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sexta-feira, agosto 28, 2009

Palestras e polícias

Palestras e polícias


Luiz de Aquino


A noite fechava seu ciclo, dando espaço à luz que, na roça, dizem ser “a barra do dia”. Deixei o Lucas no colégio e tomei o rumo leste pela Avenida Anhanguera. Cheguei à Escola Municipal Alice Coutinho, na Vila Morais, tinha de falar sobre a escrita, a poesia, o jeitão dengoso da prosa em crônica. Dou bom-dia à professora Mara Rúbia, tão-logo a vejo à porta, e quero saber quem foi Alice Coutinho. Uma educadora, conta-me a educadora. Fico feliz: gosto de ver escolas que têm nomes de professores e afins.

Recordo que, no município do Rio de Janeiro, é de lei: escolas recebem nomes de educadores. Com esse argumento, o prefeito César Maia vetou o nome do palhaço Carequinha. E já ouvi de ene professores a mesma pergunta que me incomoda: se ele não foi educador, quem o será?

Falei de versos e músicas, de crônicas e causos. Ouvi alunos a declamar versos e gostei mais de vê-los produzindo paródias e respostas a poemas meus. Claro, sou vaidoso, sim! Fiquei todo, todo ao ver dois painéis – um com poemas de autores goianos (eu no meio) e outro só com minhas crônicas e fotos minhas. Quem não gosta de ser acarinhado, hem? Saí feliz da Escola, afagado pela boa recepção, tanto de mestres quanto de alunos, e cumprimento todos eles abraçando Kamila Marquez, Rodrigo e Elinny.

No mesmo dia, viajei a Pirenópolis. O presidente da Câmara Municipal, Eli de Sá, convidou-me para falar aos vereadores. E sempre há muito o que falar quando a motivação é estudantes e poesia; ou Pirenópolis. Pirenópolis é poesia sempre. E música. E tela e tinta. Pirenópolis é vida!

Vivi um dia feliz. Muito feliz!

São assim os dias, sempre. Os meus dias. Escrever, fazer contas várias, incomodar-me no trânsito, sofrer com os noticiários prenhes de notícias ruins. Os dias são, para todos nós, sequências de pequeninos fatos de vários matizes. Triste é viver uma situação vexatória, algo que nos dá a sensação de violados. Ai, a gente reage... Contei, na crônica de quarta-feira última, de quando minha amiga contestou um policial que punha o carro sobre a calçada, obrigando pedestres e transitar na pista asfáltica. “Polícia pode”, disse o soldado, e ela retrucou: “Pode nada”. Esse feito foi da professora e advogada Sonia Marise Teixeira, e não de Maria do Rosário Paranhos. Esta viveu um outro momento, mas com um suposto policial à paisana que, de longe, mostrou uma carteira dizendo “Sou policial, está vendo?”. Rosário é, tal como Sônia, professora e advogada (elas não aceitam desaforos), e o desafiou: “Traga aqui essa carteira e verá o que faço com ela”. O homem não se aproximou, devia ser mesmo um impostor. Mas exerceu a truculência típica dos mal-educados (há mal-educados em todas as profissões, a gente sabe).

Na quinta-feira passada, 27 de agosto, meio-dia e meia, mais ou menos, uma gangue de jovens em motos causou um início de pânico à saída do Colégio SESC Cidadania, no Jardim América (a cerca de três quadras de uma delegacia da Polícia Civil). Alguém detonou uma bomba (caseira?), o bando ameaçava atropelar crianças e adolescentes, capacetes foram arremessados. Vários pais acionaram o telefone 190, mas a PM demorou a chegar. Não sei a razão da demora, mas os minutos de espera foram angustiantes.

Uma pena que a PM nunca responda ao que a imprensa conta. Ela pode?




Luiz de Aquino (poetaluizdeaquino@gmail.com) é jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras.

terça-feira, agosto 25, 2009

Trânsito, educação e politicagem

Trânsito, educação e politicagem


Luiz de Aquino


Desde a tenra mocidade, descobri que a diferença entre adultos e crianças está mesmo é no preço dos brinquedos. Ou seja, os brinquedos tornam-se mais caros à medida que a gente cresce – ou envelhece, para ser mais preciso – e não nisso aí que dizem ser “maturidade”. Maturidade está na pele, que perde o brilho e se enruga, bem como nos cabelos, que perdem a melanina. Não há tempo a perder com argumentos: olhe aí à sua volta, veja os brinquedos dos filhos, sobrinhos e netos, compare os preços com os brinquedos dos adolescentes, depois com os dos adultos... Viu? Conferiu? Descobriu? Tudo bem, pois!

Existem brinquedos que parecem baratos, mas resultam em coisas caras. Futebol, por exemplo, pede apenas uma bola, não é mesmo? Não, não... Quanto custa o terreno de cem metros de cada lado para se fazer nele um campo de futebol? E a terraplenagem? E o gramado? As travas... Ah, se é gramado e bem medido, logo haverá quem exija alambrados, arquibancadas e vestiário, mais os sanitários etc.

Para a quase totalidade dos mortais, um brinquedo caro, também, é o carrinho. Não falo dos carrinhos de fricção com que os petizes (icha! Essa palavra eu busquei longe, no tempo) se divertem, mas dos fuscas e celtas e corsas, que logo nos sugerem pálios e gols e meganes. Brinquedos não exigem de nós apenas seu custo de aquisição: há a manutenção e os cursos acessórios.

E aí, já que falei em carrinhos, vem o trânsito. Com o trânsito, a educação (ou a falta dela): motoqueiros que costuram entre carros e xingam os choferes (mais uma das antigas), pedestres que gesticulam para condutores... Há poucas horas, parei ao ver, diante de um colégio, o aluno de seus dez ou onze anos que já descia da calçada, ignorando o carro. Buzinei discretamente e fiz-lhe um sinal, sugerindo atenção. O guri respondeu, com a educação que lhes dão os pais: “Tô vendo, idiota!”. Tem nada não... Apenas cinquenta anos entre nós dois. Ah, cinquenta anos e, com certeza, um par de pais imbecis.

Viaturas da PM continuam obstruindo as calçadas estreitas de qualquer bairro. “Policia pode”, respondeu, tão mal-educado quanto o aluno que citei, um soldado à minha amiga Rosário, advogada. E ela: “Pode nada!”. Sim, a PM infringe o Código de Trânsito Brasileiro ao não usar, sistematicamente, o cinto de segurança e ao estacionar, a bel-prazer, nas calçadas, estejam a viatura e seus ocupantes a serviço ou não.

As pessoas, especialmente os que já sentem ter cumprido mais de setenta por cento de seu tempo ou missão nesta vida, sentem-se frustradas. E aí, o noticiário fica quase todo ocupado com a ex-secretária da Receita Federal dizendo que sim e a ministra da Casa Civil jurando que não. A opinião pública entende que a ex-secretária inspira mais confiança que a ministra, que pretende vir a presidir o País e a Nação.

Quero não, siô. Prefiro a Marina Silva. A ministra candidata, alinho-a com o menino mal-criado que atravessa a rua desafiando os carros, o policial que acha que a PM “pode” infringir a Lei, bem como o “gênio” que bolou isso de pôr viaturas onde, diz o Código, é espaço reservado a pedestres.

Ah, a todos esses quero juntar também os que estacionam em lugar reservado para portadores de deficiência física e idosos. São tão “confiáveis” quanto a ministra que quer suceder o presidente Lula.



Luiz de Aquino (http://penapoesiaporluizdeaquino.blogspot.com) é jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras.

sábado, agosto 22, 2009

Escribas no Senado

Escribas no Senado


Luiz de Aquino


Numa entrevista, cerca de trinta anos atrás, o poeta Aidenor Aires declarou, sem constrangimentos, que “se nós nos lêssemos, as edições dos nossos livros seriam esgotadas no lançamento”. E detalhou: o hábito eram tiragens de mil exemplares, e os escritores, publicados ou ainda na fase do sonho, éramos, já naquela época, muitos em Goiás.

Na última terça-feira, expressivo número de escritores lotaram um ônibus em Goiânia e, a convite do senador Demóstenes Torres, participaram de um encontro com colegas brasilienses na Biblioteca do Senado. O parlamentar goiano, um dos mais atuantes e respeitados em amplitude nacional, estimula o estreitamento das relações. Presidentes da Academia Goiana de Letras, Eurico Barbosa, da UBE de Goiás, Edival Lourenço, e da Academia Brasiliense de Letras, José Carlos Gentille, marcaram presença. Gostamos de reencontrar Flávio Kothe e outros velhos companheiros.

Habituamo-nos, especialmente escribas como Delermando Vieira, Brasigóis Felício, Valdivino Braz e eu, a nos municiar de livros para as permutas, em ocasiões semelhantes. Mas, desta feita, não encontramos entre os demais a mesma parafernália e retornamos com a carga. A alegria expandiu-se também, para nós, não só na iniciativa do senador Demóstenes, mas na eficiência de seus assessores, com ênfase para Nilson Gomes.

Estranhei, particularmente, a declaração do presidente da UBE Goiás, que entendeu ser essa a primeira vez em que se promove um encontro de escritores da Capital Federal com os goianienses. Em 1996, os brasilienses lotaram um ônibus e vieram a Goiânia para, em ação conjunta, fortalecer homenagem que a nossa UBE prestava a Carmo Bernardes. O passeio marcou-se por um almoço no restaurante Tacho de Cobre, visita à casa e à família de Carmo Bernardes, no setor Pedro Ludovico, e uma noite literária no Castro’s Hotel.

Em outubro do ano passado e em abril deste ano, o grupo de poesia Memento Mori, dirigido pelo poeta brasiliense Roberley Antônio, realizou encontros aqui em Goiânia, envolvendo poetas das duas cidades (outros encontros já estão programados e serão em Brasília). O primeiro destes, deu-se no Goiânia Ouro e o segundo, na Universidade Católica de Goiás. Ambos os eventos foram noticiados na imprensa e eu próprio cuidei deles em minhas crônicas.

Portanto, não se pode sair dizendo que “agora, vai!”. Esse “agora, vai!” já poderia ter acontecido se os escritores locais buscassem conhecer o que se faz por aí. Caso o fizessem, conheceriam melhor, por exemplo, Fátima Paraguassu, que, além de seu trabalho em música e literatura, atua como folclorista e notável defensora das tradições do Estado, com ênfase para Santa Cruz de Goiás. Ela estava lá, no encontro, sempre buscando divulgar seu trabalho.

Tudo isso me recorda, pois, a declaração de Aidenor... Constatamos que o moço poeta, naqueles anos finais da década de 1970, estava certíssimo. Os escritores não lêem o que os colegas, ainda que próximos, escrevem.

E arremato reafirmando a validade da iniciativa. Abraços meus de gratidão ao amigo senador Demóstenes e ao Nilson Gomes. Quebremos, pois, os bicos longos de orgulho e busquemos nos reaproximar, não só dos colegas brasilienses, mas também entre nós, os da casa. Se a família não se une, a união lá fora ficará sempre frágil.



Luiz de Aquino (poetaluizdeaquino@gmail.com) é jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras e escreve aos domingos neste espaço.


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quarta-feira, agosto 19, 2009

Esta cidade, rodeada de montanha...

Esta cidade, rodeada de montanha... (*)

Luiz de Aquino


  • Foi Isócrates de Oliveira quem cantou: “Minha cidade é rodeada de montanha / tem um rio que a banha / murmurando sem parar”. Eu, quando cantei, evoquei “manhãs alegres / sol dourado junto ao rio / e um desafio a que acompanham violões”.
  • Como não evocar manhãs de sol, tardes preguiçosas, noites alegres e madrugadas românticas nesta Meia-Ponte das minas de Nossa Senhora? A do Rosário, dos Brancos e dos Pretos. A dos Pretos ruiu sob os desgaste do tempo e a fraqueza das bolsas, minguadas de recursos naquele tempo dos anos de 1940, quando os bancos faliam ante a chamada moratória pecuária.
  • A dos Brancos, incendiada sob o signo de Virgem naquele fatídico 5 de setembro de 2002. E a lembrança de mim, embriagado na Festa do Divino, procissão com “banda de couro”. Inerte e bêbado, quase impedi o retorno da procissão, deixado na soleira da porta lateral, do lado da Rua Direita.
  • “Manhãs de festas / acordando Meia-Ponte / ao pé do monte seus antigos casarões”. Meu canto é de saudade; saudade de mim menino, ou de mim mais moço. O murmurante Rio das Almas... “Rio das Almas / vai levando as minhas mágoas / em meio às águas / a rolar, buscando norte”.
  • Foi na Ramalhuda, verão em 1952, que me afoguei pela primeira vez. Um homem gordo tirou-me do poço fundo e seu sorriso me deixou confiante. Afoguei-me muitas vezes mais, porém sem medo. Em quantos poços, quantos copos me afoguei?
  • Poção da ponte, de tanta memória! Música eterna das águas velozes... Meia-Lua, Pedreiras, Lajes... Tempo matado sem pressa em tardes e manhãs de férias. Vô Luiz, meu xará de Aquino Alves, maestro e seresteiro, não se banhava em casa – só nas águas do Rio das Almas.
  • Meia-Ponte Pirenópolis de serenatas e cerveja muita, cachaça e lua de prata. Meu primeiro porre... Acho que foi no Bar do China, irmão de Pérsio Forzani, no casarão que, caído, deu lugar à atual Casa de Justiça.
  • Antes dos porres, os amores são a mais doce lembrança. Amores furtivos às margens do rio, amores inebriantes atrás das igrejas, ao sopé dos montes, no pico do Frota entre as antenas de tevê (o som da cidade, a cidade lá longe, o ar fresco da noite e a poesia emergente).
  • Serenata de metais e cordas na noite serenada. Caju batizado na casa de Wilno. Alexandre, o maestro, era um menino que tocava na banda. Meu Vô Luiz tirava notas carinhosas de um trombone e eu volitava, rumo ao passado, para encontrar meu tio Ismael, o da clarinete, e Dito de Melani, o do pistom.
  • “Ai, que saudade / de acordar ao som do pinho / cá no meu ninho / e sentir a lua cheia / na serenata / que dá vida à noite calma / e leva a alma / à viola que ponteia”. Meu canto de versos ganhou roupa nova na canção de José Pinto Neto. Zé Pinto, o de Caldas Novas, meu parceiro musical, também se foi mais cedo. Foi encontrar os meia-pontenses idos antes, como meu Vô.
  • E Pirenópolis, a das verônicas do Divino, das congadas e dos doces cristalizados, a do licor de jabuticaba e vinho de caju, a Pirenópolis dos meus sonhos e minhas saudades, essa que não dorme... Essa, a cidade rodeada de montanha, encimada na paisagem pelas três colinas aniladas dos gigantes Pireneus, ah, essa!...
  • Minha, nossa, eterna cidade de Nossa Senhora do Rosário! Não há fogo nem enchente que te apague de nossas almas.

(*) Crônica publicada em março de 2003. Senti saudade dela e acho que muita gente não a leu...

As fotos da cidade são de Dalva José Pereira.

Luiz de Aquino (htt:p//penapoesiaporluizdeaquino.blogspot.com) é joranlista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras.

sexta-feira, agosto 14, 2009

“Meu nome é Mulher” tem autora, sim!

Fátima Aparecida Santos de Sousa, policial militar e poetisa

“Meu nome é Mulher” tem autora, sim!


Luiz de Aquino


O título é simples, mas decidido, decisivo e definitivo: “Meu nome é mulher”. Circula pela internet há tempos, e quase sempre (diria que, na quase totalidade das vezes), é citado como de “autoria desconhecida”. Assim me chegou na primeira vez, e não gastei mais que um ou dois minutos para localizar o nome da poetisa, uma policial militar paulista: Fátima Aparecida Santos de Sousa.

Por que conto isso? Porque incomoda-me isso de se divulgar textos sem citar a autoria. As emissoras de rádio, há algumas décadas, começaram a ignorar os autores de músicas, permitindo que o público acreditasse que o cantor era dono e senhor das melodias e letras. O descaramento foi tamanho que alguns cantores passaram a acreditar que eram, sim, autores, e alguns foram punidos pela Justiça a ressarcir os verdadeiros autores.

É que, especialmente no meio musical, houve um tempo em que era normal o autor vender direitos autorais a cantores famosos. A literatura dá conta disso muito bem: a biografia de Noel Rosa por Paulo Didier e João Dias deixa claro que o Poeta da Vila é o verdadeiro criador de Cidade Maravilhosa, mas vendeu a música a André Gustavo (esse é apenas um fato, entre centenas ou milhares). E tenho conhecimento de inúmeros autores, daqui mesmo da terrinha, que assinaram obras literárias criadas por outros. Consta que, em terras de Minas, alguém que assinava obras de um irmão tornou-se famoso sem jamais ter escrito os livros que levam seu nome. E de Goiás, dou-me conta de pelo menos duas autoras que publicaram obras escritas por terceiros; uma delas sequer se dá ao trabalho de transcrever as histórias para o seu estilo (que, acho eu, não é lá grande coisa).



Volto a “Meu nome é Mulher” e transcrevo o poema inteiro:

“No princípio eu era Eva / Nascida para a felicidade de Adão / E meu paraíso tornou-se trevas / Porque ousei libertação!

Mais tarde fui Maria / Meu pecado remiria / Dando à luz Aquele / Que traria a salvação! / Mas isso não bastaria / Para eu encontrar perdão!

Passei a ser Amélia / “A mulher de verdade” / Para a sociedade!

Não tinha a menor vaidade / Mas sonhava com igualdade!

Muito tempo depois decidi: / “Não dá mais! / Quero minha dignidade, / Tenho meus ideais!” / Mas o preconceito atroz / Meus 129 nomes queimou

Então o mundo acordou / Diante da chama lilás!

Hoje não sou só esposa ou filha; / Sou pai, mãe, arrimo de família; / Sou ourives, taxista, piloto de avião, / Policial feminina, operária em construção! / Ao mundo peço licença / Para atuar onde quiser! / Meu sobrenome é Competência / O meu nome é Mulher!”.

A poetisa, portanto, é (Pérola Neggra, com G dobrado) Fátima Aparecida Santos de Sousa, policial militar em Mauá, SP, e registra seus textos na Biblioteca Nacional. Portanto, que se interrompa a “corrente” que dá o poema como de autora desconhecida. O e-mail da autora é fatimaperolaneggra@hotmail.com e seu telefone, (011) 9409-0630.

Como se vê, a moça existe, é talentosa, competente e bonita.



Luiz de Aquino é escritor e jornalista, membro da Academia Goiana de Letras.

quarta-feira, agosto 12, 2009

Alguns comentários


Luiz de Aquino


Este é um dos momentos de eu-leitor, de modo narcisista... Ler o que comentam meus leitores. Antes que me acusem de cabotino e vaidoso, esclareço que me agrada, e muito, a visão contrária, também, mas as pessoas, parece-me, não se sentem tão à vontade para contestar. Pena...

Aqui vão alguns dos comentários às minha crônicas mais recentes. Começo pela de domingo passado, em que contei uma viagem a Catalão, vinte e cinco anos atrás. A poetisa carioca Lílian Maial foi sintética: “Que delícia! Fiz companhia a você nessa viagem, com todas as suas flores e notas”.
E Mara Narciso (mineira e, como Lílian, também médica) analisa: “Ficou-me a impressão que foi criada uma outra frase para ficar nos anais históricos, muito mais do que uma lembrança, mas uma citação obrigatória: "uma amizade, ao consolidar-se, pode bem ter raízes que se plantam mais firmes no coração que na fragilidade da lembrança."

Da distante e lírica Itálica, Leda Goulart me saúda: “Ciao, mio scrittore preferito Luiz de Aquino!
‘I fiori sono i messaggi che la gente tentano di mandare e non sanno dire’, 
perfetto per me oggi leggerti e trovare queste parole che hai messo in rima,
Buona Domenica e Buon Giorno del Papà!”.

O estudante goianiense Marcos Carneiro atenta para a linguagem “de autêntica originalidade, faz o leitor se roer de pressa para chegar ao próximo parágrafo. Digo pela atitude sagaz de colocar no papel o que o povo pensa. Assim como o texto "viaturas, calçadas...", este também está carregado de uma função ética que todos nós precisamos - principalmente o eleitor brasileiro : voz”.
 E Leida Gomes concorda comigo: “você acertou na mosca: o Senado é um paraíso e está fazendo do Brasil ‘O Quinto dos Infernos’. (... ) Mas, na verdade, o Collor se despiu da pele de Cordeiro, mostrou a sua verdadeira identidade, e acredito que ele sairá candidato em 2010”. 



A dra. Mara Narciso, que é também articulista do DM e estudante de jornalismo em sua Montes Claros (MG), volta para falar sobre os políticos: De fato, alguns identificam-se mais com o condutor, mas há os que são uma montaria. É o que antigamente se chamava de cavalgadura. Com essa leva de políticos, quem terá pena de nós?”. Já a professora Noemi Almeida denuncia: Gostei!!! Você diz o que a maioria dos brasileiros gostariam de dizer, mas se calam diante de tamanhas barbaridades”.

Eis, então, que se fala de outra crônica, aquela em que falo de viaturas policiais nas calçadas e as máscaras ante a paranóia da gripe. A advogada e professora Sônia Marise narra experiência: “Olá, poeta!
Até que enfim alguém diz alguma coisa a respeito da licenciosidade
da nossa valorosa PM que, sem qualquer cerimônia, estaciona suas viaturas na calçada, inclusive das praças. Incomodada, abordei o garboso PM que apoiava um dos pés no batente do carro, firmando-se na porta aberta deste, assim como patrulheiro rodoviário de filme americano, quando faz pose com o radiocomunicador, olhando ao longe da estrada....Perguntado se não temia estar dando mau exemplo para a comunidade, estacionando sobre o passeio, o que é vedado por lei, respondeu-me, na pose:
‘- PM pode’. Malcriada, contra-ataquei:
‘Pode nada!’. Ele fechou a cara e eu, nem aí”. Maria Helena Chein, escritora e professora, também se incomoda com o tema: “Você dá uma sacudida nesses assuntos tão sérios, reais e os joga para fora. E concordamos com você, cronista que fala pelos que acham, pelos que têm certeza e pelos que já se manifestaram mesmo que de uma forma menos contundente”.


Finalizo com Antônio Americano: “A respeito da crise do senado, um tema interessante para sua crônica seria saber como reagiriam hoje, aqueles estudantes, como por exemplo o Honestino Guimarães e tantos outros, que foram torturados e mortos pela ditadura militar enquanto lutavam pela democracia”.


Meu amigo, prefiro não imaginar. Salvo as famosas “honrosas exceções”, os sobreviventes têm se mostrado não muito diferentes dos ex-algozes (Sarney, Collor e outros de íntimas ligações com o tal “regime de exceção”).



Luiz de Aquino (http://penapoesiaporluizdeaquino.blogspot.com) é escritor e jornalista, membro da Academia Goiana de Letras.

sábado, agosto 08, 2009

Marieta, Catalão e a saudade



Marieta, Catalão e a saudade


Luiz de Aquino



Como era viver sem o telefone celular, hem? E a Internet? Ou, muito menos, sem computador? Essas perguntas não são exclusividades minhas, mas ouvi-as algumas vezes de jovens na faixa dos dezoito aos vinte e poucos anos. Gosto de ouvi-las. Recordo de mim nessa idade, lá pelos tempos de 1958 a 61, quero dizer, o meu tempo de ginasial. Como seria viver sem o rádio? E sem jornais?


Era o tempo em que alguns jornais, na Capital Federal de então, circulavam com duas edições diárias. Aliás, as edições vespertinas, que chegavam às ruas entre as dezesseis e dezoito horas, eram disputadíssimas. Posso estar enganado, mas sempre entendi que eram mais procuradas que as edições matutinas.

Em 1984, não consigo precisar se outubro ou novembro, viajei a Catalão, integrando uma comitiva de escritores, a convite de um dos escribas da terra. Na véspera, chegara eu de Rubiataba, onde, ao lado de uns vinte escribas e artistas de pincéis e de música, participei de um festival. Dias corridos, pois. A viagem a Catalão envolveu grupo menor, em dois ou três veículos. Numa camionete de cabina dupla, viajei com Marieta Teles Machado e Bernardo Élis. Demoramos mais de três horas na estrada, com direito a paradas para lanche e alívio fisiológico. Por três dias, fizemos visitas a personalidades locais, escolas, um clube, uma loja de livros e revistas etc.

Aos mais curiosos, os que quiserem identificar melhor os dias dessa viagem, informo que acontecia por lá uma folia folclórica, algo como congada. Não precisei a identidade dessa festa, mas recordo-me que um dos nossos anfitriões, diretor da Fosfago, contou-me que a prática fora trazida no começo do Século XX. Algum fazendeiro ou político, ou de ambas as práticas, trouxera alguns negos, entre eles ex-escravos, do Triângulo Mineiro, hábeis dançarinos, percussionistas e cantores que fixaram a dança no município, dando origem à prática por ali, expandindo a tradição. Aquele folguedo (nossa! Acho que nunca escrevi essa palavra) interessou-nos a todos, mas muito especialmente a Marieta e Bariani Ortencio. Beca (apelido carinhoso de Marieta) não cabia em si, queria ver, ouvir e curtir tudo, acompanhava os cordões, perguntava, queria saber das letras e cantar junto...

Engraçado... A memória é algo fascinante! “Recordar é viver”, escreveu o autor de uma saudosa marchinha de carnaval. Mas recordar não é reviver. A memória tem cores próprias e uma “leitura” diferente. Não é a repetição de fatos, não tem a exatidão do ocorrido. É um filminho reduzido, apenas. E como é bom! As lembranças dessa viagem são muitas, mas vou resumir.

Imagino ter sido o último dos eventos a visita a um colégio católico, imponente, solene como as velhas escolas, grande como deveria ser, ainda, o respeito à Educação. Era um auditório, uma mesa com flores e toalha branca, majestosa, estava no palco. Distribuímos livros. A diretora, uma mulher bonita e loira, concentrava-se não nos discursos e declamações, mas numa leitura.

Ao final, e como quem agradecesse a nossa presença (cansativa, imagino eu), ela mostrou o meu livro “Sinais da Madrugada” e leu, para o público, o poema “As flores”, cujos últimos versos são: “As flores, querida, / são o recado / que a gente tentou mandar / e não soube dizer”. Leu isso distribuindo as flores da mesa aos poetas presentes.


A diretora era Maria do Rosário Paranhos, que reencontrei no ano passado. Fica-me evidente que uma amizade, ao consolidar-se, pode bem ter raízes que se plantam mais firmes no coração que na fragilidade da lembrança.




Luiz de Aquino (http://penapoesiaporluizdeaquino.blogspot.com) é escritor e jornalista, membro da Academia Goiana de Letras e escreve aos domingos neste espaço.



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quarta-feira, agosto 05, 2009

Espírito que “incita” senadores

Espírito que “incita” senadores


Luiz de Aquino


O Senado é um paraíso! A frase é tão corriqueira, entre políticos e jornalistas da área, quando uma locução de cumprimento. Afinal, são oito anos de mandato com direito a uma equipe de apoio de fazer inveja a qualquer artista em evidência no “xoubiz”. Se alguém duvidava, as denúncias contra José Sarney, imperador do Maranhão, Amapá e Alhures, com trono em Brasília, dão-nos conhecimentos além do que era apenas sonhado.

O bate-boca de segunda-feira, 3 de agosto, começado por Renan Calheiros, o garanhão das Alagoas, envolveu também Fernando I, o Collor, igualmente das Alagoas. Pedro Simon, que a opinião pública nacional tem na conta de uma das duas (no máximo) reservas morais do PMDB naquela Casa, sugeria a renúncia de José Sarney e Collor não gostou de ouvir o gaúcho referir-se ao caráter suspeito (?) de Renan. O ex-presidente, pioneiro mundial em impeachment, revestiu-se da velha petulância e protegeu Renan, que o abandonou na véspera da votação que tirou o “caçador de marajás” dos palácios da Presidência.

Ah, que bobagem! A nação viu, na tevê, toda aquela baixaria. Gostei particularmente de dois momentos: primeiro, da indiferença solene e superior de Simon diante da bravata de Collor ao ameaçar contar à nação fatos que comprometeriam a biografia de Pedro, o gaúcho ético. “Pois diga, senador”, solicitou Simon. A fanfarronada de Fernando I não atingiu a majestade do velho peemedebista. E o segundo momento foi o apoio de Cristóvão Buarque ao colega gaúcho. Buarque, sim, definiu o que se pretende do Senado brasileiro.

A propósito: esse PMDB de Sarney, Renan e da maioria atual não tem muito a ver com o MDB de Ulisses Guimarães, Mário Covas, Teotônio Vilela e outros nomes respeitáveis (em Goiás, o referencial era Íris Rezende Machado, Luiz Soyer, João Natal e outros de saudosa memória). Diria mesmo que nada tem a ver. O PMDB atual, nesse empenho em preservar o “coronel” maranhense que se elege no Amapá, está mais para a Aliança Renovadora Nacional (a famigerada Arena), o partido do “sim, senhor” que era presidido justamente por ele, o atual presidente do Senado.

Senado, Senado! A palavra sugere respeito. Afinal, deveria ser constituído pelos senis, os mais velhos. Daí o limite mínimo de 35 anos... Ora, ora! Se eles próprios cuidaram de empurrar para o futuro o piso de idade para a aposentadoria, porque não esticaram a idade mínima para cinquenta anos, hem? Estranho... Mas é bom lembrar que até mesmo o Senado Romano, já naqueles tempos que se tornaram história e enredo de centenas de filmes, tempos que geraram não apenas fatos, mas também monumentos da arquitetura da época, aquele Senado também tinha suas marcas de escândalos.

Foi na escadaria do Senado que Brutus matou Júlio César. E um dos mais lembrados dentre os senadores romanos jamais opinou sobre qualquer coisa discutida naquela Câmara, nem apresentou projeto algum. Refiro-me, ao senador Incitatus. E para os de memória curta (sem problemas... A gente não se recorda mesmo de cinco nomes dentre os últimos ex-senadores do nosso Estado), transcrevo aqui o que colei da Wikipédia, vejam:

“Incitatus era o nome do cavalo preferido do Imperador Romano Calígula. De acordo com o escritor Suetónio na sua biografia de Calígula, Incitatus tinha cerca de dezoito criados pessoais, era enfeitado com um colar de pedras preciosas e dormia no meio de mantas de cor púrpura (a cor púrpura era destinada somente aos trajes imperiais, ou seja, era um monopólio real). Foi-lhe também dedicada uma estátua em tamanho real de mármore com um pedestal em marfim. Conta a história que Calígula incluiu o nome de Inictatus no rol dos senadores e ponderou a hipótese de fazer dele cônsul”.

Ao ouvir Collor vociferando contra Pedro Simon, imaginei cá comigo... Acho que o senador alagoano prefere ignorar Teotônio Vilela como exemplo e reportar-se a Incitatus.



Luiz de Aquino (poetaluizdeaquino@gmail.com) é jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras.


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