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quarta-feira, junho 21, 2023

Ana Braga

 Faleceu ontem, 20/06/23, em Goiânia, a professora Ana Braga, aos 99 anos de idade (completaria o centenário no dia 29 de novembro próximo. Em sua homenagem, proferi, no dia 18 de maio passado, na Academia Goiana de Letras, onde éramos confrades, uma breve fala em sua homenagem, cujo teor transcrevo aqui. 


Ana Braga

Poema de Placidina Siqueira, da Academia
Feminina de Letras e Artes de Goiás, AFLAG.
(placidina.siqueira@gmail.com
)

 

 

Ana Braga,
    ah, Aninha!... 
parece real Bragança,
do Pedro Afonso,
ou Peixe do Tocantins ...

 

Ana Braga,
ah, Aninha!...
     não há Norte, sequer Sul
     que a desarme...
É e será sempre nossa mãe:

 

Estrela de Carne.

 

Ana Braga (acervo: UBE de Goiás).

Demonstrações de afeto são coisas que me emocionam. Em especial quando brotam de um coração mais moço, observador dos feitos que se tornaram meritórios na vida dos que nos antecedem. Neste caso, só não me surpreendo porque conheço a poeta Placidina Siqueira desde os meados da última década do século passado, ou seja, há quase 30 anos. Desde sempre, vi-a atenciosa e disposta a exprimir carinhos às pessoas à sua volta – ao seu saudoso João, aos filhos Júlia e Ocelo e, ainda, a nós outros, os que estivéssemos ao seu redor. É, pois, com indisfarçável emoção que renovo a admiração a essa mulher doçura que é a acadêmica Placidina. Aqui, ela sintetiza magistral e poeticamente o sentimento de que é tocada ante o exemplo de vida centenária e ações indeléveis de Ana Braga pela sociedade goiana, desde os tempos em que a goianidade era horizontalmente imensa – aquele gigantesco cenário que as condições da natureza e das pessoas conduziram à divisão geopolítica, multiplicando gentílicos: aquele Goiás de um quase distante ontem é, neste hoje, tocantinense, brasiliense e goiano.

Refiro-me ao foco dos sentimentos da Placidina Lemes de Siqueira, a intelectual, a professora, a vereadora e deputada, mãe de duas famílias – a da juventude e a da vida adulta, divididas pela viuvez. Em qualquer de seus estados civis, Ana Maria Braga expressou sua força individual como característica de caráter e de escolhas. Ainda criança, destacou-se como oradora na formatura do curso primário – e foi aquele o momento inicial do reconhecimento, por professores e colegas, da capacidade, do talento e da liderança que marcam sua vida até os nossos dias, vésperas de sua festa centenária.

A infância viveu cenários, primeiro em Peixe (então Goiás), depois em Descoberto (a atual Porangatu). Peixe, de Goiás, ainda é Peixe em Tocantins, na margem do grande rio que denomina o novo Estado instalado a 1° de janeiro de 1989; desse eixo provinciano daquela década de 1930, a menina Ana estendeu a vida nômade para outros aglomerados: conheceu Santana (hoje Uruaçu), Jaraguá e Corumbá; morou na católica Trindade, e de lá veio assistir ao despertar do futuro na poeira vermelha que brotava da sangria das artérias da moderníssima Goiânia.

O avô Joaquim Nunes Pinheiro alfabetizou-a aos cinco anos de idade; depois veio a escola primária, o ginasial (complementar) e, no Colégio Santa Clara, em Goiânia, diplomou-se Professora Normalista – em todos esses cursos, foi oradora da turma ao formar-se. Recebeu diploma de Catequista, das mãos do bispo Dom Emanuel; foi professora no Grupo Escolar Padrão (Modelo?) e no Colégio Santa Clara.

Em 1947 foi eleita vereadora em Goiânia; e em 1951, casou-se com seu primo Luís de Queiroz, com quem teve três filhas: Edetina Augusta, Ana Luiza e Efigênia Auxiliadora.

Parêntese: Filho é uma coisa que a gente coloca no coração e pergunta a Deus: Como será? Daí em diante, se vive em constante estado de alerta. Fechando parêntese. (Essa foi uma resposta de Ana Braga ao escritor Célio de Oliveira; está no livro Acima dos 80 rumo à velocidade da luz, de 2018, Kelps, 196 páginas).

Quatro anos depois, seu marido morreu num acidente na estrada que já se prenunciava como a Belém – Brasília – a BR-14, que hoje é a BR-153. Em 1956, bacharelou-se em Ciências Jurídicas e Sociais pela Faculdade de Direito de Goiás (que viria a integrar, a partir de 1961, a Universidade Federal de Goiás), ano em que também obteve grau de Licenciada em Geografia e História pela Faculdade de Filosofia – embrião da Universidade de Goiás (depois, Universidade Católica de Goiás e, hoje, a Pontifícia Universidade Católica de Goiás).

Elegeu-se, em 1959, deputada estadual; e em 1960, casou-se com o médico Trajano Machado Gontijo Filho, gerando outros quatro filhos: Antônio Paulo, Fernando, José Augusto, e Cláudio.

Logo após o casamento, mudaram-se para Tocantinópolis, onde, em 1962, Ana Braga elegeu seu marido prefeito municipal. Assim, além de deputada, ela era também primeira-dama. A família mudou-se para Porangatu, onde Trajano repetiu a façanha de Tocantinópolis: elegeu-se prefeito, após o casal construir o Hospital Nossa Senhora da Piedade.

Ana Braga desempenhava, ao longo de sua vida, incontáveis papéis na melhoria das condições de vida dos mais carentes. Inquieta e incansável, ei-la novamente em busca de mais uma profissão: a de Enfermeira, título obtido em 1963.

De sua lavra, vários foram os livros, incontáveis os artigos em jornais e revistas, múltiplos e variados, e sempre muito festejados, seus discursos em púlpitos das casas legislativas e eventos mil nos âmbitos acadêmicos e políticos, em cargos desempenhados na AFLAG, na AGL e na novel Academia Tocantinense de Letras, de que é, também, membro fundadora.

Apesar da época – os anos confusos da década de 1930, que resultaram na Segunda Grande Guerra; os quarenta do desfecho do conflito na Europa e na deposição de Vargas em seu Estado Novo; o pós-guerra ainda teimando em conservar costumes, com a hegemonia masculina nas sociedades... Enquanto tudo isso acontecia, Ana Braga brilhava com seus feitos e conquistas. Não deixou de ser mãe de família enquanto era vereadora e deputada, professora e agente de ações sociais, escritora e líder natural nas ocorrências culturais deste Estado em sua grandiosidade, antes do corte do quadrilátero Cruls e da separação Norte-Sul, colaborando, com seu poder feminino sagaz e persistente, para essas novas unidades federativas e a consolidação do poder que proporciona à mulher do Século XXI o albor da liberdade.

A esta Academia Goiana de Letras, chegou por eleição, em 2006, ocupando a Cadeira 31, que tem por patrona Eurídice Natal e Silva; a primeira ocupante foi Rosarita Fleury, sua parceira, em 1969, ao lado da também saudosa Nely Alves de Almeida, na criação da Academia Feminina de Letras e Artes de Goiás, a AFLAG, sodalício que se consolida em breve tempo e representa, com altivez e dignidade, a criatividade feminina cerceada, por quase um século, pelas academias de letras – tanto a Academia Brasileira de Letras quanto as regionais.

A propósito, esse lado de pioneira na personalidade de Ana Braga revela-se também quando, ao lado de Liberato Póvoa e outros, atuou para criar a Academia Tocantinense de Letras.

Nesta Casa, ela foi apresentada, formalmente, em data de sua posse, pelo então presidente Geraldo Coelho Vaz e recepcionada pelo acadêmico Ney Teles de Paula. Coelho Vaz pinçou datas e vínculos da sempre promissora vida política e social de Ana Braga; e Ney Teles de Paula situou-a, geográfica e historicamente, na realidade ancestral da nossa novel confreira, bem como em sua riquíssima biografia, com evidências para pessoas notáveis de seu convívio.

 

*  *  *

 

O carinho com que foi acolhida nesta Academia expressa-se além dos discursos do presidente Coelho Vaz e do orador oficial Ney Teles de Paula, num belo poema, da lavra inspirada de outro confrade, nosso também ex-presidente Getúlio Targino Lima:


SAGA

 

Veio
para vencer
a dor,
o amor,
o fenecer.

 

Veio
para inovar,
na vida,
no ser,
no ar.

 

Veio para crer
mais na força
do que na fraqueza,
mais na dor
do que na moleza.

 

Veio ser.
Ser mulher,
mas valente,
destemida,
desbravadora
de novos caminhos,
a conquistar alturas
impensáveis,
vencendo espinhos.

 

Veio ser mãe,
na ternura do seio
maternal,
e pai,
na fortaleza
do ombro seguro,
largo e puro.

 

Política,
creu em ideias
e praticou ideais.
Carregou laurel,
a que fez jus,
mas ombreou
a cruz.

 

Veio para dizer
que o bem se faz,
não se propala;
e que o mal se enfrenta,
não apenas
se fala.

 

Veio para durar,
durar o tempo
que o exemplo precisa
para ficar.

 

Veio dizer,
falar,
fazer,
mostrar
que, ao fim
e ao cabo,
valeu a pena
amar.

(Para Ana Braga, Ano Cultural de 2015 da Academia Goiana de Letras, GTL).

 

Neste ano de centenário, Bariani e Ana Braga são focos das nossas homenagens: as minhas entidades – a União Brasileira de Escritores em Goiás, na pessoa do presidente Ademir Luiz; a Academia Goiana de Letras, presidida pelo confrade e velho amigo Ubirajara Galli, e o Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, sob a liderança do profícuo historiador Jales Mendonça – empenham-se em honrá-los com a dignidade de que se fizeram merecedores, não só pela longevidade, mas por suas vidas profícuas, dinâmicas, criativas e benfazejas.

Agradeço à Academia Feminina de Letras e Artes de Goiás pela oportunidade que me ofereceu, recentemente, de homenagear tão queridos confrades; confesso-me feliz por participar dessas homenagens – que são também promovidas aqui, entre tão queridas confreiras. E rendi-me ao convite do presidente da AGL, Ubirajara Galli, por designar-me o orador para esse preito de honra à nossa centenária Ana Braga, a despeito das minhas limitações naturais e intelectuais para tão grandioso momento.

Aos confrades da AGL, às confreiras da AFLAG e aos amigos convidados que aqui se fazem presente, muito obrigado!

 

* * *

 

Luiz de Aquino, da Academia Goiana de Letras, Cadeira n° 10.



terça-feira, junho 13, 2023

AGL, Cadeira n° 4




Profa. e Acadêmica Moema de Castro e Silva  Olival, que se despediu a 20/03/21m vagando a Cadeira 4


AGL, Cadeira n° 4

 

Em recente decisão para alteração do Estatuto, a Academia Goiana de Letras mudou os critérios para a eleição de novos membros. O critério em vigor, nos moldes anteriores, exigia que, ainda em segunda votação, o eleito apresentasse 19 votos, ou a eleição seria anulada (na hipótese de ninguém atingir esse índice mínimo). E em algumas eleições em anos recentes, sequencialmente, vários sufrágios foram anulados e as novas chamadas para a mesma Cadeira vaga impediam os postulantes não vitoriosos. O fato é que as regras foram flexionadas, de modo a permitir, in fine, um resultado positivo.

Há um bom tempo que se espera preencher a única vaga na Academia, e é justamente a da Cadeira 4, antes ocupada pela Professora Moema de Castro e Silva Olival. O prazo para inscrição de candidatos começa amanhã, 14 de junho, e se estende até o dia 4 de julho. Os candidatos devem preencher as exigências do Edital – a principal delas é que seja autor de ao menos um livro. Os critérios outros serão apreciados, primeiro, por uma comissão especialmente designada, entre os membros atuais, devendo, ao término, emitir parecer que será apreciado pelo plenário da AGL; em seguida, com a eleição marcada, a entidade reúne-se para escolher, em votação secreta e direta, o novo ocupante da Cadeira.

O Edital foi publicado no jornal eletrônico A Redação, conforme divulga o jornalista Jales Naves; e de imediato, dizendo estar com a documentação preparada para apresentar amanhã, dia 14 (como foi dito, o primeiro para as inscrições), ligou-me o poeta e biógrafo Ademir Hamu. 

Habituei-me, há 26 anos, a declarar publicamente o meu voto e, em raras ocasiões, aguardei o andamento das movimentações para definir minha escolha. Este, porém, é um momento especialmente diferente, já que o meu convívio literário com Ademir Hamu remonta às primeiras escritas do ano de 1980 – somos admiradores mútuos: ele curte meus poemas e minhas prosas, e eu me delicio com seus versos e biografias. Entre nós, versos e cervejas foram chamariz e visgo, e cuidamos muito bem de, também na linguagem oral, trocar histórias e opiniões, além do compartilhamento de vários amigos da escrita e das tintas, dos palcos e das canções.


Leninha, obra poética de Ademir Hamu

Marquei, já, uma pequena e discreta rodada – claro, claro: irei de táxi, porque aceito, acato e respeito as regras de trânsito – para conversarmos sobre a campanha, posto que os propósitos eu já sei, bem como sei da base das exigências para o ingresso no sodalício maior (por sua natureza) das letras em Goiás.

Eu poderia, dirão alguns, esperar mais alguns dias para, em confronto com os demais nomes, manifestar a minha preferência; por duas vezes, fiz isso e não me dei bem: havia candidatos de igual estima e, na primeira ocasião, viajei, deixando de votar – numa outra, não marquei ninguém, posto que eram apenas dois e os dois me eram queridos por demais.

Assim, haja quem houver na disputa, o meu voto já tem marca e compromisso: é do poeta Ademir Hamu. Acaso surjam outros amigos, igualmente dignos de um espaço vitalício na Casa Colemar, merecerão igual delicadeza e atenção num próximo pleito. E é bom que fique claro: os meus mais-queridos precisam de, quando for o momento, apressar-se com os papéis, os livros a apresentar e o indispensável (e apressado pedido) para que, de igual maneira, eu declare o meu voto, evitando que outros candidatos percam tempo à minha procura.

 

*  *  *

Luiz de Aquino – Cadeira 10 da
Academia Goiana de Letras.