As
mãos da paz
Era 1979, agosto.
O Brasil vivia ainda o regime do arbítrio, mas os ventos da Anistia já se
anunciavam no horizonte de todos os quadrantes. A notícia da morte de Pedro
Ludovico correu a cidade, invadindo-nos os ouvidos como a luz de um raio nos
enche os olhos. Tinha 89 anos e estava viúvo há algum tempo.
Repórter do Cinco
de Março, o semanário que antecedeu o nosso DM, evitei a Assembleia Legislativa
ao longo do dia, local do velório. Era perto de meia-noite quando, ao lado de
alguns colegas de trabalho, cheguei ao Palácio Alfredo Nasser (sede do
Legislativo goiano). O local já se esvaziava quando, de um carro, dois homens
desceram e cuidaram de auxiliar o terceiro, idoso, bastante conhecido de todos
– o udenista Wilmar Guimarães, ferrenho adversário de Pedro Ludovico Teixeira
ao longo de toda aquela era política. Seus acompanhantes, se bem me recordo,
eram o seu irmão caçula, William, e seu filho Wilmar (Guima).
Os presentes –
jornalistas e políticos, além de alguns populares – olhavam com perplexidade. O
embate político entre Pedro e Wilmar era notório; mas o velho adversário,
amparado pelos moços, caminhava determinado até o corpo em velório. Levava uma
rosa, que depositou no peito do morto e, sabendo que surpreendia, esclareceu
que “sempre fomos adversários políticos, jamais inimigos”, e arrematou com
referências elogiosas ao caráter, à coragem e à determinação de Pedro, fatores
que o marcaram bem.
Esse quadro vem-me
à lembrança ao ver a manchete de hoje do DM, dando conta do gesto de paz entre
os dois maiores líderes políticos de Goiás desde aquele agosto de 1979 – Iris
Rezende Machado e Marconi Perillo. Iris firmou-se no quadro político de Goiânia
nos anos de 1950, quando se elegeu vereador. Na década seguinte, elegeu-se
deputado estadual, depois prefeito e foi cassado pelo regime militar, punição
que os generais haviam imposto também ao senador Pedro Ludovico.
Iris retornou à
política elegendo-se governador em 1982. O jovem deputado federal Marconi
Perillo – que já cumprira um mandato de deputado estadual – atreveu-se a
pleitear o Palácio das Esmeraldas em 1998, enfrentando Iris numa campanha
histórica e consolidou-se, assim, sua trajetória de grande líder, só comparável
mesmo a Iris Rezende. Mas divergências de postura e escolhas políticas,
fortalecidas pelas posições contrárias nos pleitos seguintes, criaram uma
barreira ao convívio desses polos das preferências do eleitorado goiano.
O anúncio dessa
proposta de harmonização chega-me como um sinal de boas-novas ante as cascatas
de más notícias que invadem nosso bem-estar a cada novo noticiário de rádio e
tevê. Goiás tem vivido tempos difíceis, também, com o quadro da economia local
e a crise que atinge todos os governos nos três níveis da vida pública.
Enfrentamos, agora, outras medidas amargas dentre as providências para
conciliar arrecadação e gastos, e sabe-se bem que a herança de Paulo Garcia
chegará a Iris, mais uma vez eleito prefeito de Goiânia, com “um gosto amargo
de fel”, como o verso de Gonzaguinha.
A harmonia entre o
Paço Municipal e o Palácio Pedro Ludovico é vital para Goiânia e os goianos, e
Marconi tem procurado esse mesmo tom entre o Governo e as Prefeituras em geral.
Iris, no pedestal de seus 60 anos de vida pública, o rosário de vitórias e o
aprendizado calejado nos ofícios exercidos (vereador, deputado, prefeito,
governador duas vezes, ministro de Estado duas vezes e senador, além do retorno
à prefeitura de Goiânia, agora, pela quarta vez) conhece bem os benefícios
dessa harmonia.
Entendo que ambos,
Iris e Marconi, pensam em Goiás. E assim pensando, oferecem-nos a esperança de
tempos melhores, como se Marconi propusesse a Iris um fraterno abraço pelo
aniversário na próxima semana, e Iris retribui com os afagos natalinos.
E Goiás, todo o
Estado, se regozija com esse gesto de sabedoria que bem resultará nas hostes
políticas.
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Luiz de
Aquino é jornalista e escritor.
Um comentário:
Estou distante, e mal conheço os dois políticos, mas pelo que venho lendo no DM, o que me vem à mente seria uma parceria com vistas ao Governo Federal.
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