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terça-feira, maio 02, 2023

José Xavier de Almeida Júnior (Xavier Júnior, poeta)

  Na Sessão Solene de 27 de abril de 2023, em que comemoramos 84 anos de criação da Academia Goiana de Letras, o presidente José Ubirajara Galli Vieira lançou duas antologias, uma em que biografamos os patronos de cada Cadeira do sodalício, outra em que focamos nos presidentes da Casa. 



PRESIDENTE JOSÉ XAVIER DE

ALMEIDA JÚNIOR 

De 26/10/1953 a 29/10/1957


A meu encargo, dados biográficos e considerações
sobre a obra de Xavier Júnior.

 

José Xavier de Almeida Júnior, o poeta Xavier Júnior, nasceu no Palácio Conde dos Arcos, na Cidade de Goiás, no dia 20 de outubro de 1902, filho de Amélia Augusta de Morais e Almeida e de José Xavier de Almeida, então governador de Goiás. Cursou o primário em Morrinhos e, como aluno interno, o Ginásio Diocesano de Uberaba. Na Universidade do Brasil (hoje, Universidade Federal do Rio de Janeiro), na capital federal, formou-se em Medicina. Antes, pensou em cursar Direito, talvez por sua vocação natural para as letras. Casou-se aos 39 anos com Domitila dos Santos Fleury de Almeida e teve quatro filhos.

Praticou a medicina por pouco mais de vinte anos. Uma queda de retina afastou-o da clínica, provocando uma aposentadoria precoce – e, assim, dedicou-se ele mais ainda à poesia e, mais tarde, também à crônica e à crítica literária.

Foi membro da Academia Goiana de Letras, membro fundador da Cadeira 13. Ocupou a presidência do sodalício no período de 26/10/1953 a 29/10/1957.

Em seus primeiros meses de vida, a família se transferiu para Petrópolis (RJ) e depois Juiz de Fora (MG), vindo a família a morar em Morrinhos, onde Xavier Júnior começou os estudos e, por conta disso, viveu outros ares até se formar, no Rio de Janeiro. A par dos estudos, dedicou-se à Poesia desde 1920. Viveu, portanto, um período de intensas transformações no Brasil e no mundo: as novidades do após-guerra, a partir de 1918; o golpe que afastou o presidente Washington Luís e impediu a posse do presidente eleito (Júlio Prestes), dando início à “era getulista”, que se estendeu por 15 anos, terminando ao mesmo tempo em que alemães e japoneses se rendiam aos aliados na Segunda Guerra; viveu as grandes inovações tecnológicas – o rádio, o cinema sem sonoridade e até as imensas telas coloridas do “cinemascope”, a televisão, a conquista do espaço, a miniaturização que possibilitou a popularização dos computadores e da telefonia celular.

Inevitável, pois, seria a evolução de sua literatura desde os primeiros versos, antes que completasse vinte anos, até as vésperas de seus últimos dias. E, ainda assim, por integrar a Academia Goiana de Letras e (mais ainda) a sua presidência, sofreu discriminações e críticas desairosas de uma geração mais nova.

A obra, porém, aí está. Sua obra e sua vida. Ao alcance dos críticos que, imagino, silenciam-se pelo arrependimento – mas tal rejeição está em A Poesia em Goiás (segunda edição em 1983, pela Editora da UFG), (pág. 112) do poeta e crítico literário Gilberto Mendonça Teles, o mais antigo membro da AGL (empossado em 11/03/1961).

Obra

Cesareana Segmentar (estudo estatístico) – Tese de doutoramento. Rio, Tipografia Leuzinger,1927.

A Viagem de Frei Trapie – Uberlândia, Tipografia Alvina, 1931.

A Canção do Planalto (poemas) – Rio, Tipografia Emiel, 1942.

Leituras e lembranças – Goiânia, Editora Oriente, 1971.

Apreciações sobre a poesia de Xavier Júnior e, em especial, sobre A Canção do Planalto
(Do livro A Poesia em Goiás , de Gilberto Mendonça Teles, segunda edição em 1983, pela Editora da UFG)

A Canção do Planalto fora publicado em 1937, em edições do jornal Voz do Sul, de Anápolis, sob o título À Margem da Vida. São poemas datados de 1920 a 1942, ano da nova publicação, obviamente, com o acréscimo de poemas publicados entre 1937 e o ano da nova edição.

Gilberto Mendonça Teles, na obra acima citada, refere-se a Xavier Júnior como “um dos principais poetas desse tempo” – referindo-se ao período pré-modernista em Goiás. Escreveu GMT: “Nesse livro, que revela um poeta também eclético, com acentos parnasianos, simbolistas e modernistas, Xavier Júnior nos dá bem as dimensões de sua arte, zelosamente construída em qualquer dos rumos ecléticos que se propunha. Ali encontramos pela primeira vez em Goiás a divulgação do haicai, o menor poema de forma fixa, de origem japonesa, de que se tem notícia nas literaturas. Uma análise estética de A Canção do Planalto nos confirma as influências apontadas, as quais, (...) longe de lhe diminuir a obra, dão-lhe uma natureza dinâmica que é afinal de contas o inconformismo, a preocupação com novos roteiros a seguir. Assim, o poema que dá o título ao livro, com arroubos épicos, lembra, pela concepção temática, o ‘Caçador de Esmeraldas’. A linguagem vocabular de muitos poemas corroboram ainda essa aproximação parnasiana, bastando lembrar o verso Sacode o corpo todo ao brônzeo duende, em que, a par de ‘corpo’ e ‘brônzeo’, há toda uma contenção de forças, cuja célula é o ditongo imperfeito de ‘brônzeo’, transmitindo ao verso uma como intensa vibratibilidade plástica, idealizada pelos parnasianos. Há, ainda, palavras como ‘argonautas’, títulos de poemas como ‘Holocausto da Volúpia’, ‘Salamandra’, ‘Pantápole’, e tantos outros que não deixam dúvida quanto à sua filiação literária”.

Gilberto discorre mais sobre o poeta Xavier Júnior: “Os acentos verdadeiramente modernistas são poucos e se encontram nos poemas citados na Antologia” (refere-se à seleção feita por ele próprio, GMT, sob os títulos As Chuvas de Ouro e Coração Vazio). E cita A. G. Ramos Jubé, que escreveu: “Xavier Júnior, ao lado de José Lopes Rodrigues, comandou o grupo de reação ao movimento modernista de 1942”.

Em seguida, traz o que publicou Vítor de Carvalho Ramos ao referir-se a Xavier Júnior: “No seu livro não dita velharias, sonetinhos inexpressivos, de temas banais, ao alcance de qualquer vate medíocre. Nada de monotonia e vulgaridade dos passadistas. Seus poemas, num ritmo novo, são espontâneos, palpitantes de emoção e tomam, por vezes, a cadência épica. Se, em algumas de suas poesias, o sentimento predominante é o da tristeza e do pessimismo, todavia esse sentimento é resignado e compreensivo, sem as exclamações e desespero dos retóricos. O lirismo de Xavier Júnior é em tom menor, sutil, emotivo, às vezes elegíaco. Sua musa é mais descritiva. Prefere refletir algo da graça e da ternura da alma da natureza”.

Também Leo Lynce, no jornal Araguaia, escreveu: “Xavier Júnior, que é, sem favor, a mais completa expressão da cultura literária goiana desses nossos dias de absorventes utilitarismos, dá-me a impressão que tive de Afrânio Peixoto e tenho de José Lins do Rego: mesmo com o consultório a transbordar de clientes e mesmo escrevendo sobre medicina, o doutor passa para o segundo plano e é sempre o escritor que interessa. A ideia da pena e não a da agulha de injeção é que perdura”.

Prosa ficcional

Ponta de Linha (romance) é obra pulicada postumamente pela família quando do centenário de nascimento do autor (2002). Escrito nos primeiros anos da década de 1940, permaneceu inédito, pois, por cerca de 60 anos. Xavier Júnior valeu-se, certamente, da chegada dos trilhos a Anápolis, em de 1937, onde viveu de 1935 a 1952.

A concepção do romance acontece ao tempo em que se construía Goiânia, que substituía a antiga capital de Goiás. O texto, de ótima linguagem e criatividade ficcional, prende o leitor até o final da trama, com uma história de amor e amancebamento de um jovem médico com uma fazendeira, numa pequenina cidade à beira do trem.

Leo Lynce (outra vez o nosso primeiro modernista) assim se expressou sobre Ponta de Linha:

(...) romance que tive a fortuna de ler em forma datilográfica e sem cuja publicação “desaparecerá, sem dúvida, nas diluições da tradição oral” uma das fases mais curiosas da vida goiana, ou melhor, da vida Anapolina (...)

O romance de Xavier Júnior, como o título está a indicar é um depoimento pessoal (desculpada a expressão jurídica), um documento filmado em tecnicolor, todo ele palpitante de vida e de interesse humano, a fixar o milagre operado pela via férrea, ou seja, a transformação da antiga Sant’Ana das Antas em moderna urbe, capital econômica e meca política do Estado – a portentosa Anápolis de hoje.

*  *  *

Ainda nos anos de 1940, a obra, em seu original, recebeu críticas e louvações dos companheiros escritores da época; e ao ser lançada, mereceu referências exaltadas de um ex-aluno de Xavier Júnior – o escritor e também acadêmico José Asmar, bem como comentários favoráveis de tantos quanto tiveram acesso ao livro – eu inclusive. 

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Luiz de Aquino, membro da AGL,
 Cadeira 10.



Moisés Augusto de Santana

 Na Sessão Solene de 27 de abril de 2023, em que comemoramos 84 anos de criação da Academia Goiana de Letras, o presidente José Ubirajara Galli Vieira lançou duas antologias, uma em que biografamos os patronos de cada Cadeira do sodalício, outra em que focamos nos presidentes da Casa. 




MOISÉS AUGUSTO DE SANTANA
Patrono da Cadeira 10 da Academia Goiana de
Letras, assento de jornalistas literatos.


Coube-me a missão de discorrer sobre
Moisés Augusto de Santana.



Ainda pranteávamos Carmo Bernardes da Costa, falecido em abril de 1996, aos 80 anos completados em dezembro do ano anterior, quando a Academia Goiana de Letras, na época presidida pela mestra Maria do Rosário Cassimiro, procedeu à Sessão Magna da Saudade, com a Declaração de Vaga da Cadeira n° 10. Eleito em outubro daquele ano, vim a ser seu terceiro ocupante.

Albatênio Caiado de Godoy, advogado e jornalista, homem público e escritor, ocupara a Cadeira 10 desde a criação da AGL, em 1939. O sodalício foi das primeiras instituições culturais surgidas na nova capital, onde já se sediava o Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, transferido da antiga capital e instalado em edificação própria na chamada Rua 82, que divide o Centro do Setor Sul, em Goiânia.

Ao criar-se a nossa Academia de Letras, coube à Cadeira 10, como Patrono, o nome do jornalista, professor, advogado e poeta Moisés Augusto Santana Neto, nascido no dia 7 de fevereiro de 1879 na capital do Estado – hoje, a Cidade de Goiás.

Aos 15 anos, quis ser militar. O temperamento irrequieto e a índole de homem livre fizeram-no andarilho. Sua biografia, sintética e muito clara no texto de Humberto Crispim Borges, no livro Retrato da Academia Goiana de Letras, ou a homenagem que lhe prestou o mesmo Crispim em discurso nesta Casa, mostra-nos um jovem autêntico, capaz de vaiar o Presidente da República e o Ministro da Guerra, fato que o afastou do corpo de alunos do Preparatório para a Escola Militar. É aceito depois, para novamente ser desligado por novo ato de indisciplina, sendo integrado à tropa e mandado para o Nordeste, tornando-se combatente aos fanáticos de Antônio Conselheiro em Canudos. Após o fim dessa campanha, dá baixa do serviço do Exército e torna-se escrivão de polícia em São Paulo.

A partir de então, sua vida é uma infindável sequência de registros anuais. Em 1898, inicia o curso de Direito e torna-se jornalista, restaurando o periódico A Nação, mas em 1899 já se realiza nova mudança de moradia ao transferir-se para Belém do Calvário, no interior de São Paulo.

Em 1900, depois de algumas andanças, retorna a Goiás, fixando-se em Santana das Antas, onde foi Procurador de Partes, casou-se com Cassiana Alves de Sousa e se fez professor e secretário do Conselho Municipal, chegando a exercer o cargo de Intendente. É dele a autoria de notas em jornais pelo novo nome do logradouro, após sugestão do deputado Abílio Wolney: Anápolis. Criou uma seção no jornal Lavoura e Comércio, de Uberaba, com o título de Vida goiana. Elegeu-se deputado por Pirenópolis, Corumbá, Antas e Bela Vista, mas não exerceu o mandato.

Em 1905, mudou-se para Vila Boa. Interinamente é Procurador da República e começou, então, um ritmo de vida que o faz mudar de cidade a cada ano, sempre envolvido nas lides jornalísticas. Em Catalão, fundou o Sul de Goiás. De volta à capital do Estado, assumiu a Secretário de Polícia, mas deixou o cargo e mudou-se para Curralinho (Itaberaí); depois, Morrinhos, onde advogava e codificava as leis municipais. Foi morar em Inhumas — vale registrar que é dele o novo topônimo da antiga Goiabeira —; de volta à capital, colaborou no jornal A Imprensa. Depois, foi diretor do Estado de Goiás e iniciou uma sistemática campanha contra o presidente Urbano Gouveia dos Santos, que acabou renunciando. Moisés foi também, nessa ocasião, Promotor Público da capital e professor de Pedagogia e Metodologia na Escola Normal. Voltou a morar em Catalão e, em seguida, Uberaba, onde lançou o Brasil Central.

A partir daí, ele morou em: Barbacena, Uberabinha (hoje, Uberlândia), de novo Barbacena, outra vez Catalão, outra vez mais Uberaba, Ribeirão Preto, Sacramento, Santa Rita do Paranaíba (a atual Itumbiara) e Bonfim (que hoje é Silvânia). Nesse período, que vai de 1913 a 1921, criou, dirigiu e colaborou em vários periódicos, fundou o que se pode chamar de o embrião do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás — a Sociedade Goiana de Geografia, em Santa Rita do Paranaíba, em 1918; com o nome de Sociedade Goiana de Geografia e História, instalou-a em Bonfim, em 1921; e, nesse mesmo ano, a 22 de outubro, a Sociedade ganha sede também no Rio de Janeiro.

Em 1922, volta a morar em Uberaba, onde foi nomeado bibliotecário da Câmara. Por ter publicado versos de sua autoria, mordazes, alusivos ao presidente da Câmara, o médico João Henrique Sampaio Vieira da Silva, foi por este interpelado na redação do Lavoura e Comércio. João Henrique, em atitude covarde, surpreende o jornalista, ferindo-o a bala. Essa tragédia aconteceu três dias após a nomeação, pelo mesmo João Henrique (médico, presidente do Conselho e Intendente Municipal interino, exercendo uma gestão marcada por irregularidades). Moisés Augusto de Santana faleceu na noite do dia seguinte.

 

*  *  *

 

Meu primeiro contato com referenciais de Moisés Santana, além das evidentes homenagens para a posteridade, como nome de logradouros e estabelecimentos de ensino, se deu em 1965, ao ter seu neto homônimo como colega de trabalho, tanto como agentes de venda do livreiro Paulo Araújo quanto como aprendizes de bancários, admitidos por concurso, ao tempo em que essa era a prática para admissão nas instituições do Estado de Goiás. Moisés Santana Neto vinha de ser punido pelo Ato Institucional número 1, o que lhe interrompeu a carreira de oficial da Polícia Militar. Mais tarde, juiz de direito, seria alvo do Ato Institucional número 5, para depois ser reintegrado e tornar-se o mais polêmico de todos os que usaram a toga da magistratura de Goiás, repetindo a sina do avô, sempre afrontando o arbítrio pela Lei e a Justiça. Depois, eu já bancário, por várias ocasiões atendi o desembargador Paranaíba Pirapitinga Santana – filho do jornalista e pai do juiz – na agência do Banco do Estado de Goiás na Praça Cívica.

No prefácio ao livro Moisés Santana, vida e obra, obra já citada, Anatole Ramos escreveu:

No princípio (aqui em Goiás) era o Verbo. E o Verbo era Moisés Santana. Isso está, sans dire, neste livro de Humberto Crispim Borges, escritor de pulso (...) e pesquisador paciente e consciente. Moisés Santana não foi um jornalista qualquer, como as muitas figuras inexpressivas, que militaram na nossa incipiente e insipiente imprensa de fins do século passado e começo deste (refere-se aos séculos XIX e XX). Ele foi O Jornalista modelo, o padrão, para todos nós, profissionais desse ofício, hoje e sempre.

Anatole Ramos defende, nesse texto, que se tenha estátua de corpo inteiro, em pedra ou bronze, de Moisés Santana em praças, e que ele deveria estar presente “em todas as formaturas de jornalistas (...) em qualquer gênero de homenagem”. E cobra, a quem de direito (ou de dever) que se cuide de publicar tudo o que escreveu o maior dos nossos comunicadores: “Há tanta coisa ainda para se divulgar do que Moisés Santana escreveu que em valia, agora, editar-se tudo dele, do mais simples dos bilhetes ao mais longo dos discursos num tribunal de júri. Eis o que qualquer inteligente (modéstia à parte) há de desejar” (ao término da leitura da obra de Humberto Crispim Borges).

Em magnífica palestra, quando do centenário de nascimento de Moisés Santana, o acadêmico Jerônimo Geraldo de Queiroz foi lapidar:

Precoce ou prematuro, até mesmo para morrer – qual Hugo de Carvalho Ramos, Alceu e Higino Vitor Rodrigues, Gastão de Deus, Urbano Berquó, Egerineu Teixeira, Americano do Brasil, Joaquim Bonifácio, Antônio Félix de Bulhões Jardim – aos nove anos já era Moisés Augusto de Santana aprovado nos exames de primeiras letras; aos treze, em Instrução Religiosa, Português e Francês; aos 15 já é praça no 20° Batalhão de Infantaria; aos 16, já na Escola Militar da Praia Vermelha, donde é removido para o 5° Batalhão de Infantaria, no Recife, daí para a Bahia, daí para Canudos; aos 19, já jornaleia em A Nação, da capital paulista, e inicia o curso de Direito; aos 20 anos, procurador de partes em Goiás; aos 22, casa-se em conceituada família da então Vila Rica de Santana das Antas, hoje Anápolis. Daí por diante é jornalista habitual, professor público, Secretário do Conselho Municipal da Intendência de Antas, Escrivão de Órfãos, deputado estadual depurando antes da posse, Procurador interino da República, advogado, codificador das leis de Antas, Catalão, Morrinhos, Santa Rita do Paranaíba, hoje Itumbiara; Secretário de Polícia, Promotor Público, Procurador Fiscal, fundador, editor e diretor de jornais e mais jornais; escreve livros, colabora em revistas e periódicos de vários Estados – vindo a falecer em 21 de maio de 1922, pelo médico maranhense João Henrique Sampaio Vieira da Silva, por vermitagem do médico jornalista e político Boulanger Pucci, e lacaísmo do jornalista João de Minas e dobrez sérpea de Monsenhor Inácio, justo por ter tido sempre o despavoro de opugnar as autoridades arbitrárias e desonestas, e de testemunhas sempre a verdade, como dever sagrado do orador e do jornalista autêntico.

A visita do conselheiro (em termos atuais, vereador) e intendente (prefeito) à redação, com o propósito de interpelar Moisés Santana sobre uma nota, em versos, sobre questionável gestão de verba (João Henrique era acusado – e Moisés estava seguro quanto à veracidade do fato – de desviar nada menos que 12 contos de réis). Num poema, o nome Henrique surge, em modo de disfarce, trocado por Henriqueta, o que incomodou de tal forma o edil e médico maranhense. Insuflado por um colega médico, Boulanger Pucci (que era também jornalista e político), pelo jornalista João de Minas e o religioso católico Monsenhor Inácio Xavier da Silva, o ofendido sacou de um revólver e começa a disparar. O diretor do jornal, Quintiliano Jardim, tentou impedir o atentado, atracando-se com o agressor; Moisés Santana, mesmo atingido, conseguiu desarmar João Henrique que, no entrevero, acabou disparando contra si próprio, involuntariamente. O jornalista foi bem assistido por uma equipe médica de Uberaba, cujos membros se revezavam na missão, mas seus esforços apenas adiaram, por pouco mais de 24 horas, o desfecho trágico: Moisés Augusto de Santana faleceu às 21h39min do dia seguinte, domingo, 21 de maio de 1922. “O criminoso, julgado a 21 de junho de 22, foi absolvido, em decisão política. Juiz: Carlos Ferreira Tinoco; Promotor: Cartomano Coelho; Advogados de Defesa: Leopoldino de Oliveira e Tancredo Martins” – como consta do referido livro de Humberto Crispim, nas páginas, 53 e 54.

 

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Menos de uma semana antes, o escritor Coelho Neto esteve em Uberaba, onde proferiu palestra a 15 de maio. Sobre Moisés Augusto de Santana, informado do desenlace por Quintiliano Jardim, o autor de Esfinge e Os Pombos respondeu: “Que desgraça! O telegrama atordoou-me e mais desolado fiquei depois que li, no seu jornal, a minuciosa descrição do crime”.

No entender de Coelho Neto, Moisés Santana "foi o polemista mais audaz e vigoroso de seu tempo". O encontro dos dois autores, como se vê, deu-se às vésperas da dramática morte do mais notável dos jornalistas goianos. Ao término de seu lamento pela morte do amigo, o criador do epíteto Cidade Maravilhosa (para o Rio de Janeiro) pediu um exemplar do jornal, com toda a notícia do atentado e fatos envolventes, entre outros interesses, encerrando assim: “Quero conservá-lo como lembrança do formoso episódio que aí achei em pleno fulgor. Deus o tenha...”. (*)


 

(*) A referência era a um belíssimo texto de Moisés sob o título Taipoca, o nome tupi para o nosso ipê branco. O artigo – uma elegia à solene árvore de folhas brancas – saiu em seguida. Itaipoca é uma palavra indígena que define uma árvore da família das Bignoniáceas, com o nome científico de Tabebuia Odontodiscus, também chamada de ipê branco, taipoca e taipó. Itaipoca, em tupi-guarani significa, literalmente, “planta que estala – ou racha”. L.deA. 



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