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domingo, dezembro 29, 2013

Renovar. Ou não...


Renovar. Ou não…


A gente não precisa ser tão preciso... nem tão sertão, ou sertanejo. Aliás, o termo sertanejo já não se refere mais ao que nasce ou vem do sertão, ou o que lá existe. Tornou-se referencial a quem, dono de algum dom de nascença (no caso, a voz; ou a musicalidade) escolhe aplicá-lo sem cuidar de algo trivial e de excelentes resultados – o estudo em torno de tal dom.

Mas eu falava de precisão, exatidão; ou de precisão, necessidade. E renovo a frase: a gente não precisa ser tão exato. Ao dizê-lo, quero referir-me ao fim de mais um ano, ou às vésperas da Passagem, que os franceses chamam de réveillon (e a gente repete aqui na terra brasilis: reveión). Sei de pessoas que correm atrás de pagar todas as contar e começar o ano em ritmo de nova vida, sem contas a pagar; e os que dedicam a última semana, estes dias pós Natal, para analisar os feitos dos últimos 360/365 dias: perdas e ganhos, feitos e adiados, planos e surpresas.

Tenho amigos que costumam sugerir-me, sempre, textos alusivos a essas datas – o mesmo repetindo-se no Carnaval, na Semana Santa, na Semana da Pátria et cetera. E, como “sou facim”, costumava atender... Até que me enchi daquilo. Era muito previsível, trazer textos festivos atrelados ao calendário. Eu costumava, por exemplo, duas vezes ao ano (nos primeiros dias de julho e em meados de abril) escrever sobre o nascimento de Vinícius de Morais (outubro) e sua morte (julho). Até que, já na segunda metade da década de 90, escolhi me calar. Foi o bastante para que os colegas da imprensa não se referissem ao Poetinha da Bossa Nova: eu não despertei as lembranças de ninguém.

Há um ano, comentei (devo ter escrito em algum lugar) que em 2013 era para se festejar o centenário do menino da Rua Lopes Quinta. Mas eu próprio não festejei esse centenário. E não o fiz para não parecer, a mim mesmo, injusto: muitos outros artistas especiais nasceram naquele 1913. E em 1912; e em 1914. Constatei que a década da Primeira Guerra Mundial foi pródiga em artistas talentosos e populares (Dorival Caymmi, Ciro Monteiro, Rubem Braga, Luiz Gonzaga, Jorge Amado etc. e tal), bem como a de 40, que já começou sob os fogos da Segunda Grande Guerra.

Entendi que os tais períodos pós-guerras são mesmo de grandes avanços, tanto nas ciências e na tecnologia quanto nas artes. Foi na década de 40 que nasceram poetas, compositores, cantores, instrumentistas e outros artistas mais, de ambos os gêneros, o grosso deles constituindo o que a mídia especializada chama de “a geração de ouro da MPB”.

Pensando assim, firmo ponto neste ponto: não é mesmo necessário ser tão preciso; basta que sejamos necessários, ainda que falhos. Alguém já falou que canalhas também envelhecem; passo a pensar que só temos por anjos aqueles que morreram mais cedo e não tiveram tempo bastante para se mostrarem vilões. Logo...

Logo, não foi exatamente em 2013, mas nos últimos anos, que descobri canalhas mascarados de amigos. Mascarados, sim, porque as faces reais não eram de amigos. Nem de inimigos admiráveis (admito: tenho alguns desafetos cujos defeitos são os que os impedem de me serem próximos). 

Mas é bom, ainda que fixados nas datas que fecham o ano, termos a certeza sobre ex-amigos. A gente precisa aprender a perdoar o próximo, mas principalmente perdoar a si próprio. Não sou um anjo de candura e perfeição, mas nos últimos dias tenho gostado de perdoar-me pelos enganos vários e reincidentes acerca de indivíduos a quem ofereci abraços e dos quais recebi risinhos sarcásticos.

Perdoei-me. E foi bom!



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sábado, dezembro 21, 2013

Medo de chuva



Esta publicação poderia ser ricamente 
ilustrada com fotos, desenhos 
etc., mas as imagens das chuvas, 
este ano, estão muito menos românticas 
que as dos anos anteriores.



Medo de chuva


Lembranças de infância costumam trazer cores fortes e odores precisos. Diziam-me os que eram adultos quando eu era pequenino que minhas lembranças não eram exatas (aqueles adultos, em sua maioria ou quase totalidade já se foram para o plano superior), e eu não conseguia, ante esses argumentos, modificá-las; achava eu que minha memória estava precisa – afinal, minha memória não mentiria para mim.

Ainda hoje, sem o testemunho contraditório dos “meus mais velhos”, lembro-me das coisas com as mesmas cores e os mesmos cheiros. E sons. De uma coisa, porém, tomei certeza posterior: os adultos que eu imaginava muito altos não eram mais que pessoas medianas – apenas eu era miúdo. Apenas? Não: meus amigos também eram miúdos, como eu.

Os temporais nacionais desta estação, esta transição da Primavera do Verão, incomoda o Brasil total, amedronta o Sul e o Sudeste, encharca o sertão do Nordeste, escurece o céu do Planalto Central, desliza montanhas aí afora, Brasil adentro; e desaloja pessoas, destrói pontes e casas, corta rodovias, leva pontes, derruba postes e árvores etc. E na continuidade, mata pessoas. O momento das notícias do tempo são mais esperados que as do esporte (entenda-se futebol, que o resto é comentário, apenas).

Esta manhã, sexta-feira, 20, às vésperas do Natal, amanheceu sem chuva em Goiânia. E o silêncio das gotas despertou minha memória para os sons das chuvas noturnas nas telhas de nossa casinha na avenida Coronel Bento de Godoy, em Caldas Novas. E não era apenas o som dos pingos fortes na cerâmica do telhado: era um momento, ainda que impreciso. Uma noite de Primavera, ou de suas vésperas, entre 1952 e 1954.

Aquela chuva me acordou, e era madrugada quase ao fim. O dia clareara e minha mãe, veio nos chamar, as aulas sempre começavam às 7 horas.

As folhas das árvores e dos arbustos enfeitavam-se com as pérolas da primeira chuva. O chão do quintal e das ruas mostrava-se salpicado das gotas, e eu olhava aquelas formas e criava fantasias: eram formações como as de uma figura de livro mostrando crateras na Lua, mas podiam também ser miniaturas de castelos – se as formigas e outros insetos construíssem castelos.

Mas a vida cheirava diferente. A gente dizia ser “cheiro de terra molhada”. Sobre isso, discuti com a professora, dona Vanda Rodrigues da Cunha: não é, não; é só cheiro de chuva. Se fosse cheiro de terra molhada a beira do córrego também tinha esse cheiro”. Ela me olhava em silêncio por cinco ou dez segundos; depois, beliscava-me as bochechas e me abraçava apertado, e eu não gostava, sentia-me asfixiado (década depois, ela me contou que se surpreendia com meus argumentos, sempre diferentes do que ela esperava).

E era, então, aquele cheiro... O cheiro da terra que recebeu água da chuva, mas só de pouca chuva, porque quando chovia demais o cheiro sumia. Prenúncio de frutas maduras nos pés, e nós meninos a reagir naturalmente, sem ensaios nem planos mirabolantes: iríamos povoar quintais e árvores, feito os periquitos em festas.

Tempo bom, aquele! Não tínhamos medo das chuvas, só mesmo alegria com sua chegada. Medo de chuva era coisa de adultos – pais e mães a nos chamar para dentro de casa, fechar janelas e portas, acudir com baldes as goteiras (quase todas as casas tinham goteiras) e ouvir histórias de adultos, contando de rios cheios e pontes cobertas.

Mas de que nos interessavam pontes intransitáveis ou rodadas nas enxurradas? Nosso mundo era o dos quintais e das ruas sem calçamento; os perigos ficavam só para a gente-grande. Problema deles, uai!


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domingo, dezembro 15, 2013

O balanço da Saúde

O balanço da Saúde



O que se  propunha a ser uma reunião para divulgar o balanço de atividades de três anos de trabalho, na terça feira passada (10 de dezembro), tornou-se, inevitavelmente, uma festa de congraçamento e de regozijo ante o anúncio ou a divulgação de fatos e dados, como números de atendimentos e valores aplicados.

Refiro-me à reunião convocada pelo secretário da Saúde do Estado, o médico Antônio Faleiros, que pôde reativar planos e projetos de um quarto de século atrás (quando foi secretário de Saúde no governo de Henrique Santillo, 1987/90). O evento contou com a presença do governador Marconi Perillo, que enalteceu os trabalhos de seu auxiliar e destacou-o como profissional e político, recordando o voto decisivo do então deputado federal que, em 1990, evitou que o PSDB apoiasse o governo Fernando Collor.

O enfoque político justifica-se: Faleiros deve deixar o cargo no final deste mês para candidatar-se à Câmara Federal. O governador manifestou-se disposto a, em comum acordo com o secretário, escolher seu sucessor em condições tais que permitam a continuidade dos projetos ora em andamento. E, em seguida, Marconi dirigiu-se aos funcionários (cerca de mil pessoas) da Saúde, comprometendo-se a “não concluir este governo sem ter aprovado o plano de cargos e salários” ora em estudos, em bases seguras e compatíveis com as possibilidades financeiras do Estado”.

A gestão atual de Antônio Faleiros repetiu a qualidade que, há cerca de 25 anos, ele imprimiu à Pasta; naquele tempo, dentre outros grandes feitos, ele instituiu e pôs a funcionar o Hospital de Urgências, HUGO 1 (Hospital de Urgências Dr. Valdomiro Cruz)  ) e os hospitais regionais. Agora, constrói o novo hospital de urgências na região noroeste de Goiânia, o HUGO 2 (Hospital de Urgências Otávio Lage de Siqueira). As outras unidades são os HUGO de Anápolis, Aparecida de Goiânia, Trindade, Região Sudoeste (Santa Helena) e os que estão em construção – Uruaçu, Santo Antonio do Descoberto e Águas Lindas.

Vem aí, também, e já está em bom estágio de formação, o complexo de Consórcios de Saúde, congregando municípios regionalmente, de modo a reduzir quilometragens e tempo de percurso para o atendimento de média e alta complexidade. Nesse esforço, tem-se a importante instituição dos Ambulatórios Médicos de Especialidades – AME. Trata-se de uma iniciativa já experimentada e aprovada em outras unidades federativas, com excelentes resultados em qualidade e custos.

Também nestes três anos, com ótimos resultados, realizou-se o Plano de Fortalecimento, beneficiando 22 unidades de saúde em 18 municípios, com serviços de média e alta complexidade em níveis regionais, descentralizando a assistência e interiorizando as ações da Secretaria.

Reativação e ampliação de leitos de UTI, investimentos de alta monta para a compra de medicamentos nas áreas de oncologia e queimados (cirurgias reconstrutoras), hemofilia e medicamentos de alto custo; apoio a instituições específicas como Vila São Cotolengo, hospitais filantrópicos e outras áreas estratégicas são itens de realce na prestação de contas do Secretário, que destacou também os avanços expressivos, em 2013, na área de transplantes.

Finalizando: a Central de Medicamentos de Alto Custo Juarez Barbosa atingiu, este ano, um valor superior a 88,5 milhões de reais em compras e atingiu, pela primeira vez, 100% do estoque abastecido. A CMAC atende 98.656 pacientes cadastrados (26.189 receberam medicamentos nos meses de agosto a outubro de 2013).

O relatório é muito, muito maior. Destaquei o que entendi como maiores evidências. A esperança, ao menos em mim, é a mudança radical do cenário de congestionamentos nos corredores das unidades de saúde em Goiás.

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sexta-feira, dezembro 06, 2013

Madiba e Clara: a Morte e a Esperança.

Madiba disse que vai dormir por toda a eternidade... Ele não sabe, mas não deixaremos: ele será evocado sempre!


A Morte e a Esperança


Neste Planalto Central, o Sol já se despedira, na noite de quinta-feira (5 de dezembro, 2013) quando as rádios e tevês noticiaram, em boletins extraordinários, que o líder sul-africano Nelson Mandela, de 95 anos, acabara de falecer. Sim, não era uma luz – mas uma energia diferente espalhou-se pelo mundo, dando início a um estado de comoção nos que têm informação bastante para saber o que significou aquele homem.

Venho dizendo há alguns anos que Mandela é o último estadista digno desse qualificativo no mundo. E o Século XX acolheu muitos estadistas respeitáveis pelo mundo afora – ao lado de um número parecido de facínoras que exerceram o poder sob o carimbo do arbítrio, provocando guerras de ganância e sede de sangue. No contraponto, tivemos Gandhi e Mandela.

No Brasil, digno do termo, tivemos Juscelino Kubistchek, que ganhou a injusta rejeição dos que, bairristas, não queriam perder o status e a concentração de verbas que mantinham os anos dourados,o fastio, o luxo que condenava à pobreza os povos de 90% do território continental brasileiro. Depois, tivemos o período de ódio e arbítrio, sem a legitimidade que se espera de primeiros-mandatários; e a ocorrência de aventureiros – ora príncipes, ora bufões – da ópera da redemocratização com que continuamos a sonhar.

Mandela é diferente. Madiba (o nome foi trocado na infância, pela professora; os brancos colonizadores não aceitavam os nomes nativos, substituía-os pelos de heróis ingleses) cuidou de crescer; depois, colocar-se a serviço de sua nação – e, ao fazê-lo, tornou-se referência para os povos oprimidos. Nem mesmo os 27 anos de prisão arbitrária ofuscaram sua liderança, sua dignidade e sua força.

A mídia publica, desde a notícia de sua morte, muitas frases fortes e capazes de sustentar ideais. Destaquei esta:  “A Educação é a arma mais poderosa para mudar o mundo”. (Mandela, o Madiba).

Com isso, sintetizo minha homenagem de homem comum, anônimo e mínimo nesta humanidade – ora irascível, ora irracional – que tem tudo para ser melhor, mas prefere fazer-se cega e surda... Festejo, sim, a morte de um Homem para agradecer a Deus por nos tê-lo emprestado por 95 anos. Ao morrer, ele me enche de esperanças!

Do outro lado, no ângulo em que a morte é razão de lágrimas e lamentos, encontro a escritora Clara Dawn, num texto espontâneo e cordial, de dores e, sem que ela própria o perceba agora, de esperanças:

Clara Dawn: a poetisa lamenta em prosa e verso. Ela é grande e busca amoldar-se a novos tempos.

“... o céu que veio entardecer o dia do lado de fora da minha janela... Hoje, despeço-me destes portais e, confesso, os amei. Amei ficar um tempo aqui: o piso de madeira; a sala espaçosa; a lua cheia que sempre me despertava com seu clarão invadindo o quarto (cortinas abertas só para surpresa deliberada); bons vizinhos e a vinte passos do trabalho...Ah, eu amei esta janela com vista para a Catedral: em versos tantos, pensei debruçada no parapeito, olhando o indo e vindo das gentes...Mas esta casa, agora, é o leito de um fracasso... lugar que entristece-me, lugar em que sinto que fracassei na missão de mãe. Estou partindo... Novo lar, onde o "talvez" possa ser mais que "se". Não pensem que estou infeliz. Só estou sofrendo, é diferente. Jamais fui infeliz, sempre tive razões para louvar, mas essa é a primeira vez na minha vida em que choro sem a culpa pelos tantos em situações piores. (A gente se fala. Amo a existência de todos vocês).

É, como se vê, a dor da mãe pela perda que se fará presente por todos os dias de sua vida. Gostaria de convencê-la de que não falhou como mãe – as mães não mandam nos destinos dos filhos, estes também trazem de origem o livre-arbítrio.

E eu, humilde poeta, escriba menor desta província central, louvo-os com amor, Madiba e Clara!

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