Poesia à chuva e na madrugada
(Prefácio para o livro Partitura bajo la lluvia, da poeta colombiana Lyda Cristina
López, cujo lançamento dacontece neste sábado, 21 de abril, em Bogotá. L.deA.)
Poesia não é somente a construção de versos emocionados e impactantes,
como querem alguns. Poesia, para mim, é a alma das artes. É o sentimento humano
– ou a capacidade humana de se emocionar ante algo.
Sei de mim e dos que me são próximos que as pessoas nascem poetas.
Alguns se comprazem em descobrir sentimentos e sentidos para a vida – e se
fazem poetas pela vida inteira. Outros se esquecem. Vejo poesia num improviso
feliz do atleta e na exatidão matemática da dança. Ao meu modo, como qualquer
outro poeta, saberei contar em versos o que me emociona.
Há, porém, poetas de variadas formas de dizer – ou de narrar. E cada um
marca a sua poesia com tudo o que traz na alma e consegue realizar com a
matéria corporal, seja escrevendo, seja cantando ou encenando em teatro, além
de nos causar enlevo com a magia da música.
Descobri a poesia de Lyda Cristina Lopez em seu livro anterior, Carta
para um hombre en el crepúsculo. Encantei-me de seus versos, seu modo
simples e rico de conceber os versos e concluir com maestria os poemas. Ela
sabe, como poucos, eleger seus temas e os desenvolve com talento e magia. Que
doçura encontrei em
Vestirme de noche,
y visitarte enn la madrugada.
y visitarte enn la madrugada.
Llevar conmigo uma estrella
y salir a recorrer el mundo.
y salir a recorrer el mundo.
(in Días sin regreso)
Senti-me feliz quando a poeta Lyda Cristina surpreendeu-me com um
convite: escrever um prólogo para seu próximo livro. Recebi, por e-mail, seus
originais (devo dizer que não nos conhecemos pessoalmente, ainda) que li com a
certeza de que estava, uma vez mais, diante de um livro de poesia excelente,
límpida como noites de estrelas, translúcida como água da fonte que desce a
montanha.
A cada verso, estrofe a estrofe, tentava adivinhar a pessoa atrás da
pena, a mão sobre o teclado mas, especialmente, a cabeça e a alma que animam o
corpo, define a mulher e determina a poeta. Nosso elo é minha prima Lucila - mulher de seu irmão gêmeo, Júlio - que me presenteou com o já citado livro
anterior de Lyda Cristina. Lucila contou-me não só da pessoa poeta que faz
brotar estes poemas, mas situou-a na Geografia de sua pequena cidade, Ginebra,
ao pé da montanha, onde a vida segue seu curso sem pressa nem medos e onde a
primavera se eterniza nas orlas dos caminhos. Voltei a ler – pela terceira vez
– os poemas de Partitura bajo la Lluvia, agora, o saber da pessoa, além
do sabor dos versos e dos poemas.
Intrigava-me o título. E me transportei para tardes e noites chuvosas em
Ginebra, encontrei – sem que ela me notasse – a poeta a compor poesia como um
musicista elabora sua escrita de colcheias e semibreves, de claves de Sol e Fá.
Acredito que sei bem como fluem os elementos da criação, em música como em
versos. Ao recorrer aos dicionários para elucidar alguns trechos, saboreei
descobertas e me senti como que parceiro ou sócio da poeta. Tola pretensão,
esta minha!
O fato é que me embriagaram a surpresa e o ambiente. A chuva constante,
como nas narrativas de Gabo Garcia Marques, é como um instrumentista a oferecer
compassos ao poeta.
Una gota se repite
y el sonido
del agua no se detiene,
va y viene.
..................
¿Dónde quedó la madrugada
cuando la lluvia interpretó su partitura
y convirtió la noche en puntos suspensivos,
las estrellas en interrogantes,
la luna en una coma
y el silencio en punto aparte?
Em momentos outros, em outros poemas, outros versos, encontrei-me como
quem passeia com a poeta, pois também sou notívago como os lobos e as corujas.
Contudo, sou apreciador de quem sabe, com competência, descrever situações que,
em algumas circunstâncias, apenas nos inibem – e nos silenciam, como nesse
poema:
Huellas
Por eso estoy aquí aventando palabras contra el cielo indiferente.
Manuel Scorza
Cada horizonte
congela en su melancolía una lágrima.
Un rayo de luz enciende una idea,
una estrella baña de mutismo las palabras.
Silencios que se albergan en diálogos,
abren puertas para nuevos milenios,
exorcizan lamentos,
desentierran cantos de viajeros olvidados
y dejan huellas de grandes sabios.
Aparece un ángel
y dibuja la paz entre ellos.
Recobro o fôlego e os sentidos, emocionado. Volto a ler, a reler seus
versos, ó poeta Lyda Cristina, e fico a imaginar a obra finalizada, o livro
pronto em volume solene. Sinto que será bonito e agradável, como o que ganhei
de Lucila. E em forte calor, mesmo que sob um sonoro chuvisco, sinto-me,
leitor, seu parceiro de escrita e sentimentos, perguntando-me com suas
palavras:
¿Dónde quedó la madrugada
cuando dejé escapar las palabras?
*****
Luiz de Aquino
Poeta, da Academia Goiana de Letras
(Goiânia, Goiás, Brasil)
Poeta, da Academia Goiana de Letras
(Goiânia, Goiás, Brasil)
Nenhum comentário:
Postar um comentário