Ah,
essa falsa autoridade!
A pior marca de um
despreparado investido em função de mando é a petulância autoritária.
Nos meus saudosos
tempos de bancário, lembro-me que um subgerente (todo sub se acha autoridade)
vociferou ao meu lado: “Quando dou uma ordem é para ser cumprida”, ao que um
jovem colega, estudante de ciências humanas na universidade, evocou o
tristemente famoso provérbio “Manda quem pode, obedece quem tem juízo” – e o
subgerente estufou o peito, sem saber que era alvo de finíssima ironia.
Lembro isso para
me referir a “autoridades” nomeadas que exigem de seus subalternos obediência
cega às suas ideias e criações. Uma das mais graves manifestações de ignorância
dessas autoridades por nomeação é impor grafias ou frases errôneas. São
superintendentes, secretários, gerentes ou assessores, tanto no âmbito dos
estados quanto dos municípios – e, pasmem!, até mesmo executivos de empresas
privadas – que rascunham um ofício ou memorando e exigem que alguém
(geralmente, com maior conhecimento que o tal chefe) assine, e não aceitam
revisões: “Digite de novo, mas do jeito que eu escrevi”.
E tem-se ainda o
uso de expressões da moda, como já houve com “a nível de” e de “veja bem”, e o
“enquanto” aplicado como circunstância fora de tempo. Ou de “onde” como se
fosse um advérbio de tempo. Ou, para nosso aborrecimento maior, o modismo de
“todas e todos” e “por meio de” quando a expressão, em mais de 90% dos casos,
se faz totalmente desnecessária. Repórter de rádio, falando de um acidente
trágico em Sergipe, disse “O governador decretou, por meio de nota, luto de
três dias”. Ora, quando se decreta algo, isto se dá por decreto! Não é por
nota, não.
Esses errinhos
bestas são imposições de autoridades – no caso, um assessor de comunicação que
não transita com autoridade pela linguagem escrita.
Aprendi na
Universidade, há mais de 50 anos, que autoridade é conhecimento e não surge por
nomeação. Querem ver alguém ocupar um cargo sem qualquer autoridade? É quando
se nomeia a pessoa errada para determinado cargo. Em Goiás, na esfera da
Cultura, já tivemos péssimas experiências com essas “otoridades”. Legítimos são
Kleber Adorno, Nasr Chaul e Raquel Teixeira – esta, autoridade incontestável em
Educação, conhece bem o papel da Cultura (coisa que em alguns países, com desenvolvimento
muito acima do nosso, engloba a Educação, enquanto no Brasil se faz o
contrário).
Esta semana, fui barrado
no edifício das bibliotecas e da administração do Centro Cultural Oscar
Niemeyer. A mocinha da recepção, bonita e educada, com certo constrangimento,
cumpria ordens “de cima”. Claro, estou com os cabelos grandes, disformes, e não
estava vestido como se espera de um sujeito cima de 70 anos, ainda que membro
de cinco academias (inclusive a Academia Goiana de Letras), ex-presidente da
União Brasileira de Escritores e com uma ficha de quatro décadas de serviços
efetivamente prestado às letras e, em menor escala, a outras artes de nossa
terra.
A autoridade do
CCON é alguém que cuidou de grudar num poderoso, alguém realmente autoridade em
Cultura para obter uma indicação para o cargo, e lá está ele. E sabendo da
minha indignação pelo impedimento, recomendou a uma assessora que me ligasse
para pedir desculpas.
Ora, a moça não me
devia desculpa alguma, e não se justificava o recado do chefete dando conta
de que demitiria a pobre moça que apenas cumpria ordens estúpidas. A assessora
falou-me de uma “empresa terceirizada” e respondi que se algo há de
terceirizado ali não era a tal empresa, mas o titular do órgão.
Reafirmo.
******
Luiz de
Aquino é escritor, membro da Academia Goiana de Letras.
Um comentário:
QI é una "m"!
Há 40 anos, fui vergonhosamente corrigida por uma "chefa" na Secretaria de Educação por ter usado havia três dias. Aquela professora tentou me humilhar, diante de colegas que aguardavam atendimento. Saí do prédio, entrei na primeira livraria que encontrei e comprei uma Gramática Normativa e esperei que fosse cuidadosamente embalada. Retornei, solicitei à recepcionista que chamasse a "otoridade" e gentilmente ofereci-lhe o presente, pedindo que o abrisse na presença dos demais. Elevei o tom de voz e disse-lhe que voltasse a estudar o emprego do verbo haver, pois ela havia estudado na mesma Escola Normal que eu e éramos ambas concursadas . Sentei-me e aguardei ser chamada, pensando na sutil diferença entre cargo e função. O que muitos chamam de atrevimento eu chamo de defesa. Atualmente, nos municípios do interior, é comum ver Professor II dirigindo escolas de ensino médio e cursos de formação profissional a repetir "havia dito".
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