino lhe contou o motivo da visita e lhe falou do título que lhe era outorgado, Mauro não se conteve e chegou às lágrimas, emocionado:”Tenho recebido muitas homenagens, mas nunca me imaginei digno de uma honraria tão expressiva, vinda da Universidade Federal de Goiás”, disse ele.

O professor Alfredo, carioca radicado em Goiás há mais de duas décadas, autor da iniciativa, teve também uma surpresa durante suas andanças com vistas e distinguir o ex-governador. Vendo cópias do processo em que o Superior Tribunal Militar inocentou Mauro Borges das acusações que o governo federal lhe faziam para viabilizar a intervenção em Goiás, encontrou lá a assinatura de seu tio, o ministro Orlando Ferreira da Costa. Mauro foi absolvido por unanimidade pelos ministros do STM.

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