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terça-feira, dezembro 07, 2021

Pérsio Forzani, em encantamento

Pérsio Forzani, o mais expressivo e decantado artista plástico de Pirenópolis, despediu-se da matéria ontem, 6 de dezembro, 2021. A notícia bateu como um murro de baixo pra cima, feito um murro no queixo para arrancar a cabeça; lembrei-me de de um dos nossos últimos encontros. Aqui está a crônica, enfeixada por um poema especial para a festa aí narrada e que, caso eu me disponha a produzir um novo livro de poemas, este não será olvidado. 


Quando a Tocha Olímpica passou por Pirenópolis (2016),
Pérsio foi um dos indicados a  portá-la, com solenidade...

As mãos, sem firmeza, pediram ajuda; o sobrinho
Jerônimo, solícito, acudiu.



Pérsio, o de Pirenópolis







Imagino que quase todos os jornalistas tiveram, ao escolher o ofício, o mesmo estímulo que eu: a curiosidade ante o fato e o desejo de contá-lo. Mas isso, feito sem o efeito da boa escrita, é coisa de fofoqueiros. A diferença está justamente no amor ao texto.
Desculpem-me os leitores por essas costumeiras divagações quando me ponho a escrever. Produzir uma crônica é um dos meus grandes prazeres e não posso simplesmente imaginar que um gol é apenas um pênalti, sempre o concebo como uma articulação demorada, ziguezague que começa lá na área de defesa, evolui-se no meio do campo e se conclui na área adversária, no excitante desafio a zagueiros e goleiro, no balé de corpos e pernas, no malabarismo improvisado em frações de segundo para ver balançar a rede e erguer-se a torcida... (Poxa! Até para pedir desculpas eu divago; tudo bem, a culpa é da Copa do Mundo!).


O que me motiva, hoje, é Pérsio Forzani, artista plástico com documentos que nos mostram um homem de 79 anos. Na sexta-feira, dia 4 deste junho de 2010,  Pérsio foi homenageado em Pirenópolis, sua cidade de nascer e viver sempre. Não se tratou, porém, de uma festa antecipada das oito décadas, mas dos setenta anos em que Pérsio se dedica à arte de desenhar e pintar. Luiz Antônio Godinho, ao telefone, passa-me um recado:
– Você também está escalado para saudar Pérsio...

Quem exigia? José Nominato Veiga, idealizador da festa que envolveu desde este poetinha até o prefeito Nivaldo Melo, passando por pessoas de destaque na cidade, como o artista Elder Rocha Lima e o desembargador Joaquim Henrique de Sá.



Pois é! Pérsio, de tanta vivência, tem no olhar um brilho instigante: é a luz da juventude. As pernas, imobilizadas e contidas pela pólio na tenra infância, não o impediram de jogar futebol quando menino, como contaram os amigos e o vice-prefeito Tassiano Brandão, companheiros naquela infância. Falou-se lá em outros números: são mais de três mil telas espalhadas pelo mundo, a maior parte mostrando Pirenópolis. Num só projeto, há cerca de vinte anos, Pérsio reproduziu quatrocentas casas históricas da cidade. A encomenda foi do saudoso professor José Sizenando Jaime para sua obra em dois volumes sobre as vetustas construções da antiga Meia-Ponte do Rosário.


E eu, movido pela emoção ao ser convocado, juntei camisa, calça e outras peças numa maleta, convidei a cantora Regina Jardim a acompanhar-me à terra de seu tataravô Veiga Vale e, antes de sair, concebi um poema em homenagem ao amigo e ídolo, assim: 






Pérsio Forzani (o homem que pinta poesia)


Espalho-me ao tempo 
ao sol que define os dias, 
à Lua que benze as noites.


Nos anos mais verdes, 
colhi serenatas plantadas nas ruas
de pedras, sem régua ou compasso.


Ouvi versos cantantes 
e acordes dolentes; vi moças bonitas
nas janelas, silentes...


Era um tempo de estrelas 
e risos sem censura. A gente vivia
vertigens, e era feliz.


Sol, luar, orvalho! 
No verde, mais luz; mais vida
sob os astros.


Meus olhos desenham os morros, 
perfis sob azul infinito, moldados 
aos traços das línguas dos rios.


A ponte, o amor clandestino. 
Carmo, Bonfim, Matriz do Rosário, 
Lembranças de eu-menino...


Meus olhos colheram paisagens, 
Memória transforma em saudade, 
Pincel faz arte e riqueza.


Terra e gente meia-pontense:
Hino e presépio, história em imagem:
Obras de Pérsio, joias da terra.





Luiz de Aquino, poeta e
admirador, esperançoso
de reencontrá-lo no
outro Plano.

* * *