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domingo, julho 28, 2013

Casas de letras e afins

Casas de letras e afins


Sempre que vejo pessoas – especialmente os da arte – criticarem os grupos sociais de modo pejorativo (“panelinha” é o termo mais corriqueiro), menosprezo o comentário. Explico: o bicho sapiens é dado, sim, a associar-se por suas afinidades e (ou) necessidades. Foi por isso que surgiram as tribos, os clãs, as associações, clubes e sindicatos, os aglomerados a que chamamos de vilas, povoados, cidades e, por fim, as províncias e os estados. Logo...

Por razões óbvias, os clubes (ou associações) de que mais participei e participo são os de letras. Não que tenha deixado de compartilhar de outras entidades, como clubes sociais, associações profissionais e me apegado a dois times de futebol (essa paixão nacional que é quase unanimidade), mas o ofício da escrita sempre me puxou com mais força.

Houve a União Brasileira de Escritores de Goiás, aonde fui levado pelo presidente (1977) Miguel Jorge; depois, tornei-me membro da diretoria e até presidente; depois, veio a Academia de Letras e Artes de Caldas Novas (1990), seguida de perto pela Academia Pirenopolina de Letras,  Artes e Música (1994) – destas, participei dos trabalhos de fundação. Em 1996, fui eleito para a Cadeira 10 da Academia Goiana de Letras (vaga surgida com o falecimento do inesquecível amigo Carmo Bernardes, justo ele que me estimulou a integrar a AGL).

Em1998, quando ainda presidia a UBE, fui honrado com o título de Membro Correspondente da Academia Piracanjubense de Letras e Artes; esta entidade tem a mesma idade de sua co-irmã de Caldas Novas, isto é, foi fundada também em 1990. E, mais recentemente,  com consumação neste ano de 2013 (o convite para integrá-la veio em 2012), passei a integrar o quadro de membros efetivos da Academia Aparecidense de Letras, na vizinha Aparecida de Goiânia.

Vejo as casas de letras nos municípios do interior como expressões grandiloquentes de suas sociedades. É nelas que se agitam os pensamentos e os ideais, são redutos onde se exercitam a criatividade e o amor à comunidade (naturalmente, ao próximo), na busca quixotesca da valorização da comunidade. Por integrar a Academia de Pirenópolis (berço natal de meu pai), senti-me enaltecido como cidadão literário dali; como se não bastasse, acabei vice-presidente e, em seguida, presidente da entidade; e a Câmara Municipal de lá destacou-me com um título emocionante – o de cidadão honorário. A APLAM está um tanto adormecida, mas alguns acadêmicos movimentam-se para reativá-la; falta apenas que a atual presidente se decida por acolher a iniciativa desses lutadores – ou a entidade pode vir a “abater colunas”.

A de Piracanjuba – que tem sede própria desde 1999 – continua ativa e atuante, orgulho da terra de João Accioly, Léo Lince e Nei Teles de Paula. A de Caldas Novas acaba de ganhar do prefeito Evandro Magal os espaços do Museu Oscar Santos para abrigá-la (propósito a que empenhei-me nos primeiros anos da Academia e que só foi retomado agora, sob a presidência da professora e escritora Marília Núbile).

A de Aparecida completou seu quadro de 40 membros há poucos meses; ato contínuo, obteve a proximidade e amizade da professora Maria de Lourdes Primo, que dirige a Biblioteca Ursulino Leão. Ela  obteve, do líder local Freud de Melo, uma espaçosa sala para acolher a nova entidade (nova? Sua criação já tem dez anos; esse tempo entre criar e completar-se é o atestado da determinação de seus idealizados, sobre os quais falarei oportunamente).

Festejo essas entidades com indisfarçável alegria! Sou feliz por ter integrado os grupos criadores de duas delas e envaidece-me ter sido lembrado pelos que integram as outras duas – sem desmerecer a entidade-mor em Goiás, a Academia  Goiana de Letras; esta é a casa de maior referência, sem dúvida, mas as academias municipais têm o fetiche de nos integrar à vida local.

Lutemos mais, meus confrades! Nossa obra maior é o exemplo que podemos deixar aos pósteros.



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sábado, julho 20, 2013

Anápolis: aniversário com livros

Anápolis: aniversário com livros

Anápolis, 106 anos e 52 livros inéditos (foto: Internet)


Era 1967 e a cidade festejava 60 anos de emancipação. Acho isso engraçado… Em Goiás, festeja-se a partir da data de emancipação, e não de surgimento dos núcleos urbanos; é como se a gente ignorasse a infância e a adolescência e festejasse aniversário a partir dos 18 anos. As mais antigas, como a Cidade de Goiás, Pirenópolis, Corumbá, estas festejam suas datas de fundação, apropriando-se integralmente da própria história; a minha Caldas Novas, por exemplo, devia comemorar 1850, quando a Igreja de Nossa Senhora do Desterro (mais tarde, das Dores) foi inaugurada, dando início ao povoamento – mas remete-se a 1911, o ano da emancipação.

Mas não é este o meu tema; quero falar de Anápolis, que está, desde já, comemorando sua data maior, 31 de julho, dia em que foi emancipada de Pirenópolis, em 1907. Portanto, volto ao começo:

Era 1967 e a cidade festejava 60 anos de emancipação. É de Anápolis, pois, que estou contando. Eu vivi, recém casado, aos 20 anos, pouco mais de um ano na “Manchester Goiana” – apelido que enchia de orgulho os anapolinos. Trabalhava no Banco do Estado de Goiás, cursava o 3º ano do Clássico no Colégio José Ludovico de Almeida (apenas o primeiro semestre; voltaria naqueles dias ao tradicional Liceu onde concluí o Secundário). Minha filha, Élia Maria, acabara de nascer.

Meu amigo e mestre, Roland Vieira Nunes, que nos lecionava Latim,  convenceu-me a participar de seu grupo de teatro amador; lá fui eu, um grande canastrão, integrar o grupo. Meu gosto pela escrita levou o professor Roland a idealizar e realizar um jornalzinho, que rodávamos em mimeógrafo; eu mesmo datilografava as matérias, imitando, numa prosaica máquina de escrever Olivetti Lexikon 80, o formato de jornal. No momento de “bolar” o visual do jornalzinho, eu redigia o editorial, sempre cumprindo o desafio de ocupar todo o espaço na medida exata do texto, ou seja, não escrevendo de menos nem de mais.

Nesse embalo, o professor sugeriu-me produzir um texto em homenagem aos 60 anos da cidade; e eu o fiz, entusiasmado. Nasceu ali a minha vida de autor publicado. Começava a minha jornada jornalística – primeiro, como articulista e cronista colaborador; depois, redator, repórter, fotógrafo, editor etc. e tal.

Meu primeiro texto em jornal saiu, pois, naquele 31 de julho de 1967, e o veículo era O Anápolis, um dos mais expressivos noticiosos anapolinos de todos os tempos. Preciso, urgentemente, obter uma cópia dessa página... Afinal, é a minha história de vida, preciso suprir essa lacuna.

Desde então, não tenho como mensurar quantas palavras, quantas páginas e notas, quantos jornais e livros, quanto escrevi, enfim! Escrever poemas e crônicas, contos e ofícios, memorandos e relatórios sempre foi do meu ofício, seja por diletantismo ou por profissão. E isso começou muito antes, lá por 1958.

Mas volto a Anápolis. Sei que o prefeito Antônio Gomide e sua equipe, fortalecidos pelos segmentos organizados, preparam uma grande festa. E um dos grandes momentos será, certamente, o lançamento da terceira edição do projeto “Anápolis em Letras, Fatos e Imagens”, quando serão lançados 52 livros de autores anapolinos – nativos ou adventícios. Essa festa será no dia 29 de julho, segunda-feira, às 19 horas, no Centro Administrativo (Av. Brasil, 200).

Claro que eu vou! Mas, desde já, meus parabéns ao prefeito Gomide, ao secretário Augusto (da Cultura) e à escritora Natalina Fernandes, que preside a União Literária Anapolina e a Academia de Letras da cidade. Ah! E parabéns a Editora Kelps – chancela inevitável em projetos como esse.



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sexta-feira, julho 12, 2013

Que as ruas não se calem!

Que as ruas não se calem!


A população brasileira, espalhada por todo o território nacional desde os marcantes anos de Juscelino Kubitschek na Presidência da República (e, pleonasticamente, na construção de Brasília), saiu às ruas e às rodovias. Novidade? Só mesmo para os moços na casa dos 20 anos e os adolescentes. A última grande marcha nacional se deu em 1992, quando se deu a partida na máquina do impeachment.

Antes de 1992, o Brasil havia se movimentado sob a chamada “Muda, Brasil!” e a campanha “Diretas Já!”, lá por 1985, 1984... E, sob um mesmo chamado, em 1968, “o ano que não acabou”, como o definiu Zuenir Ventura. Pois é, 1968 foi o ano em que a estudantada francesa (sempre nos lembramos do levante francês), bem como a mexicana, a norte-americana, a japonesa, a tcheca e tantas, tantas outras mostraram-se inconformadas. E os policiais agiram em todos os movimentos, reprimindo e arrebentando para prender depois. Os movimentos brasileiros, unidos pelo clamor estudantil em protesto pelo assassinato de um jovem estudante no Rio de Janeiro, precipitaram a edição do AI-5 (os governos militares apelidaram de Ato Institucional sua atitude de rasga-constituição; e a cada vez que assim agiam, numeravam o arbítrio).

Os gritos e as exigências são, agora, como velas acesas; e no meio disso aí, a denúncia de que pelo menos duas agências espiãs norte-americanas atuaram no Brasil ao menos até 2002, com sua parafernália instalada em Brasília e capaz de rastrear comunicações estrangeiras de quaisquer origens, em especial as de Irã e China. Se, estando em Brasília, espionavam chineses e iranianos, deixariam de “ouvir” e “ver” brasileiros? Santa ingenuidade!

Estas semanas têm sido, sim, um inferno astral para a presidente Dilma Rousseff. E gritos pontuais (considerando-se a diversidade das queixas), mas uníssonos em todas as passeatas, mexeu-se no transporte coletivo, na saúde, nos procedimentos médicos, na formação acadêmica dos médicos, no marasmo conservador dos políticos (sempre a evitar reformas que tornem rígidos os procedimentos eleitorais e comportamentais de governantes e parlamentares) etc. e tal. Até mesmo o desgastado tema da reforma agrária parece ter ganhado corpo, ao menos nos movimentos da última quinta-feira.

Em meio a tudo isso, incomodam-me alguns conceitos emitidos por algumas autoridades. Numa das maiores cidades de Goiás, uma autoridade da Secretaria (municipal) da Educação sugeria que se fechasse  única biblioteca da cidade; enquanto isso, em Caldas Novas, o prefeito Evandro Magal atendeu a um apelo da presidente, Professora Marília Núbile, e cedeu um imóvel para sediar a Academia de Letras e Artes (parabéns, Magal! Obrigado, Magal! Há 24 anos esperávamos por isso. Parabéns, Marília!).

Em Goiânia, também na última quinta-feira, o tema do nepotismo voltou a agitar o Ministério Público que, até então, continuava sem informações sobre os familiares de Conselheiros empregados na Corte, bem como valores salariais destes e de comissionados lotados no órgão (o  TCE negara-se a atender aos pedidos do MP). Em Aparecida de Goiânia, o ex-prefeito Freud de Melo ofereceu à Academia Aparecidense de Letras um amplo salão para as reuniões e eventos da entidade, atendendo a uma sugestão da professora Maria de Lourdes Primo. Obrigado, Freud! Obrigado, Lourdes! Parabéns, confrades!

Os movimentos de rua, ainda que enfatizem demais as questões da Educação, ainda não conseguiram sensibilizar os políticos sobre o caos escolar em todos os níveis de escolas e de governos. “Quosque tandem”, minha gente?! Até quando?!

Receio que os clamores se aqueçam ainda mais. Muitas medidas foram idealizadas e concebidas ao calor das marchas, mas a omissão ante graves problemas podem inibir o alívio por atitudes válidas já adotadas. Redução da jornada de trabalho, solução acerca do “fator previdenciário” e medidas sérias para a Educação já se tornam exigências nada desprezíveis.


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terça-feira, julho 09, 2013

À espera da vitória

À espera da vitória


Fala-se tanto, nas últimas décadas, sobre uma crise mundial nos fundos de previdência social. Os argumentos centram-se em temas a serem contestados – ou combatidos – como a aposentadoria precoce. Sou de uma geração que conseguia aposentar-se na casa dos 50 anos, desde que o contribuinte provasse recolhimentos ao longo de 35 anos. E era comum, então, a pessoa começar a trabalhar, com carteira assinada, muito cedo.

Digamos que tal aposentadoria se desse aos 55 anos. Poucas pessoas ultrapassavam a marca dos 75 anos, ou seja, previa-se uma sobrevida em torno de vinte anos, e o cidadão contribuíra por 35 anos ou mais. Mas na última quadra do século passado a média da idade no Brasil estava crescendo, quer dizer, o Brasil estava envelhecendo. Aliás, o mundo estava envelhecendo e muitos países impediam aposentadorias a menores de 60 ou mesmo 70 anos. Havia, já, um famoso “rombo na previdência”, e a culpa era dos velhinhos.

Engraçado... Desde os tempos de Getúlio Vargas os fundos previdenciários eram desviados – ora para custear a campanha na II Guerra, com a produção de aço para a indústria bélica, depois para sustentar a construção de Brasília e das primeiras grandes hidrelétricas, depois para encher o país com as tais “obras faraônicas” do tempo dos generais e isso veio até o governo de Fernando Henrique, com o tal Fundo de Emergência.

Pelo menos, essas informações eram divulgadas por economistas – os “doutores da vez” naquele tempo de surgimento do Plano Real e os anos que se lhe sucederam. Orgias financeiras, cometidas pela cúpula dos governos, é prática corriqueira; quem não se lembra do socorro aos bancos? FHC o instituiu, Lula o assegurou.

Ah, como é a vida! Um estirão de anos que marcamos pelas lembranças. Lembranças dos folguedos (!) nas ruas de lama ou de pó, rodar pião, soltar pipa, brincar de finca ou de carrinho; banhos no córrego, pelada na rua, ao lado da Igreja, caçar vaga-lumes nas noites quentes, correr, pular muro... Lembranças dos primeiros namoros, dos passeios ingênuos nos jardins bucólicos das praças, dos filhos nascendo e crescendo, os netos chegando...

Mas a vida é curta, ainda. Sempre curta. Há a lembrança dos anos de resistência, de contestação, de oposição e protestos – essas coisas que pensávamos acabadas e que ressurgem fortes com os meninos de vinte anos deste 2013 de grandes mudanças. Ir às ruas, protestar, enfrentar a polícia, levar porrada dos cassetetes, lançar bolinhas de gude para derrubar a cavalaria, respirar gás lacrimogêneo, correr, gritar... Aquele gosto inocente de se sentir vitorioso ainda que, sob a repressão, gritar a última palavra ao restaurar a democracia, fazer valer o voto direto, tirar os fardados dos gabinetes do Executivo...

Sim! Tivemos a alegria da última palavra, mas tomaram-na das nossas gargantas, fizeram o que bem entenderam, restauraram alguns dos nossos direitos, mas preservaram o que mais nos incomodava. Por isso, os meninos protestam!

Tempos outros, estes; vida curta, ainda, mesmo que tenhamos ganhado uns 10 anos mais na marca mediana da vida do brasileiro. Mas ainda não temos a vitória: esta virá, porém. Mesmo que, agora estou certo, a grande vitória não está na última palavra, mas no primeiro silêncio.


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