A
crônica, modo de fazer.
(Republico esta crônica, escrita há
quase dois anos, para atender ao pedido de um bom amigo)
Escrevo neste
sábado, 31 de outubro, em 2015. Estou nas primeiras semanas de uma nova idade,
muito feliz por ter vencido a surpreendida década dos 60 e, pelo óbvio, chegar
à marca dos 70. Portanto, sou um septuagenário que dá graças a Deus e aos
competentes anjos que tão bem me guardaram para atingir este feliz estágio.
No dia anterior,
dia 30, por convocação da mui querida Maria de Fátima Gonçalves Lima,
coordenadora do Mestrado em Letras da Pontifícia Universidade Católica de
Goiás, participei de uma mesa-redonda para falar de crônica. Comigo, o guru
Luiz Augusto Paranhos Sampaio, um homem de muitos títulos de professor (Português,
Francês, Literatura Brasileira, Literatura Portuguesa, Literatura Francesa,
algumas disciplinas de Direito no ensino superior, vereador e presidente da
Câmara Municipal de Goiânia, Subprocurador Geral da República, assessor de
destacados governadores e ministros etc. e tal, tal e tal! E também a poetisa e
cronista Maria Lúcia Félix, que entre suas referências pessoas, acrescentam-se
as ligações sanguíneas com uma nobilíssima família de letrados (o pai Domingos,
os tios Aída, Afonso e Manoel – respectivamente crítico literário, contista,
poeta e compositor, mas todos eles com incursões nos demais gêneros literários
– referi-me aos que mais se destacaram em cada um deles).
Falamos para uma
plateia de estudantes e professores da PUC, sob a mediação do jornalista (e
mestre e doutor em Letras) Rogério Borges. O colega, que por muitos anos atuou
em O Popular, sempre com destaque na cobertura literária, é também professor na
PUC. E em cada um de nós a alegria de discorrer sobre o ofício da escrita e o
inexplicável prazer da crônica, da concepção, escrita, publicação e até a
leitura, eis que somos todos dedicados leitores dos que registram o quotidiano
e suas impressões várias.
Uma das mais
indagadas questões ao cronista diz respeito à escolha dos temas. Acontece, às
vezes, que algum leitor nos sugira ou mesmo peça algo sobre determinado
assunto, mas até mesmo essa sugestão ou pedido implica não um desejo de ver o
tema publicado – mas especialmente a opinião do escriba (Jô Sampaio, excelente
cronista, além de poetisa, professora, crítica literária e contista, não gosta
deste termo, acha que enquadra o escritor num time de maus escrevedores – mas
acho eu que isso não nos diminui, não...). E é a opinião do escritor de sua
escolha – razão porque sempre atendemos com alegria.
O ponto alto do
nosso encontro ficou por conta justamente do meu confrade acadêmico Luiz
Augusto P. Sampaio. Ele estreou no gênero em 1958. Foi ele o primeiro cronista
de Goiânia a publicar um livro de crônicas e o fez num elevado respeito à jovem
capital, pois o seu livro teve por título (e cenário) justamente o ponto alto
da vida sócio-política de então: “Café Central”.
Em Goiânia das
primeiras cinquenta décadas, o Café Central (esquina da Rua 7 com a Avenida
Anhanguera) estava para a capital como o Vaticano para Roma. Em lugar de tentar
definir isso, sugiro ao leitor que procure ler esse livro, que saiu a lume em
1964 (há 51 anos, pois!) mas tem segunda edição publicada na Coleção Goiânia em
Prosa & Verso, que era realizada pela Prefeitura mas o atual prefeito
demonstrou seu carinho para com as Letras e a História encerrando sua
existência de modo arbitrário, como uma confissão de ignorância intelectual.
Luiz Augusto teve
o mimo, ou o capricho, de delinear uma classificação para as crônicas, e as
intimistas (e piegas) foi o degrau da escala (ou escada) que mais me intrigou.
Sim, que a crônica, tida por acadêmicos de menor alcance de inteligência como
um “gênero menor” ou mesmo um “subgênero”, é um segmento da escrita que resulta
na narrativa curta e leve, muito próxima do conto – mas este pede mais
profundidade ou peso – e praticada por quem tem, no mínimo, uma forte
sensibilidade ante a história, o quotidiano, o social e o psicológico. Ou seja,
não é para qualquer um! Conheço bons poetas e contistas aqui mesmo entre nós
que se dobram de inveja dos que a praticam – e não o fazem por total
incompetência, por lhes faltar a sensibilidade mínima e, em alguns casos, mais
ainda, a verve poética.
Ninguém é bom
cronista se não for, ao menos no íntimo, um bom poeta.
E aos incautos e
precipitados, eu afirmo, com o coro dos de bom-senso: não existe gênero menor.
O que existe – no romance, na crítica, na poesia, no conto e na crônica – é
escritor não qualificado.
*****
Luiz de Aquino é jornalista e escritor, membro da
Academia Goiana de Letras.
Um comentário:
Ah, poeta, com todas as letras maiúsculas, eu, se é que sei, só sei escrever crônica. Faço isso toda semana, uma a duas vezes, há uns 15/16 anos e venho sorver em sua fonte, o cálice do belo. Sua sensatez o faz acima das críticas dos néscios, e contra elas é preciso se posicionar, coisa que você faz com distinção. Palmas pra você!
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