Memórias
de dois mundos
(Texto de apresentação para o livro
Mundos Paralelos, que saiu do prelo na última
Mundos Paralelos, que saiu do prelo na última
quinta-feira, 19/07/18, pela Kelps Editora).
Sei de mim, ou por
mim, como a vida nos é servida em ciclos, em fases que atravessamos em seu
próprio tempo. Minha infância foi povoada de feitos mil, aliás, os feitos
possíveis numa minúscula cidade do interior de Goiás. Minhas lembranças
remontam ao final da década de 1940, a época em que me tornei estudante para
ser alfabetizado no colo da professora. E nunca me esqueci de muitos fatos –
mas as contações orais de histórias
nas noites, na rabeira dos borralhos, esses saraus marcam fortemente minha
memória.
Vem de longe o meu
gosto pela leitura e pelas canções. Esses gostares, aliados aos saraus a que me
referi, são as bases do homem maduro que me tornei e acredito mesmo que posso
ser, num futuro mediano, um velho contador de causos. Sim, um velho (daqui a alguns
anos), porque contador de causos já o sou e isso se arrasta por um bom tempo.
Pois foi esta
minha faceta que me prendeu a uma das histórias contadas, nas páginas das
mídias sociais da Internet, por Bete França Jufer. Ela narra com candidez e
ternura histórias de suas lembranças, coisas de uma jovem capital bucólica, uma
Goiânia que, no decurso de sua infância e adolescência, marcava pouco mais de
20 anos desde a escolha do sítio onde se concretizou.
Bete França, feito
moça, casou-se com Hanz e se tornou cidadã suíça. Gerou três filhos e, já
iniciada no requintado ciclo do avonato,
associou predicados ao aprendizado em casa e na escola, os bons exemplos dos
pais professores, a experiência de mãe e mestra em terra nova-pátria para
desaguar toda essa afluência num novo ofício – o da escrita em narrativas
adoráveis!
Costumo dizer que
só se é bom cronista quem tem a competência de “temperar” a narrativa com
pitadas de poesia. E poesia, no caso, não se resume à forma, mas sim à essência
do texto. Poesia, num conceito melhor elaborado, é a alma das artes – e dos
feitos humanos. Bete Jufer é escritora de bom fôlego e refinado talento – isso
o leitor descobrirá em pouco, mal inicie a leitura deste Mundos Paralelos. Ela sabe bem dar ao texto de suas narrativas os
toques suaves da essência, como o alecrim nos assados ou o ponto ideal das
ervas finas no bom molho.
As lembranças da
vida nos anos de 50 e 60 (essas referências, em todo o livro, remontam,
obviamente, ao século passado) unem-se às vivências e observações da autora ao
ambiente de sua vida nos últimos 30 e poucos anos – as montanhas e bosques da
Suíça, inevitavelmente pontilhados de gente: um povo de muitas marcas
admiráveis por sua história, sua cultura variada e bela, seus costumes
saudavelmente amadurecidos e que hão de nos servir de exemplos.
Estes aspectos,
que me encantaram, hão de agradar também os leitores – entre os quais, eu sei,
estarão amigos de infância e de juventude da autora, bem como os familiares...
Enfim, os goianienses, nativos ou adventícios, que viveram a nossa cidade
daqueles tempos de Cine Goiânia, Jóquei Clube, Rua 8, Ateneu e Liceu, Campinas
e Setor Oeste, Instituto França e IEG... Ora, um emaranhado de locais e fatos
que constituem a nossa saudade.
Da saudade,
aprendi ainda moço, devemos extrair o que é bom – o que dói, há de permanecer
nos umbrais dos arquivos a serem esquecidos.
Orgulha-me ter
sido dos primeiros entre os privilegiados, isto é, os que puderam conhecer
antecipadamente estas narrativas de Bete França Jufer. Obrigado, Bete! Você é
bem-vinda a este mundo de escribas sonhadores, de saudosistas conscientes – e
felizes!
Luiz
de Aquino, da
Academia Goiana de Letras.
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