Poema que compus à beleza de Pirenópolis. |
Esta cidade,
rodeada de montanha...
(Crônica escrita em
março de 2003. Republico-a por gostar e querer, de coração. L.deA.)
Foi Isócrates de Oliveira
quem cantou: “Minha cidade é rodeada de montanha / tem um rio que a banha /
murmurando sem parar”. Eu, quando cantei, evoquei “manhãs alegres / sol dourado
junto ao rio / e um desafio a que acompanham violões”.
Como não evocar manhãs de
sol, tardes preguiçosas, noites alegres e madrugadas românticas nesta
Meia-Ponte das minas de Nossa Senhora? A do Rosário, dos Brancos e dos Pretos.
A dos Pretos ruiu sob os desgastes do tempo e a fraqueza das bolsas, minguadas
de recursos naquele tempo dos anos de 1940, quando os bancos faliam ante a
chamada moratória pecuária.
A dos Brancos, incendiada
sob o signo de Virgem naquele fatídico 5 de setembro de 2002. E a lembrança de
mim, embriagado na Festa do Divino, procissão com banda-de-couro. Inerte e bêbado,
quase impedi o retorno da procissão, deixado na soleira da porta lateral, do
lado da Rua Direita.
“Manhãs de festas /
acordando Meia-Ponte / ao pé do monte seus antigos casarões”. Meu canto é de
saudade; saudade de mim menino, ou de mim mais moço. O murmurante Rio das
Almas... “Rio das Almas / vai levando as minhas mágoas / em meio às águas / a
rolar, buscando norte”.
Foi na Ramalhuda, verão
em 1952, que me afoguei pela primeira vez. Um homem gordo tirou-me do poço
fundo e seu sorriso me deixou confiante. Afoguei-me muitas vezes mais, porém
sem medo. Em quantos poços, quantos copos me afoguei?
Poção da ponte, de tanta
memória! Música eterna das águas velozes... Meia-Lua, Pedreiras, Lajes... Tempo
matado sem pressa em tardes e manhãs de férias. Vô Luiz, meu xará de Aquino
Alves, maestro e seresteiro, não se banhava em casa – só nas águas do Rio das
Almas.
Meia-Ponte Pirenópolis de
serenatas e cerveja muita, cachaça e lua de prata. Meu primeiro porre... acho
que foi no Bar do China, irmão de Pérsio Forzani, no casarão que, caído, deu
lugar à atual Casa de Justiça.
Antes dos porres, os
amores são a mais doce lembrança. Amores furtivos às margens do rio, amores
inebriantes atrás das igrejas, ao sopé dos montes, no pico do Frota entre as
antenas de tevê (o som da cidade, a cidade lá longe, o ar fresco da noite e a
poesia emergente).
Serenata de metais e
cordas na noite serenada. Caju batizado na casa de Wilno. Alexandre, o maestro,
era um menino que tocava na banda. Meu Vô Luiz tirava notas carinhosas de um
trombone e eu volitava, rumo ao passado, para encontrar meu tio Ismael, o da
clarinete, e Dito de Melani, o do pistom.
“Ai, que saudade / de
acordar ao som do pinho / cá no meu ninho / e sentir a lua cheia / na serenata
/ que dá vida à noite calma / e leva a alma / à viola que ponteia”. Meu canto
de versos ganhou roupa nova na canção de José Pinto Neto. Zé Pinto, o de Caldas
Novas, meu parceiro musical, também se foi mais cedo. Foi encontrar os
meia-pontenses idos antes, como meu Vô.
E Pirenópolis, a das
verônicas do Divino, das congadas e dos doces cristalizados, a do licor de
jabuticaba e vinho de caju, a Pirenópolis dos meus sonhos e minhas saudades,
essa que não dorme... Essa, a cidade rodeada de montanha, encimada na paisagem
pelas três colinas aniladas dos gigantes Pireneus, ah, essa!...
Minha, nossa, eterna
cidade de Nossa Senhora do Rosário! Não há fogo nem enchente que te apague de
nossas almas.
******
Luiz de Aquino, escritor,
membro da Academia Goiana de Letras.
Um comentário:
Sozinha, vi um pouco. Não penso em voltar. Apreciei o luar, vagando. Abrace-a...
Postar um comentário