Esperar o quê?
As maiores cidades brasileiras, em
sua maioria, ainda esperam o segundo turno da eleição para prefeito. Definidas
estão as cúpulas políticas - Executivo e Legislativo - em todas as de menor
porte e, ironia destes dias pós impeachment, a maior das nossas metrópoles
simplificou a vida de candidatos e eleitores, elegendo um empresário sem
qualquer experiência política senão a admiração ao próprio pai, expert na área.
Tenho dito, sem muitas restrições, da
alegria de morar numa cidade da região metropolitana de Goiânia. A pequenina
Hidrolândia, que já se chamou Santo Antônio das Grimpas, tem muito de bucólico.
Uma das grandes alegrias, coisa que
nos oferece melhor "qualidade de vida", é o padrão de atendimento em
quaisquer das casas de comércio. Neste quesito, um forasteiro (como eu) é
recebido com sorrisos espontâneos - algo que reputo como marca do
hidrolandense.
Faz-nos falta algo do que queremos
como atividade cultural. Fico sabendo, nas conversas com as pessoas que me
surgiram como os primeiros novos amigos, que há poetas na cidade, que alguns
nomes das minhas relações de décadas idas (como o compadre Luiz Fernando,
neurologista e vila-novense; o professor Sérgio Paulo Moreyra e outros mais),
mas incomoda-me saber que a atual administração municipal (o prefeito Paulinho
foi reeleito) mandou empacotar o acervo da Biblioteca Marietta Telles
Machado.
Sim, o que se nos figurava como justa
homenagem à querida Beca - apelido pelo qual era tratada pelos que a amavam -
foi revogada não por alguma lei local, mas pela atitude de menosprezo. "O
prefeito preferiu instalar uma brinquedoteca no lugar da Biblioteca",
esclareceu a pessoa que me contou esse infausto. "Em lugar de substituir,
porque ele não associou a Binquedoteca à Biblioteca?", perguntei-me a mim
mesmo.
Entendi a reeleição como o voto de
apreço ao conterrâneo, da parte dos eleitores. O concorrente de Paulinho (é
assim que toda a cidade se refere ao prefeito, o craque que se revelou no Vila
Nova e atravessou o Atlântico para brilhar "nas estranjas"),
empresário bem situado, obteve apenas 1/3 dos votos úteis, ou seja, o reeleito
se consagrou com dois entre três votos.
Louvável, pois, no meu conceito, isso
de se preferir o filho da terra. Mas esse resultado, a par da alegria pelo
prestígio, equivale a cobranças severas. Se me permitirem opinar, exigirei a
reativação da Biblioteca - e não seria demais pedir que se amplie e renove o
acervo. Mas se essa exigência vem de um jornalista, poeta, contista e professor
por formação e paixão, faço coro com a comunidade em geral, que anseia pela
solução de um gravíssimo problema - a poluição do Ribeirão das Grimpas.
O que angustia o povo de Hidrolândia,
que já se manifestou maciçamente, é o que faz uma importante indústria de
laticínios. Dizem, nas rodas, que essa indústria tem os filtros que a lei
exige, ou seja, consegue (sei lá como) escapar da ação dos fiscais, mostrando
tal equipamento. Mas os fiscais não trabalham nos horários e dias especiais,
como finais de semana e feriados, quando os funcionários são orientados a lançar
dejetos diretamente no curso d’água.
Por que razão o órgão ambiental da
Prefeitura ainda não agiu no sentido de regularizar isso? A poluição atinge
todos pelo péssimo odor, pelas doenças que pode gerar e compromete seriamente a
produção dos pequenos sitiantes, fornecedores de hortaliças frutas e outros
itens indispensáveis.
Não cabe ao nosso alcaide, nestes
quase três meses de sua primeira gestão - nem nos 48 do segundo mandato -
repetir o jargão "eu não sabia", porque ele sabe, sim! Seus agentes
já deviam ter advertido, cobrado, multado, interditado e mesmo processado o mau
empresário que não respeita a cidade e seu povo.
Obviamente, como morador que escolheu
viver em Hidrolândia, hei de lhe cobrar tais atitudes, tanto no que tange ao
fazer cultural e à educação pública quanto no que se refere ao bem-estar, na
restauração do importante caudal das Grimpas.
E não é só: muitos dos serviços
públicos de que carece a cidade e seu povo serão observados por mim e,
inevitavelmente, divulgados neste meu espaço semanal de crônicas. É o mínimo
que devo fazer para dizer aos meus concidadãos que me sinto muito feliz e
compromissado com a cidade. Afinal, eu escolhi viver aqui.
*****
Luiz de Aquino é jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de
Letras.
3 comentários:
Meu poeta, bom dia!
Acabei de ler seu artigo no DM. Excelente. Gosto muito da forma simples e objetiva como você escreve. Hidrolândia agora tem uma voz inteligente pra representá-la.
Um abraço pra vocês!
Caro Luiz,
Bom ter você como nosso conterrâneo, hidrolandense honorário já integrado à comunidade, defendendo melhorias e chamando a atenção de autoridades para o descaso com a cultura. Obrigado por mencionar a biblioteca com o nome da Bequinha, que já rodou por 3 lugares até aonde eu sei. Também pela evocação tão simpática dela, ainda tão lembrada e querida pelos hidrolandenses que a conheceram.
O desleixo com a memória e a preservação da cidade é de doer. Da minha família, de 7 casarões, 2 já foram demolidos. Os quintais imensos foram retalhados e suponho que apenas 1 em toda a cidade ainda se conserve. Há cerca de três, quatro anos botaram abaixo dois belos casarões: um virou depósito e o outro uma construção feia. Da casa onde nascemos, resta a fachada, modificada embora, ainda que preservando aspectos originais. Da calçada de pedras, do quintal imenso, nada restou. Lá onde está a escola que hoje homenageia minha tia Augusta de Souza Machado, já foi uma linda praça, destruída na década de cinqüenta. E a bela e singela Igreja de Santo Antônio das Grimpas, que era sozinha na praça, hoje está rodeada de barracões pavorosos. E por aí vai. Na minha última visita à rua que vai para o cemitério procurei pela casa do meu primo Zé Mendonça (José Mendonça Teles) mas não tenho certeza se a encontrei. Ter você defendendo nosso patrimônio com a força de suas palavras – respeitado escritor que é – certamente fará com que os dirigentes cuidem do assunto com mais interesse.
Receba meu abraço e agradecimentos pela vigorosa página “Esperar o quê?”.
Antônio Carlos
Você, enquanto jornalista, tem força necessária para chamar a atenção dos gravíssimos problemas de nossa cidade e abrigo. O meio ambiente é um bom viés de discussão, porquanto não envolve partido ou interesses políticos imediatos. Restaurar o antigo teatro – em frente ao Donizete – para eventos teatrais e musicais seletos se justifica, mesmo enquanto se procura montar em bois nos rodeios-shows .Abração e me faça informado de seus eventos. Torço por eles.
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