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quinta-feira, julho 10, 2014

Apocalipse ou holocausto?

Sem imagens; não vejo porque ilustrar esta tristeza...


Apocalipse ou holocausto?


Depois daquilo tudo, o peso de um século da palavra Seleção desalinhou a coluna dorsal do oceano amarelo das arquibancadas, das ruas, dos lares e bares deste país-continente. Sofrer um gol aos 11 minutos é natural; mais um aos 23, dói – mas convenhamos que estava normal, ainda. Triste mesmo foi viver aqueles seis minutos seguintes.

Afinal, o que houve? Diz o Gabriel, meu afilhado, que já bateu bola enquanto pôde e, aos 17 anos, certamente fará isso ainda por mais alguns anos, que “todo mundo que já jogou sabe que de vez em quando bate uma bobeira”.

Mas, peraí! Astros (e não heróis, como querem os locutores de esporte) daquela magnitude não têm o direito de sofrer bobeira num jogo daquela importância. Pouco se me dá neste domingo, dia da decisão em que deveríamos posar de favoritos, com tudo o de melhor nas cabeças e nas pernas dos nossos ídolos, para disputar com a honrada Argentina o troféu que substitui a Taça Jules Rimet. Pouco se me dá se ficamos em terceiro ou quarto lugar, que tropeçar no sexto degrau foi uma queda sem glórias, agravada pelas sete fraturas que apenas nos lembram que não chegamos ao patamar – o sétimo degrau.

E aí, um menino de onze anos, curioso e triste, procura entender: “Era isso o hexa?”. Sim, eu o compreendo... Não posso responder-lhe se era isso mesmo o hexa, mas tanto pensamos no número seis que caímos naquele sexto jogo; e a bobeira de que fala o Gabriel Leão é o que ficou feito pergunta na minha cabeça: deu branco?

Talvez; pode ser. Deu branco, e daí? Não se conseguiu reorganizar nada, ninguém mudou de posição, ninguém substituiu ninguém e ninguém fez alguma falta grave para sacudir a equipe. Faltou unidade e garra, faltou cabeça fria... E daí? – pergunto eu outra vez? Comovi-me pelo choro de tantos, homens e mulheres, crianças e velhos; os velhos por não entenderem aquela taca que acabou com o sonho da taça, as crianças por não aceitarem um castigo, já que nada cometeram contra os ditos dos pais e mães.

Seis minutos, dos 23 aos 29 do primeiro tempo. Seis anos de Segunda Guerra, seis milhões de judeus... Vá lá, estou sendo grosseiro com os simpáticos alemães. Mesmo? Adote um, ora! Erramos pelo tamanho do salto, pelos narizes empinados, pela falta de esquema tático, de melhor escalação, por não se trabalhar por objetivo – por mil coisas! Mas para que sofrer, gente?

Perder e ganhar são os resultados de qualquer disputa; o empate, este sim, é um resultado inglório. Garra, concentração e força de vontade são ingredientes indispensáveis que se unem ao talento e terminam em competência – e foi o que faltou.

Agora, o que nos falta é a máxima do inesquecível e sempre adorável Sócrates, triste e precocemente falecido há pouco tempo; numa de suas últimas entrevistas, ele disse que aceitar a derrota é parte do jogo; um “chocolate” também é parte disso. E arrematou com muita sabedoria: “Sofrer por quê? É só um jogo”...


* * *




4 comentários:

Blog de Pirenopolis disse...

Exatamente! Sofrer por quê? O sol esta ai, os amigos, a família, o trabalho e a vida segue com mais jogos mais decepções e também muitas alegrias porque dias melhores sempre vem.

Cláudio disse...

Maravilha de crônica! Lembrou-me os textos geniais do Nelson Rodrigues quando resolvia falar de futebol. A diferença é que você faz poesia para falar do esporte.

Mara Narciso disse...

Não tínhamos futebol para ganhar. Nos faltou tudo, mas, será que merecíamos ser atropelados dessa forma? Deus, se é que ele existe, virou as costas para o Brasil. Um 3x0 já seria mais do que suficiente para nos mostrar o quão ruins nós estávamos e que a supremacia do Brasil está no passado. Outros países avançaram, recriaram o futebol e nós ficamos parados. A fase do misticismo acabou. O choque de realidade doeu tanto que eu fugi após o 3º gol. Meu coração não é forte o suficiente para suportar tudo isso. Melhor me acovardar. Só fui religar a TV dois dias depois. Um mineiraço para jamais ser esquecido. Muito, muito pior do que o maracanaço.

Romildo Guerrante disse...

Meu caro poeta, perder e ganhar é do jogo, mas perder de 7 é realmente humilhante.