Páginas

sábado, setembro 28, 2013

A princesa de óculos e os salários achatados


A princesa de óculos e
os salários achatados



Criança é coisa complicada… Geralmente, pais e mães acreditam piamente, pois a franqueza infantil é algo tão marcante que muitas vezes fere. E virou moda, no Brasil, apelidar-se a sinceridade das apreciações, análises e comentários infantis com uma palavra inglesa muito em voga nos Estados Unidos, o búlin.

Jovens pais e mães, mais psicólogos igualmente jovens, desconhecendo tudo o que nós outros (os sobreviventes da infância dos anos 50 do século em que nascemos) sofremos e driblamos com alguma criatividade e, não raro, uma certa maestria.
Na sintonia do búlin, Rafaela, uma menina pequenina viu-se vitimada por algo muito incômodo: o uso quotidiano de óculos – coisa que nos lembra máscara do Zorro e que a invencionice da moda transformou em “acessório” até mesmo de elegância.
O mal-estar da Rafaela preocupou seu irmão Alexandre,  dois anos mais velho que ela. Se Rafaela não gostava dos óculos, Alexandre ressentiu-se por ela. E ao tomar tais dores, não podendo enxergar pela irmãzinha,  resolveu motivá-la (talvez ele nem conheça essa palavra). Como? Escrevendo um livro. E, no livro, “nomeou-a” com a nobreza que seu coração menino a via. E surgiu “A princesa que usa óculos”. Escreveu? Não apenas isso: ele escreveu e ilustrou, que Alexandre é bom na pena e no pincel, quero dizer, no teclado e no lápis de cor.

Vi o caso na tevê, no noticiário das 6h30min da TV Anhanguera; horas depois, a história e seus personagens estava na TV Globo, no programa “Encontro”, de Fátima Bernardes.

É muito bom ver que em Goiás acontecem coisas que a grande mídia destaca, além dos homicídios com esquartejamento, as chacinas de adolescentes, os grupos de extermínio e as falcatruas com os fundos de pensão de pobres funcionários municipais, intermediados por deputados que, poucos dias antes, posavam de paladinos na vigilância de procedimentos públicos.

O autor – agora é preciso dizer-lhe todo o nome (enquanto não adota um nome literário mais curto) – é Alexandre Raizer Landim Silva; e sua musa inspiradora é a maninha Rafaela. O livro foi editado pela Kelps, em iniciativa de Antônio Almeida, que busca distribuí-lo no cenário nacional.

Ganhei um exemplar, trouxe-o comigo com zelo e curiosidade. Sinto-me bem por deter, entre tantas obras das minhas estantes – umas boas, outras desprezíveis – essa amostra irrefutável da grandeza de um ser humano.  Alexandre Landim talvez desista desse ofício de escritor, talvez cresça muito e se torne famoso; mas ainda pequenino (tem agora 7 anos, apenas), já é exemplo entre seus coleguinhas do Instituto Maria Auxiliadora – o mesmo educandário das irmãs Salesianas onde o meu Lucas Leão estudou desde os dois anos de idade, até a conclusão da quarta série.

Alesandre, escritor e ilustrador, e a personagem Rafaela, a princesa de óculos.

Alexandre Landim toca o meu coração. E eu, que tenho muitos amigos queridos e grandes do outro lado desta dimensão terrena, recomendo-o à espiritualidade, pedindo bênçãos sobre seus pais, que certamente dotam-no de nobres princípios. Esse menino é um exemplo que deve ser mostrado a essa turba de saqueadores do erário e dos banqueiros que, donos de lucros invejáveis ante o mundo em crise, sonegam míseros 5 pontos percentuais aos bancários – profissão de realce há vinte anos; hoje, um pequeno reduto de trabalhadores que, na realidade brasileira, são explorados quase que nos níveis da opressão chinesa.

Deus abençoe o Alexandre e a Rafaela!



* * *



sábado, setembro 21, 2013

Obstáculos ao mestrado


Obstáculos ao mestrado



Na semana que termina, esteve em Goiás o psiquiatra e educador Augusto Cury – veio demonstrar seu projeto de educação que estimula atividades com o propósito de estimular a inteligência.

Todo mundo – pais, educadores, intelectuais e até mesmo políticos aplaudem! Mas... Bem, sou do tempo em que ter o ginasial completo já era boa referência; o colegial era luxo; o superior, uma relíquia arduamente conquistada! Era o tempo em que o cidadão, caso fosse aprovado no concurso do Banco do Brasil, interrompia os estudos – seu futuro já estava assegurado.

Poucos são os graduados do meu tempo a buscar pós-graduação; e raríssimos eram os cursos no país – o comum era correr atrás de bolsas para se aprimorar no exterior. Agora, multiplicam-se as escolas pelo Brasil afora (ou adentro); e com a inegável queda na qualidade e no conteúdo do ensino de base, todos têm que ser formados, especializados, mestres e doutores. E pensar que Nelson Rodrigues sequer concluiu o ginásio!

O poder público acena com bandeirolas de estímulos à pós graduação – mas só na teoria: conheço vários professores da rede pública que se queixam das sistemáticas negativas de diretores e subsecretários para que possam dedicar-se à conclusão de suas dissertações e teses.

Há casos em que as dificuldades vêm de cima – dos núcleos administrativos da máquina da Educação; outros são negados ou obstaculizados por diretores da unidade escolar.

Fácil de entender: quantos diretores têm títulos de mestre e/ou doutor? A eleição para diretor escolar tem dupla face: foi criada para eliminar o critério da indicação política, mas o que se vê é o mesmo que em muitos casos das eleições para conselheiros tutelares – um mero exercício de campanha e urna, pois a meta desses diretores e conselheiros é a próxima eleição municipal – no fundo, querem ser vereadores.

Pois é... no tempo da minha escolarização, professor era profissional admirado; mal pago, mas respeitado; mal pago, mas culto; mal pago, mas bem vestido (não no que se refere a grifes, mas à equivalência do traje com a dignidade profissional). Hoje, é preciso especialização, mestrado e doutorado, sim. E, ainda assim, já vi currículo de doutor com a palavra “proficional” na capa! Isso mesmo: pro-fi-cio-nal, com C em vez de SS. Não mostrei o erro, receei que o doutor colocasse cedilha.

Conheço doutores que odeiam ler; conheço mestres, autores de livros, em cujas casas não existe sequer uma estante para os livros essenciais. Ou seja: o sistema estimula o crescimento, mas este se dá na certificação sem que a equivalência aconteça. Entretanto, conheço muitos que são dignos de seus títulos e de seus estudos, pois os pecadores, felizmente, são ínfima minoria.

O mesmo, porém, não posso dizer de servidores eleitos; a própria campanha eleitoral os corrompe. A inveja os faz amargos e perversos. As autoridades investidas sabem do que se passa e, não raro, ordenam ou toleram as coisas mal-feitas, sobretudo quando o mal-feito é uma afronta à lei e um acinte ao já desgastado e sofrido professor.

Será que isso muda, gente? Um dia, talvez?


* * *

domingo, setembro 15, 2013

Um "Doze" em Ouro Preto

O famoso guia da cidade, pelo poeta Manuel Bandeira


Um “Doze” em Ouro Preto


No dia 12 de outubro marcará, este ano, o 137º aniversário da Escola de Minas de Ouro Preto. Se o Brasil para, como dizem muitos, Ouro Preto se agita. Alinho-me entre os que veem nesses feriados não uma parada nas atividades e na economia, mas sim a efervescência de um segmento ativo e importante para a sociedade atual – o turismo. Mas não é só isso, quando se trata de algo como a festa em Ouro Preto: é a evocação da História. É o aniversário de um dos grandes feitos nesta conturbada Pátria. Uma data expressiva para o mundo acadêmico, especialmente para a mineração, para a engenharia, e, para atualizar a linguagem e os fatos, a tecnologia. A data é a da concepção do que, depois, veio a ser a Universidade Federal de Ouro Preto, certamente.

O que sei dizer de Ouro Preto vem de alguma leitura e das únicas duas vezes em que lá estive. Ficou-me um sentimento de fé e de força. É mágico pisar aquelas pedras das ruas, visualizar as construções centenárias do barroco, envolver-se no místico daquelas igrejas e embriagar-se de história. No teatro, em 1998, ao lado do poeta Romério Rômulo, assisti à outorga dos títulos de Doutor Honoris Causa a Orlando e Cláudio (in memoriam) Villas-Boas. Romério Rômulo, então pró-reitor da UFOP, morava numa casa pertencente ao artista Carlos Scliar, casa essa construída por ninguém menos que o pai de Santos-Dumont.

Visitei lugares marcantes, casas e repartições que a História imortaliza; encantei-me ao ver as gemas no Museu da Escola de Minas; alumbrei-me ante a riqueza da arte de Aleijadinho e o ouro que capeia esculturas em madeira... Bem: após as 17 horas, os turistas começam a sumir da cidade; os estudantes deixam as escolas e faculdades, ocupam os trajetos até suas legendárias repúblicas e, pouco depois, superlotam os bares e cantinas. Os nativos, pareceu-me, fazem pano-de-fundo para o cenário humano.

Na primeira visita, deliciei-me com uma sopa traiçoeira, mas a madrugada foi-me constrangedora: acordei incomodado, uma cólica fisgava-me o baixo-ventre. Tentei distrair-me à janela (a pousada era na Praça Tiradentes); vi uma carroça solitária, o homem que a conduzia vinha a pé, sem lugar para aboletar-se na carroceria. Esperei que, a qualquer momento, um pelotão de soldados do Século XVIII atravessassem o pátio. Mas a cólica aumentou e, muito constrangido, corri ao vaso no banheiro anexo. Acho que esse infausto fez com que a namorada desistisse de mim. (Ainda assim, trouxe de lá pequenas lembranças. A mais marcante ainda existe – o livro Guia de Ouro Preto, assinado por ninguém menos que Manuel Bandeira. Presente da namorada).

Eurico Martins de Araújo, pela pena talentosa de Rocha.
Voltarei a Ouro Preto – agora, na véspera do famoso “Doze”. Comigo, Mary Anne e a mineiríssima Dênia Diniz de Freitas. Dia 11, meu amigo, ex-colega no saudoso Banco do Estado de Goiás, o engenheiro – civil e de minas – Eurico Martins de Araújo, ex-aluno da secular Escola, vai autografar seu livro “República de Estudantes – Elo de Ouro Entre Antigos Alunos e a Escola de Minas”. O local é a própria Escola de Minas, na Praça Tiradentes.

A volta, já sei, será uma viagem em que me sentirei mais sabido – e mais rico. Não de esperteza, que não me interessa; nem de pecúnia, que isso dá muito trabalho. Voltarei, sim, feliz pelo convívio (ah! Certamente, vou conhecer a professora e poetisa Cláudia Pereira, parceira de informes e versos via Internet; e hei de rever Romério Rômulo) e trazendo o livro que conta a história das famosas repúblicas.


* * *

domingo, setembro 08, 2013

Reeleição e chapa única

Reeleição e chapa única


As entidades classistas, associativas ou representativas costumam renovar suas diretorias em períodos estabelecidos em seus estatutos; em geral, um mandato centra-se em dois ou três anos, e a troca tem por propósito a renovação dos quadros diretivos, obviamente. Só que há uma prática muito comum nessas entidades,  sindicatos e similares: a reeleição. Presidentes (mais que os outros, já que vices, secretários e tesoureiros costumam ser pretendentes, também, ao cargo máximo) sempre se apegam à cadeira e, às vésperas da chamada para a eleição alegam “é direito meu” e lançam-se candidatos; os companheiros de diretoria, constrangidos, tendem a respeitar esse direito – que é, sim, um direito; mas não é obrigação.

O que um presidente que pretende reeleger-se deve fazer é atuar, ao longo de todo o mandato, com dedicação e eficiência, mostrando resultados a cada passo. É ser simpático e acolhedor – mas isso não consiste tão-somente em postura, mas sobretudo em procedimentos que promovam a união dos pares e o atendimento presto e igualitário.

Um presidente em vias de reeleição age como na prática genérica em política: arregimentar, novamente, os membros de sua diretoria para constituir a nova chapa; com isso, provoca constrangimentos a prováveis concorrentes, mantendo-os sob seu comando. Nessas condições, tende a despertar mal-estar na equipe e alguém que lhe tenha sido leal durante o mandato poderá modificar sua postura no mandato subsequente.

Não gosto de reeleição; nem de chapa única. Reeleição e chapa única sempre me parecem golpe. Aceito esse instituto no ambiente dos três níveis de governo, mas isso em entidades setoriais é algo que me parece sempre suspeito. Não é preciso olhar longe: aqui mesmo em Goiânia, alguns sindicatos de trabalhadores têm – ou tiveram – como presidentes pessoas que permaneceram no cargo por décadas! A prática atinge também instituições culturais. Como acontecia (não sei se ainda é assim) na União Brasileira de Escritores em Goiás, por exemplo, porque uma chapa era constituída de tantos membros que não sobravam nomes de associados interessados para haver disputa.

Na mesma UBE de Goiás, entre 1960 e 1990, o estatuto permitia uma reeleição; e, curiosamente, em raríssimas ocasiões apresentaram-se pessoas interessadas em competir. De repente, e por conta de uma alteração estatutária, tirou-se da regra o limite de dois mandatos na presidência e passou-se a ter característica de cartório.

Na Academia Goiana de Letras, houve casos de presidentes que mantiveram-se no cargo até a exaustão, por longos períodos. Essas missões tornam-se árduas, mormente por ser notória a penúria financeira. Mas, convenhamos, é função que dá destaque social e respeitabilidade política.

Atualmente, porém, a renovação ou perpetuação de uma pessoa no posto máximo é vista de modo menos positivo. Até mesmo o golpe militar de 1964 evitou a mesma pessoa no topo da pirâmide – tivemos cinco presidentes sem votos populares num período de 21 anos.



* * *