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segunda-feira, dezembro 23, 2019

Um pacote de sacanagens


Um pacote de sacanagens



As pessoas que temos em contato nas mídias sociais, essas que todos os dias nos enviam algumas imagens e até mesmo vídeos a título de bons-dias e boas-noites fazem a festa, literalmente, em ocasiões como a Páscoa, o Dia das Mães e o dos Pais e, sobretudo, no Natal. O efeito é que o tempo que gastávamos (antigamente) para enviar cartões de Boas-Festas (personalizados) é agora multiplicado para que limpemos os “caches” de computadores, tablets e celulares. Mas não nos queixemos: triste mesmo é sentir-se só.

A solidão malfazeja (sim, porque muitas vezes precisamos, nós próprios, de estarmos conosco, apenas) conduz à depressão, ao pânico e, claro, à baixa autoestima. Ou se tem habilidade para relacionar-se bem com os próximos ou se gasta muito – compra-se, é o termo – para angariar companhias sem os sentimentos de afeto, respeito ou amor-amizade.

Essa capacidade, hoje, é o que se tem por inteligência emocional, mas dizíamos jogo-de-cintura e os mais refinados exibiam-se com a expressão francesa savoir-faire.

O Brasil dos parvos assumidos elegeu a desqualificação. E o fato repetiu-se no varejo dos Estados. O presidente da República não tem nada de savoir-faire – nem de know-how. Curiosamente, as duas expressões se traduzem da mesma maneira, saber (como) fazer, mas sempre aplicávamos o francês para o modo civilizado de contornar situações, e o inglês para o conhecimento técnico.

Lembro-me do mise en scène de Fernando Collor ao final das tardes descendo a rampa. Ele fazia aquele forfait com certo glamour e criou-se um novo status em Brasília: “Fui convidado para descer a rampa com o presidente”. Mas as saídas de Jair para o trabalho, nas manhãs, quando ele faz que atende jornalistas sob a proteção de seguidores fanáticos (aqueles que cercam os poderosos como as moscas em torno do doce... ou das fezes) nada têm de glamour, mas sim de – agora é hora de uma expressão nacional nada chique – barraco. Muito barraco!

Na semana passada, sob o calor das acusações graves que ameaçam o seu filho Zero-Um, senador pelo Estado do Rio, ele perdeu as estribeiras. Não foi surpresa alguma. Surpresa foi a sua fala de arrependido (disse ele) no dia seguinte. Chamou esse jornalista de homossexual por ter indagado o presidente quanto às suspeitas sobre o senador Flávio, fez referências chulas aos pais de outro jornalista que lhe perguntou sobre o empréstimo de 40 mil reais ao famoso Fabrício Queiroz - inconveniente  para o clã dos Bolsonaro).

Em Goiás, a coisa vai muito mal, também. Não basta ao governador fazer coro às maldades e ignorâncias de seu líder, o presidente – ele comete também das suas. Por exemplo, uma de suas primeiras medidas foi mandar desligar os radares para acabar com a “indústria de multas” – a Justiça Federal suspendeu medida idêntica de Bolsonaro, mas a de Goiás se faz de mouca, já que é cega.

Emenda Constitucional para aniquilar com a verba vinculada da Educação teve apoio maciço dos deputados antipovo que, em maioria arrasadora, constitui a Assembleia Legislativa. Não bastasse isso, o presidente do Legislativo, atendendo à orientação do Palácio Pedro Ludovico, ajeitou o calendário legislativo para satisfazer o governador Caiado. Deputado eleito pela legenda que deveria representar a força da oposição não se satisfez em votar (como vem votando desde o começo) com a vontade do Executivo, mas teve o capricho de tecer loas ao discurso do emedebista que é o líder do governo (DEM) na Casa de Leis.

O pacote de maldades ainda não estava pronto. O ano legislativo só se encerraria com o fim das licenças-prêmios e dos quinquênios do funcionalismo. E, para fechar toda a sacanagem com lacre de chumbo, convidou os amigos deputados para um banquete em Palácio e retardou do dia 20 para o 23 (e quase ninguém confia) o pagamento do salário e da segunda parcela do 13° salário ao funcionalismo.

Mais, ainda: de imediato, lançou uma campanha publicitária para justificar os cortes, tentando jogar a população contra o funcionalismo estadual.

Quero encerrar sem mais adjetivos. Mas não consigo conter um grito, apenas:

– Essa culpa eu não carrego!


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Luiz de Aquino é jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras.

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