Opiniões
sem lastro
Recebi de O Globo (13/12/19): "O essencial da manhã: Governo
federal socorre Crivella com R$ 150 milhões".
Leio aqui mesmo, no
Facebook, opinião de pessoas das minhas relações acusando veementemente as
Organizações Não Governamentais (genericamente) de atuarem contra os interesses
nacionais, espionando e cometendo crimes na Amazônia. No "Bom dia,
Brasil", notícias de que, ontem, a PF prendeu uma quadrilha que armava
grileiros e garimpeiros no Amazonas e no Pará para agirem em terras públicas e
reservas indígenas.
O ódio dessa
direita mal pensante (a direita de décadas atrás era formada por pensadores
respeitáveis... tsc tsc tc) é dirigido às ONG que atuam na Amazônia. Talvez até
mesmo contra essas formadas por assistentes sociais e profissionais da saúde
que prestam serviços notáveis em regiões carentes. Mas jamais vi essas pessoas
discursando sobre o segmento mais perigoso das... ONG: igrejas evangélicas da
linha instaurada no Brasil desde a década de 1980 – coincidentemente, o período
em que teve início a redemocratização.
Antes,
"crente" era o epíteto para os seguidores de igrejas protestantes
altamente respeitáveis, dirigidas por pastores de formação e nivelados com os
padres no que tange ao conhecimento religioso e, em decorrência, à
respeitabilidade que inspiravam. A esse novo tipo de ONG, com fim específico de
alienar as populações periféricas (refiro-me aos moradores das regiões
lindeiras aos centros urbanos, mas também aos que não quiseram ou não
conseguiram alcançar uma formação intelectual melhorada), concedendo-lhes
privilégios materiais que "parecem" milagres para seduzi-los à fé.
A
epidemia contaminou grande parcela da população, como era colimado, e o
resultado foi o surgimento de grandes "marcas" de "denominações
religiosas", do enriquecimento súbito e não tributável de alguns pastores
e da - esta, sim, a grande meta – a formação de um expressivo setor político:
vereadores, deputados estaduais e federais e senadores, depois prefeitos e
governadores e, agora, um presidente - fiel às linhagens neopentecostais.
Tenho visto que é
acentuado o preconceito contra pretos e índios, além do ódio às ONG, entre
essas pessoas, bem como a misoginia, a homofobia e a idolatria ao país-sede
dessas armações políticas contra a América Latina em geral e o Brasil em
especial - a terra do Tio Sam. Mormente agora, com Trump.
Gosto do conflito
de ideias. Mas de ideias, e não se chavões, de dogmas ou falácias. E
sabemos bem o que são ideias legítimas e respeitáveis e o que são as listas de
"pode" e "não pode" que se "herda" não de uma
linhagem famílias, mas de um grupo colonizador.
As maldades da
Igreja Católica nos tempos da colonização da América Latina provocaram,
especialmente no Brasil, o sincretismo religioso - hoje, um patrimônio cultural
imaterial de nossa Pátria. Mas considero caro, muito caro, o preço pago pelos
ancestrais indígenas e africanos que se integram à nossa formação genética e
cultural, não me atrevo a dizer que isso valeu a pena.
Por outro lado, e
vem da minha adolescência, apeguei-me a alguns jargões que, agora acredito,
eram mal aplicados pelos doutrinadores políticos daqueles tempos:
"Autodeterminação dos povos" (pregada por lideranças
norte-americanas, falaciosamente, e apropriada pelos esquerdistas); "Culto
a personalidades" - bandeira levantada por Nikita Khrushchov para apagar a
idolatria aos que o antecederam no poder; "Deus, Pátria e Família",
dístico aparentemente digno, mas adotado (ou criado, sei lá) pelos
integralistas de Plínio Salgado, revivido na campanha política pela cúpula que
elegeu Jair Messias Bolsonaro em 2018.
Acredito, sim, mas ao pé da letra, que cada povo
tem o direito de determinar o regime que melhor se lhe aplica - não foi o que
fizeram os líderes soviéticos ao longo de quase todo o século 20. Desconfio
seriamente do dístico "América para americanos", que, diziam, era a
máxima da Doutrina de Monroe – por todas as suas ações, não se trata de
reservar o continente para seus povos de várias nuanças, mas de mobilizar todos
esses povos para os interesses "americanos" (a população dos EUA). Afinal,
esta trupe renega todos aqueles latinos nascidos em solo americano (chamados
por eles de "bebês-âncora", como se tivessem sido feitos pelos pais
somente para garantir a cidadania), priorizando apenas os que são de pele
branca e cabelos claros.
Levo a sério isso
de não cultuar personalidades; admiro muitos vultos históricos, mas só o faço
quando posso avaliar também o seu lado que não me agrada e que, sopesando
méritos e defeitos, concluo que o bem-feito supera as fraquezas (e por aí vou
eu).
Por isso, abomino
as pessoas que leem em cartilhas previamente escritas. A minha cartilha tem de
conter muito da minha lavra, também, pois que aplico meu senso crítico ao que
leio para, em seguida, tentar montar os meus conceitos.
Resumindo: ainda
que eu tente, o Brasil ainda se divide (e nestes dias, mais ainda do que nos
tempos da ditadura) em direita e esquerda (durante o regime militar, a esquerda
era multifacetada e se estendia desde os pensadores pacifista até os radicais
da luta armada) e a direita congregava seus respeitáveis pensadores, em torno
dos quais gravitavam os "menos dotados" ávidos por cargos públicos em
que se locupletavam e ainda os que preferiam a iniciativa privada, desde que a amizade
com o poder lhes permitisse que também se locupletassem – ou seja, ambas
praticando uma atuação cega, surda, muda e burra.
E, concluindo: a ajuda
de Bolsonaro a Crivella é parte do pacto eleitoral do ano passado; ou é ordem
da famosa agência de inteligência do "irmão do norte" – a qual pode
sim, ser o centro criador da nova onda “religiosa” do Brasil de agora.
* * * * * *
2 comentários:
Que absurdo é esse de Crivela? Como assim? De onde saiu essa grana?
Um ano sem opinar neste espaço, enfim uma nova e boa análise, bem escrita e sensata, sem tomar partido de forma cega, ainda que seja crítica em relação a montagem de um governo fundamentalista. Sim, ele aponta armas e prega o extermínio de quem pensa diferente dele. Chegamos a era de sugerir matar em nome de Deus. Oremos!
Postar um comentário