Batom
nas pesquisas
O noticiário da
tevê, no albor deste 2 de outubro, trazia a madorra das falas desnecessárias a
tentar narrar os dramas intermináveis do transporte urbano, a persistência dos
roubos em que bandidos em motos qualificam trabalhadores como vagabundos e
continuam, os repórteres, a dramatizar, com a desfaçatez dos canastrões, a
angústia das dores do povo esquecido que, agora, é visto como massa votante –
porém, sem a dignidade de cidadão que clama por respeito.
“Será sepultada a
menininha de quatro anos, vítima de tiros que matadores a mando de alguém num
presídio desferiram ao matar, também, o tio da criança”. “A agenda dos
candidatos a governador...”. “No terminal Padre Pelágio os passageiros
sofrem...”. Pronto. E daí? Ah!, falta falar de acidentes: “Na BR-060, um idoso
foi atropelado”...
Esqueço a tevê e
abro o jornal, releio o artigo Retrato de
Goiás sem retoques políticos, de Batista Custódio (edição de segunda-feira,
01/09). Batista faz análise da campanha para o governo de Goiás, mas desliza
para a História e destaca os quatro grandes líderes dos últimos 100 anos no
Estado, esses que “fizeram” seus sucessores sem sequer perceber que estes
tomavam assento na inevitável continuidade das gerações, renovando o fazer
político e exercendo sua liderança, um a um, cada qual a seu tempo, que a
máquina do tempo não pede combustíveis, não exige lubrificantes, não sofre
oxidação nem sofre panes.
Alguns estragos,
porém, acontecem no decurso das práticas humanas, e o tempo os absorve sem dar
mostras das avarias. Qualquer dano se transforma em subsídios para os dias,
semanas e anos pósteros, que o passado não tem reparos, não carece de revisões.
A cada líder no
exercício de seu mandato ou de sua direção há de estar preparado para os
embates, os desafios e os rigores do posto ante a massa votante e exigente de
feitos. Ao bom político é importante prevenir-se, pois, como li em algum lugar,
nos últimos dias, a palavra pronunciada não tem rascunho. Um bom líder há de
ter bons assessores – pessoas aptas a mostrar-lhe os riscos dos desvios, as
falsetas iminentes, o perigo das más interpretações e o perigo das péssimas
companhias.
Batista Custódio
começou assim: “Todo chefe de governo é circulado de corruptos. Eles vão se
aproximando na doçura dos elogios e irão distanciando Suas Excelências dos
amigos sinceros na opinião. Fazem-se de serviçais aos governadores e servem-se
da servidão do governo a eles”.
Estes são os
áulicos, os que se barbeiam duas vezes ao dia e se perfumam várias vezes. Não
duvidam que decorem frases inteiras de algum autor pouco lembrado, e as repetem
sempre que têm oportunidade, procurando impressionar seus ouvintes e,
sobretudo, o governador.
Batista continua:
“Tornam-se eminências pardas dos bastidores íntimos dos governadores e viram
(cada um) homem-forte do governo. Aparentemente amáveis, são mais perigosos que
um escorpião furtivo na discrição da cama. Até as primeiras-damas se valem da
sua aprovação prévia nos pedidos ao marido”.
Faltou dizer,
Batista, o quanto cada valete desse baralho exercita para mascarar-se de
competência, fingindo exercer o papel para o qual foi contratado, mas que, na
realidade, praticam somente aquilo a que se propõe: “Fazer negócios” (entre
aspas, porque é a frase pronunciada por um desses, recentemente, a propósito do
que realmente faz em sua pasta). Em negócios há sempre alguém que lucra; nos
governos, lucra o contratado, lucra quem o contratou e perde o Erário – sempre!
Mas o articulista
Batista Custódio bem os define: “Levam vantagem até nos prejuízos, ora com uma
ternura de santo, ora com a finura de um espinho, roubam no governo e furtam do
governador. Trancam segredos e guardam com eles as chaves que fazem do
governador seu prisioneiro inlibertável no inconfessável”.
Quanto à cadeia
dos quatro grandes homens deste pouco mais de um século (de 1909 até estes
dias), Batista demonstra como cada um formou o continuador de seu papel na
História de Goiás da seguinte forma:
“Antônio Ramos Caiado entregou Goiás mais evoluído do que
recebeu o estado. Pedro Ludovico transmitiu Goiás mais modernizado do que
entrou o Estado. Iris Rezende engrandeceu Goiás mais do que o estado que lhe
fora passado. Marconi Perillo trouxe Goiás para o futuro mais universalizado do
que buscou o estado ali no presente”.
Para mim, excelente síntese de 100 anos da nossa história em
apenas cinco linhas. Outros houve nesse interregno – e até mesmo a liderança de
Totó Caiado em Goiás se deu sem que o líder exercesse o governo do Estado; ele
preferia ser senador na Capital Federal, ali, sem dúvida, a vitrina era mais
ampla. Totó deságua, pois, em Pedro Ludovico, que preserva as divergências e
rejeições com o grupo que lhe fora adverso; e o poder de Pedro é bruscamente
quebrado pela onda do golpe militar de 1964, que, por sua vez, sofre a entrada
fulgurante de Iris em 1982 para, em 1998, o cetro simbólico ir parar nas mãos
do moço Marconi.
E esta semana, ou melhor, estes quatro dias que antecedem as
eleições podem equivaler, como preconiza o autor do artigo, a abertura para um
novo momento. O resultado virá, sem dúvida, da vontade soberana do eleitorado,
sem chance para armações desastrosas que, noutras épocas, marcaram a vida
eleitoral brasileira, mas que, nem assim, conseguiram impedir que essa mesma
vontade popular determinasse os novos rumos.
Enquanto isso, vivemos a dança dos números das incontáveis
pesquisas. Sequer temos tempo para analisar uma, a seguinte já nos é chegada e
confundem nossos cálculos e tentativas de prognósticos. E são tantas essas
pesquisas de intenções de votos que a manipulação salta aos olhos.
A sondagem encomendada por grupos interessados em resultados
(e até mesmo por candidatos) chega-nos com vícios e falácias. Ora é um
candidato de prestígio intermediário destacando-se como possível eleito, ora é
um dos mais prestigiados sendo deslocado para o Z-4 – parafraseando a linguagem
do futebol.
E esses maquiadores das planilhas supõem-nos bobos a
acreditar em tudo o que nos chega. Ora, nós não cremos sequer em suas
promessas, como acreditar nessas máscaras que, a rigor, não passam de meros
batons em tons dégradés?
Volto aos áulicos de gabinete, pessoas que inevitavelmente
passam também pelos comitês de campanha, e de novo recorro aos conceitos do
Batista Custódio: “Governador
não se dá bem com intelectual pensador e de caráter inquestionável no
verdadeiro. Pessoas assim são éticas, não servem para as fofocas brindadas nas
adegas inebriantes de poder nos celestes do envaidecimento vulgar”.
E, ainda e novamente, do mesmo artigo:
“O bajulador é um mestre que disfarça as aparências.
Maquia-se ao gosto dos engodos. O vulgo vê-os como puxa-sacos. Isso é o
apelido. O nome no passaporte na alfândega das altezas é puxa-vaidades. O único
jeito de flagrar sua identidade é vasculhá-los no semblante. São os homens com
cara de mulher puta, ou de moça de convento, ou de garbo imperial”.
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Luiz
de Aquino, especial para o DM
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