Culpa minha, sim!
Luiz de Aquino
Meus dias, minhas horas, andam a mil. Preciso de alguns dias com trinta e seis horas, ao menos, porque está difícil cuidar das obrigações e dos encargos, dos deveres e prazeres. Edição de livro novo, revisões, correspondência, telefones, e-mails, filas, trânsito, família, amigos, instituições e entidades, viagens... Sobreviver!
Quando deixamos tanta coisa acumular, corremos o risco de deixar de fazer muita coisa e, o que é pior, fazer mal algumas que exigem maior proximidade da perfeição, já que esta é utópica, impossível, inalcançável. Mas isso de se ser humano é complicado: não abrimos mão do sol, das primeiras gotas de chuva, das flores que desabrocham, da Primavera recém-chegada... Gosto tanto de Primavera que não me permito (d)escrevê-la em minúscula.
A imperfeição fica por conta de algumas falhas. Ou trocas. Letras trocadas, num texto, para o escriba, é o mesmo que a cozinheira pôr sal no café. Troquei de computador há quase um ano, e o Mac não é tão eficaz quanto o Microsoft quando se trata de texto (ou, pelo menos, textos em Português). No antigo, eu tinha ao meu dispor dicionários enciclopédicos e corretores ortográficos, o que dava um certo conforto; agora, tenho de me redobrar em atenção. Por exemplo, nesta máquina é difícil escrever “não” e “além”: preciso insistir, ou as palavras saem sem acento. Embora eu avise que escrevo em Português do Brasil, meu computador teima em corrigir diretor para director. Ou transforma Antônio em António.
Ainda assim, ficam os meus erros. Certa vez, troquei aja por haja e só me dei conta do erro quando o material saiu publicado. Fiquei muito triste e constrangido, envergonhado mesmo. Semana passada, ao enviar a crônica de domingo ao DM, apareceu um Ouve em lugar de Houve, e dei-me conta de que o computador havia engolido o H quando eu fazia a revisão mecânica. O pior foi que, ao anexar o texto ao e-mail, escolhi o texto original e penitenciei-me pelo erro na publicação. Felizmente, pude corrigi-lo no blog e em outras edições eletrônicas.
Logo eu, que vivo alertando colegas jornalistas e professores para errinhos triviais... Os que fazem locuções ao vivo são as principais vítimas de si mesmos. Recentemente, uma colega na tevê esclarecia uma matéria, falando do afogamento de uma moça no Rio Meia-Ponte, em Goiânia. Ao referir-se às águas profundas, e tentando ser o mais clara possível ante espectadores menos escolarizados, ela disse, textualmente: “A parte subterrânea da água...”. Lembrei-me de um governador que, há trinta anos, proferiu essa frase: “Estamos sobrevoando de avião as cidades submersas debaixo d’água”.
Como se vê, somos algozes de nós mesmos. E eu, que me ponho à vontade para despertar nos amigos a consciência do erro, exerço essa prática em mim próprio. Apressado e inquieto, ansioso ou, ainda, precipitado, visto a carapuça e me ridicularizo pelas gafes gráficas, erros ortográficos, concordâncias inadequadas ou regências rebeldes.
Fazer o quê mesmo? Vir a público, aos leitores como que em segredo, à página democrática do jornal para dizer que sinto muito, para pedir-lhes que me perdoem, se puderem. Prometo não errar mais, contudo eu próprio duvido do meu compromisso. Digo apenas, pois, que é um propósito, uma profissão de fé.
Quando errar outra vez, voltarei novamente para pedir novas desculpas.
Luiz de Aquino (poetaluizdeaquino@gmail.com) é jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras.