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segunda-feira, maio 31, 2021

Querência

 

Querência

 

Esta noite é de sonhos
e vou sonhar
porque o sonho é tempero
deste jeito de te ver.

 

Sonhando, busco roubar
teus momentos
pra inteirar minhas tardes.


Esta noite eu te tenho 
nos braços, nos lábios 
como te tenho 
e te quero ter.

 

Sonhando-te minha,
como nos temos,
encontro a certeza
de sermos assim
ainda amanhã.

 

*   *   *

Poeta Luiz de Aquino 

domingo, maio 30, 2021

Quase poesia

 
Quase poesia

 

Quero a flor, o queijo,
e não dispenso o beijo; quero,
também, o canto encantado
do quero-quero...

Aqui, ali, lá...
acolá, quem sabe?
Seja este ou aquele o canto
desde que se cante
bastante
do sol à soleira, ao batente
o canto insistente
que faça da gente
seres cantantes.

 

Ofertas, apenas.
E que te envolvam feito um manto
e a alma, aquecida; ponham-te
os sonhos dos encontros
imaginados.


*   *   * 
Poeta Luiz de Aquino


sábado, maio 29, 2021

Viver no campo

Viver no campo


  

Campo de trigo, campo de alfazema,

campo coberto de grama, 

ornado de álamos e plátano, 

campo de hortênsias e carvalho...

 

Ah, não é nosso o campo!

Vivamos estes de plantas atlânticas

ou flores de cerrado, roxas quaresmas 

e vários ipês. 

 


Às tardes, ao fim, anunciando a noite

de luar ou poeira de vaga-lumes

e ainda estrelas em profusão, 

a Vésper dirá silêncios

que teus olhos traduzirão: 

Eu te amo

e dispenso o fulgor

da vindoura alvorada.

 

             - Um beijo meu...

 

*   *   *
Poeta Luiz de Aquino


 


sexta-feira, maio 28, 2021

Feito copo

 

Feito copo

 

Tua boca me chega feito um copo
d’água fria ante quem
vem do sol e das areias...

Pede contato, toque e sorver, 
mas não me apavora:
são lábios de néctar a matar-me a sede;

toque de mãos deslizando em braços e corpo,
gosto de toque que arrepia
e faz tremer.

Quero esse toque de calor e hormônios.
Teus lábios nos meus e minhas mãos
a devastar-te corpo e pele.

 

Quero beijos e arrepio de pele,
e o mel das entranhas, o cheiro de sexo
e a busca célebre do gozo total.

Quero o eriçar dos mamilos,
dos pelos a rescender o olor
do mel mais íntimo.

Quero brindar em essência e delícias
no silêncio da noite
e na pureza dos sentidos


*   *   *
Poeta Luiz de Aquino


 

quinta-feira, maio 27, 2021

Esperança solidão

Página do livro De mãos dadas com a Lua,
1984. Ilustração de Dineia Dutra

Esperança solidão



Este gosto triste da tua ausência 
discorda do instante que espero surgir 
no silêncio do reencontro 
na noite 
ainda que estejamos 
no mesmo mudismo 
da insensatez 
que haveremos de esquecer 
quando amanhecer.


Será no silêncio do reencontro 
que hei de sorrir 
enquanto te amar.


*   *   *

Poeta Luiz de Aquino

quarta-feira, maio 26, 2021

Lembrando Sampa

 


Lembrando Sampa

 

Mar de luzes. E o voo se alonga
em amplos círculos.
Chão de renda de luzes azuis.
Linhas longas de amarelo-ouro,
arabescos de luzes se a orogênese assim impôs
ao traçado das ruas.

No alto do Jaraguá, vaga-lumes de antenados sinais
de visuais e sons.

No chão, o cinza do dia, o cinza do céu, o cinza
de argamassa e concreto
e dureza eterna de infindáveis esquinas.
Que só de esquinas e altipisos
se faz a cidade
e de elevadas vias no emaranhado de edifícios.

Milhões de janelas a vislumbrar paisagens
de incontáveis outras também janelas.

Sopra um vento de elevar fumaça
mas não desfaz o teto cinza.
Nas ruas, passadas seguras de destinos certos
de um futuro de dúvidas neoliberais.
Os rostos são caras de todo um mundo
e a língua tem o acento dos sobrenomes
itálicos, nipônicos, hebraicos,
polacos, hispânicos, iônicos,
satânicos, irônicos...


        No Planalto, meu canto em ritmo
        de catira
        arremata as prosas rápidas.
        

E recomponho o verso
na lentidão sertaneja,
na saudade goiana.

*   *   *

Poeta Luiz de Aquino

terça-feira, maio 25, 2021

Sputnik

 


Sputnik

 

Era outubro e eu, doze anos.
Uma rádio em Londres
ouvira sons de bip bip bip bip bip
e uma palavra seria
em dias
incorporada a todas as línguas
– Sputnik.

Ao meu lado, meninos e meninas
de impúberes: cada um
numa carteira de escola:
dois corpos não estavam jamais
no mesmo espaço.
Tinha saudades de casa,
a casa paterna lá longe, em Goiás.

Goiás, meu espaço, tão grande e inteiro
                                                      [em 1957!
E Caldas Novas, pequena e esquecida
num sul minúsculo.

Longínquo Goiás ainda individido.

Caldas Novas que não sabia – talvez! –
do Sputnik e era ainda
a vida inteira da minha infância:
seis ruas de cascalho e regos


(por quê, em poesia, exigem-me regato,
se eram regos os miúdos córregos da minha
                                                          [terra?).

O Sputnik bipava no espaço infinito e eu
disputava com Marlene
– menina sardenta, paixão estreante –
a mesma carteira na escola
de subúrbio no Rio, Capital!


 *   *   *
Poeta Luiz de Aquino


No tempo do Sputinik

segunda-feira, maio 24, 2021

O anjo da zona norte

 


O anjo da zona norte

Para Maria Rosa Ferraz Dias, mestra e anjo. 



Alguém se agita diferente
dos mortais comuns
em Jaçanã.

Em Guarulhos, assegura à prole
carinho, fé e futuro;
em Jaçanã, abençoa gerações
beijando-as de saber.

Mestra de números:
soma, imagina, multiplica
encantos
e
divide, combate e subtrai
tristezas.

Não voa pela mágica
de pirlimpimpim: esquiva-se
no trânsito louco das ruas, mas viaja de fato
em ondas e bytes,
cria elos de amor,
aproxima pessoas e lugares.

Vai além da matemática:
domina a geografia das distâncias,
o impossível do cronos.

Beijada por um anjo
tem a graça de se saber feliz:
faz-se fada no encontro
que parecia impossível.

*   *   *
Poeta Luiz de Aquino



 

 

domingo, maio 23, 2021

Magos e vestais

 


Magos e vestais

 

Olhares de acender desejos e
                                  [confundir futuros:
anos verdes de sonhos longos,
peles jovens, suaves gestos,
testosterona a explodir razões,
estrogênio a amansar vulcões.

Nos instantes dos vinte anos
somos todos vestais e magos.

Nos instantes dos vinte anos
abreviamos a vida tal qual nos resta
com se o tempo futuro coubesse todo
no verdor de agora.

Se jovens, congelamos o tempo;
maduros, revivemos esperanças.

 *   *   *

Poeta Luiz de Aquino


Aos vinte e poucos anos

sábado, maio 22, 2021

Nós, entre nós

 Nós, entre nós

 



Eu ponho teus olhos 
nos meus sonhos e crio coragem 
para impor uma rosa 
às tuas mãos.

 

Eu ponho teu futuro
nos meus sonhos e crio
a esperança inteira
da tua existência
no cotidiano.

 

Eu ponho tuas mãos
entre as minhas e nem as vês
na carícia dos olhos meus
nos teus olhos:
não percebes
que começamos assim
a nos amar de verdade.


*   *   *
Poeta Luiz de Aquino





sexta-feira, maio 21, 2021

Flash

 


Flash

 

É assim, como algo que nos invade
a imagem de cor, forma e
(ninguém sabe, só nós) calor!

São paisagens, cenas,
rostos moços, festivos e alegres,
tristes, pequenos, serenos, mudos
e gritantes, às vezes,
feito uma linguagem sem escrita
nem som
mas capaz de informar
ao mais profundo do que nos é íntimo.

Clicar é mágico
por eternizar um instante,
luz!

Memória, apenas. Mas para sempre.

 

*   *   * 
Poeta Luiz de Aquino


quinta-feira, maio 20, 2021

Momento após

Momento após

 


Sabe?, eu posso mudar:
não mando mais flores,
não falo de amores,
não levo café à cama
nem mesmo para quem me ama.

 

Mas, eu sei:
alguma coisa em mim não muda.

 

Não sei
não te querer.

*    *    *
Poeta Luiz de Aquino


 

quarta-feira, maio 19, 2021

Esquina

Esquina

 

Hoje, o terreno arrasado
esquece a casa dos primórdios.
O sobrado era solene como avós.

Bicho homem tem pressa de lucros
e tomba antes
que o tombe o Iphan.

Amei alguém neste espaço
a três metros do rés do chão
agora cru.


Poeta Luiz de Aquino

*   *   *

terça-feira, maio 18, 2021

Ao céu de tarde e estrelas

 

       Ao céu de tarde
    e estrelas



Qualquer hora, quando vir teus olhos, ah!,
vou me deliciar de te ouvir
e tomar tuas mãos.


Viajarei em mim a te render
loas de sol e sereno
e beijar um céu de estrelas nossas.


Vamos selecionar lugares
em ar de zen
para encontros de amor.


Haverá boa música. E boa conversa
e boas mãos de carinho e lábios
de lamber e contar.


E língua de sussurrar confidências

e fazer beijos muitos,
safados e úmidos.


Ah!, estrela de mim
e do Trópico! Eu te quero
e vou beijar teus pés. 

*   *   *

Poeta Luiz de Aquino


segunda-feira, maio 17, 2021

Namorantes

 

Namorantes


A busca de espaços
na pele guia-se por ondas
de cheiro e calor.

Beijo pés sensuais,
sensíveis demais,
e sigo a estrada tépida:

carícias de beijos e mãos
percorrem pernas acima,
perdem-se no vão das coxas.

No vértice de Vênus
e pelos mornos,
abraço nádegas.

E as mãos, então, abrem-se
em asas lepidópteras,
atingem seios.

Ficante em meio corpo
ao sul, guardo saudades
dos beijos norte. 

*   *   *
Poeta Luiz de Aquino


domingo, maio 16, 2021

Rés do chão, ao olhar

 


Rés do chão, ao olhar

.

O táxi, a chuva, madrugada,
o tempo, pessoas e a vontade.
Havia um quê de estranho.


É sempre assim a vez primeira,
um estar insistente e tenso
– tensão, tesão e medo.


Hormônios em êxtase e ávidos,
peles e pelos ostensivos, nus.
Bocas sedentas, secas, quentes.


A noite anda, e aviva a chuva.
Há o ar de espera e ansiedade...
A mão diz adeus, a boca assente.


A pele, não; espera. E acerta
um dia além, futuro e breve:
o mérito é mútuo.

Chiado de rodas no asfalto,
longe e líneo. Olhar frustrado
e baixo: é linha de terra. 

*   *   *
Poeta Luiz de Aquino


sábado, maio 15, 2021

Mar da Praia Grande

 Diálogo de liberdade à beira do

mar da Praia Grande



 
 

— Já viu, minha prima,
que monotonia isso de o mar se quebrar?

— Feito a vida, pique e repique.

— Ondas que veem, ondas que vão!...

— Eis Itacoatiara: verde e
mar, sol e verão.

— Céu azul, pedra e tesão.
E eu pensando em namorar!

— É... Namorar namorei
por todas as praias
de Araribóia!


*   *   *


Poeta Luiz de Aquino

 


 

sexta-feira, maio 14, 2021

Carta-poema à prima-paixão

 

Carta-poema à prima-paixão

 



Ver o mar,
ver o verde. O beijo da onda,
a areia de Itacoatiara
e a língua do mar a beijar-nos
entre as pedras de Itacoatiara.

 

O céu:
o azul-fumaça
e plúmbeos cúmulos-nimbos
em cafunés nos penedos
de Itacoatiara.

 

Iná:

O róseo da pele,
lembrar o plácido de olhares
e palavras, a carícia presente.
Vontade de ficar e sonhar passado:
viver outra vez
a prima-paixão.


*   *   *
Poeta Luiz de Aquino

Em 1957...
 

quinta-feira, maio 13, 2021

Pés. Pele. Cor



Pés. Pele. Cor



Sensíveis os pés. Cores, não: 
há beleza no que se diz branco,
há beleza no que se tem por negro.


                    Pés são estruturas, e pele, e 
                    unhas,
                    e sentidos, 
                    harmonia e reação.


                                Pés: tato e tesão.
                       

*   *   *
Poeta Luiz de Aquino


 

quarta-feira, maio 12, 2021

Requiescat in pace

 


Requiescat in pace

 

Faço fotos, faço versos,
faço falas infundadas ...

Sou bufão, bruto, insensato,
faço rir e faço (fácil)
falsas valsas, falas farsas,
serenatas de encantar
sereia incauta.

Passam dias, meses, horas
– tempo de sempre
e igual,
que entendo por banal
medir o tempo, dar-lhe nomes;
mas o tempo, esse, este,
o que se mede em mim
desde o nascer,
o tempo virá ao fim.

E o dia de choro, de dor
de esparsas lembranças e amargo desdém,
trará gente do passado,
pássaros de arribação,
cantantes aves canárias,
laboriosos joões-de-barro,
tristes sóbrios urubus.

Mas virão chorosas mulheres
para o último olhar de saudade.

                  Virão todas as que me viram nu.

 

*   *   *

Poeta Luiz de Aquino

terça-feira, maio 11, 2021

Eu me estremeço

 

Eu me estremeço


 

Bem-vinda
a que chega enternecida.
Aguça meus olhos,
extrai-me ternura e
cega-me em lágrimas porque me sei
agora
pleno de ternura, ansioso de amar.

Perdoa, Poeta, não li seus versos
finais. Feito punhais,
aguçaram-me a têmpera
e senti-me vazio
da mão que ainda há pouco
me afagava.

  

*   *   *
Poeta Luiz de Aquino