Castro Alves, poeta mentor da abolição. A malta do governo viola a História e o respeito á dignidade do homem brasileiro. |
Que
governo é esse?
Uma Lei do
Império, assinada a 13 de maio de 1888, decretou a extinção da escravidão no
Brasil. As consequências foram complexas, com os escravistas arrancando os
cabelos e a Monarquia claudicando, pois a campanha abolicionista desembarcou no
leito republicano, apropriado por altos oficiais do Exército (insatisfeitos com
os parcos ganhos ao término da Guerra do Paraguai).
Tivemos uma
constituição em 1891, que preservou a Lei Áurea. A de 1934, também, e o golpe
de 1937, com uma constituição outorgada, apelidada de “Polaca”, a manteve. Isso
se repetiu em 1946 e a Constituição outorgada em 1967 – e reformada dois anos
após – preservou o que já se tornara uma condição pétrea. Obviamente, a Carta
Magna de 1988, com todos os seus defeitos, manteve o Brasil livre de escravos –
ao menos teoricamente.
Eis que, súbito,
um mero ministro marionete expede uma Portaria revogando a Lei Áurea e
afrontando a Constituição. O mandachuva recomenda, a despeito da fortíssima reação
nos mais variados segmentos da vida pública, que só se cuide disso após a
votação da denúncia contra ele próprio e dois de seus imediatos – um deles,
sintomaticamente, manda demitir uma funcionária de realce por ter qualificado a
tal portaria como sendo “um desrespeito à Constituição”.
Até a ONU e alguns
de seus destacados órgãos manifestaram-se contra a medida do obscuro ministro
(a realidade nacional mostra-nos apenas três ministros – um na Fazenda, outro
na Casa Civil e o terceiro, na Secretaria Geral do chefe-mor). E, súbito, o
Tribunal Federal do Distrito Federal revoga uma medida do Ministério da
Educação que manda atribuir nota zero às redações em que os alunos sob o teste
do ENEM manifestem opiniões que ofendam os direitos humanos – o MEC recorreu,
logicamente.
Uma ministra,
também até então não referida, ganha espaços no noticiário por reclamar
pagamento que extrapola o teto máximo. Estranhamente, essa senhora é ministra
dos Direitos Humanos – mas nada disse quando seu colega do Trabalho decidiu
revogar o ato da Princesa Isabel – mas ela própria, essa ministra de sobrenome
francês, alegou que se lhe negassem o que pedia, poderia passar fome, pois
estava em regime de trabalho escravo.
O poderosíssimo
ministro da Educação, cioso do respeito que se deve aos Direitos Humanos,
condena os estudantes que se manifestarem contrários a qualquer dos Direitos
Humanos – mas também não se manifestou sobre a violação dos Direitos Humanos
pelo ministro que pretende restaurar o trabalho escravo – atitude que tinha,
segundo líderes da tal bancada ruralista, segundo o presidente da República e
seu ministro da Agricultura (entre outros áulicos) o propósito de agradar os
deputados ruralistas.
Ou seja: o
ministro do trabalho quer instituir legalmente o trabalho escravo e recebe
aplausos do ministro da Agricultura, somados esses aplausos ao silêncio da
ministra dos Direitos Humanos e à omissão do zeloso ministro da Educação.
A Procuradora
Geral da República manifestou-se contra. Algum ministro do Supremo disse não ter
tido tempo de ler a tal Portaria, mas deixou um rastro de simpatia à restrição.
Os ruralistas regozijaram-se.
Não bastasse as
falas e atitudes de parlamentares simpatizantes dos atos de corrupção e das
práticas de propina, não bastasse o empenho pessoal do presidente investido na
função, não bastasse o saque desmedido ao Tesouro em atos de compra de votos
(coisa que não se permite nas eleições populares), não bastasse a vergonha que
sente todo brasileiro de bem, temos de engolir mais essas.
E parafraseando
Francelino Pereira – ex-presidente da extinta ARENA dos tempos da ditadura por
revezamento e ex-governador imposto à Assembleia Legislativa de Minas Gerais,
pergunto:
– Que governo é
esse, hem?
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Luiz de
Aquino é escritor e jornalista, membro da Academia Goiana de Letras.
3 comentários:
Partindo dos temas que você abordou, este é o governo "do samba do crioulo doido".
Este é um assunto de relevante importância, o que mostra que o seu jornalismo é sério e imparcial.
Que país é este onde Ministros “ da mais alta importância “, quer anular a Lei Áurea, os que se dizem prejudicados por trabalho escravo , reivindicando salário acima de R$ 60,000,00 e ainda os que possuem grana em offshores, Paradise papers, como o “grande”Henrique Meireles
com sua The sabedoria Trust? Que País é este? Luiz de Aquino, você mexeu no ninho das vespas. Gostei!
Atrevo-me a respondê-lo com outra pergunta: Que governo? Você se esqueceu do prefixo "des", quando desfechou sua crônica com a indignação que parte da população compartilha. Agora, já nem sei se muitos brasileiros ou apenas aqueles que estão preocupados com o rumo que tomamos lhe fazem coro. Sim, porque há os que se ocupam de coisas tão menores (e sabemos quais são e porque surgiram) que nem vale a pena citá-las. Que desgoverno é esse, hein?
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