Educação
inovadora
Desde os
turbulentos e plúmbeos anos de 1970, quando me expurgaram das lides do
magistério, voltei-me para duas ocupações que, cada uma em suas peculiaridades,
supriram em mim o frustrado sonho de infância de dedicar-me ao ensino: a
literatura e o jornalismo. Articulista e cronista em periódicos desde 1967, não
foi difícil absorver a prática da coleta de dados e fatos, da redação, do
copidesque e da revisão (hoje, totalmente em desuso – e o resultado é a péssima
qualidade dos textos que nos ferem olhos e ouvidos), além da fotografia e da
diagramação.
Uns tempos antes
da minha estreia em livro, há exatos quarenta anos, eu já retornara às escolas.
Não como professor, mas como convidado para discorrer sobre literatura e, com o
passar do tempo, sobre vários outros temas que, indiscutivelmente, se inserem
no complexo da formação dos cidadãos.
Há três anos,
arrisquei: voltei às salas de aulas como professor. Senti-me motivado e
empolgado, mas esbarrei em limitações do meu intrínseco equipamento de
comunicação: meus ouvidos não colaboraram e desisti do retorno.
Refiro-me ao Colégio
Vicare, em Hidrolândia, iniciativa arrojada dos meus queridos amigos Sirlene
Gonçalves Xavier e Luiz Fernando Martins. A nova escola surgiu como uma súbita
ilha vulcânica no mar bucólico da cidadezinha simples e acolhedora em que
resolvi morar. O colégio surgiu com equipamentos de alta tecnologia, de modo
tal que seus alunos, em era de informática, se sentem bem ambientados.
Periodicamente
retorno à escola e sempre sou surpreendido com excelentes novidades. Da vez
imediatamente anterior, Sirlene mostrou-me uma novidade: adotou-se ali a
prática da Meditação, num empenho inusitado em Goiás, caminhando para nivelar o
Vicare a escolas do mesmo nível de países de ponta, como França, Estados
Unidos, Portugal e tantos mais.
Desta vez, a
diretora do colégio conta que os petizes (gosto de palavras em desuso, sim) têm
envolvido seus pais, ensinando-os a meditar, também. E esses pais narram o novo
vocabulário dos pequeninos (de pré-escola e primeiros anos do Fundamental):
“Eles repetem as minhas palavras para os pais”, emociona-se a professora e
psicóloga Sirlene.
Na sequência, ela
me conta da adoção do Método Construtivista como ferramenta pedagógica.
Parte-se do princípio da interação, ou seja, o aluno não é uma caixinha vazia
em que serão colocados conhecimentos. Ele já traz consigo o aprendizado de casa
e de sua comunidade, portanto o aprendizado se dá em dois caminhos. Muito do
que o professor teria a ensinar o aluno já sabe e o procedimento é, pois, como
uma troca, envolvendo aluno e professor e os demais alunos.
Em suma, é uma
prática em que não se passa conhecimento, apenas – troca-se. O propósito é,
enfim, ensinar e aprender a aprender. O professor não é, simplesmente, aquele
que ensina, mas um mediador do conhecimento nas ações de interação dos alunos.
Trata-se de uma filosofia de ensino inspirada no educador Jean Piaget
(1896/1980).
A argentina Emília
Ferreiro, obteve, em 1971, em Genebra, sob orientação do próprio Piaget, seu
título de PhD em Educação e, de volta à Argentina, publicou o livro Psicogênese
da Língua Escrita, em parceria com Ana Teberosky, defendendo que “a
aprendizagem se dá através do todo para as partes e que cada criança aprende em
seu tempo”.
Após a visita, e
pelo fato de Sirlene haver citado Rubem Alves (1933/2014) e seu livro “A escola
com que sempre sonhei sem imaginar que pudesse existir”, fui à minha estante.
Ali estava o livro, editado em 2001 (devidamente dedicado a mim, em autógrafo
de R.A.); nele, o mineiro de Boa Esperança (que viveu em Campinas, SP, até o
fim de seus dias), discorre sobre a Escola da Ponte. Desse livro, de apenas 120
páginas, extraí referências para um trabalho de pós-graduação, nos primeiros
anos da década passada. Claro, claro... comecei a relê-lo (gosto muito de
releituras e de “dialogar” com as anotações que fiz na primeira leitura).
Emociona-me,
também, ver o Vicare firmar-se em tão pouco tempo, marcar-se nesse empenho pela
elevação da qualidade de ensino. Uma cidade como Hidrolândia, berço do cantor,
instrumentista e compositor Ton Zêra, e dos escritores José Mendonça Teles e
Marieta Teles Machado, poderá despontar-se, num futuro breve, como polo de boa
educação, a despeito do empenho oficial em substituir escolas regulares por
estabelecimentos sob gestão da Polícia Militar.
Entendo que tal
medida é uma confissão de fracasso das autoridades que transferem escolas da
tutela da Secretaria da Educação para os comandos policiais. Em lugar da
militarização (fala-se que a mais tradicional escola de Hidrolândia será
entregue à PM nos próximos meses), as autoridades têm o dever de investir com
dedicação no sistema público civil de ensino.
Mas o que esperar
de um prefeito que mandou encaixotar os livros da Biblioteca Marieta Teles
Machado? E a população sequer lhe cobrou isso.
Bem! As dores
morais ante o descaso das autoridades constituídas e a militarização do ensino
em detrimento do estímulo à crítica e ao conhecimento amplo sem limites são
compensados, em mim, pelas notícias sempre alvissareiras que me chegam do
Vicare.
Ainda bem!
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Luiz de
Aquino é escritor, membro da Academia Goiana de Letras.
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