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sábado, outubro 31, 2009

O mico na crítica

O mico na crítica


Luiz de Aquino


Esta semana, passeei meu espírito por um Brasil especial, o Brasil das artes. O Brasil das bandas do interior e das escolas fundamentais e médias, com os tradicionais uniformes e a formação militar (as bandas, por algumas décadas, restringiram-se ao ambiente dos quartéis militares).

Em 1967, um moço mal entrado em sua faixa dos vinte anos, cantou num festival: “Estava à toa na vida, o meu amor me chamou / pra ver a banda passar, cantando coisas de amor”. Esses versos, acasalados com a melodia num arranjo de metais e percussão, reconduziu a nação brasileira às bandas que, atualmente, tentam (e conseguem, felizmente) ressuscitar pelo Brasil afora. Mas “A Banda”, quando apareceu, sofreu um comentário infeliz de um dos críticos que, na época, constituíam o júri do programa de Flávio Cavalcante. Mister Eco (era o pseudônimo do crítico musical) condenou a música, arrematando com a frase: “Banda não canta. Banda toca!”.

Como se vê, o crítico não aceitava a metáfora. Mas, apesar dele e de sua frase, o Brasil inteiro virou banda e cantou coisas de amor. Éramos uma imensa banda de quase noventa milhões de músicos naqueles anos finais da década em que tudo mudou. Mas existem críticos e Críticos. E separá-los é uma função “crítica” que, nós, os mortais menores, temos de fazer, tornando-nos “críticos de críticos”.

Vejam o que contou o jornalista, professor de Literatura e cronista exemplar Sinésio Dioliveira:

“Outro dia li em um site as críticas de alguém sobre o filme “O curioso caso de Benjamin Button”, dirigido por David Fincher e que tem o ator Brad Pitt vivendo o papel de Benjamim. Tal filme é baseado num conto escrito em 1922 por F. Scott Fitzgerald. A mutamba do crítico comeu feio na parte do nascimento do protagonista da história: Benjamin, que nasceu velho, já com 80 anos de idade. Para esse alguém, “o nascimento fugiu da verossimilhança” 
(da crônica “Filme e livro possuem belezas distintas”, no DM, quinta-feira, 29 de outubro de 2009).

Curiosamente, tanto Mister Eco (em 1967) quanto esse “alguém” que Sinésio citou são pessoas que vivem disso, de criticar. É sua profissão, ou, ao menos, seu ofício diletante (e geralmente somos menos imperfeitos nos nossos ofícios diletantes do que no desempenho das nossas profissões). Alguns desses críticos são professores em salas de aula, ensinando errado.

Todos somos alvos fáceis da crítica. Basta-nos atuar na expor ideias e opiniões para, de imediato, sermos avaliados. Eu, que sou leitor há sessenta anos, (aprendi a ler aos quatro anos e nunca mais parei), seleciono, dentre o que leio, o que me agrada, o que me ensina e o me dá prazer.

Nunca procurei Cervantes, Camões, Castro Alves, Machado, Lins do Rego, Jorge Amado, Moacir Sclyar, Bernardo Élis, Lya Luft, Adélia Prato, Gilberto Mendonça Teles, Afonso Félix, Brasigóis Felício, Maria Helena Chein, Heleno Godoy, Décio Filho ou seja lá quem for dentre os meus preferidos para dizer-lhes o que escrever. Apenas os leio.

Mas há quem me procure para “me orientar”.

Gente, isso ofende. Dói, até! Em lugar de dizer-me o que escrever, essas pessoas deviam, sim, escrever sobre o que gostam. Estranhamente, são as pessoas que querem ler sobre as flores, o amor de olhares, a doçura da resignação religiosa. Rejeitam em mim o cidadão comum, o homem que cobra dos poderes e das instituições o procedimento que atenda àquilo de que a sociedade carece.

Fico mais para Geraldo Vandré. Eu falo das flores, mas mostro o canhão.


Luiz de Aquino é jornalista e escritor (poetaluizdeaquino@gmail.com), membro da Academia Goiana de Letras.

14 comentários:

zinah disse...

Luis, vc sempre me emocionando com suas crônicas.... essa é demais..... bons tempos aqueles!!! não sou saudosista, mas há coisas que nos emocionam.... ouvir essa música é recordar.... "......estava a toa na rua/ ouvir banda passar falando coisas de amor"... parabéns!!!

zinah disse...

Luis, vc sempre me emocionando com suas crônicas.... essa é demais..... bons tempos aqueles!!! não sou saudosista, mas há coisas que nos emocionam.... ouvir essa música é recordar.... "estava a toa na rua.... ouvir a banda passar, tocando coisas de amor"... Parabéns!

Marluci Costa disse...

MARAVILHA! PARABÉNS !
(Sobre a marca de 60.000 visitas)

Marluci

José Carlos Barbosa disse...

Voce merece Luiz (e eu sei muito bem)
abraços do zecarlos

Luiz de Aquino disse...

Obrigado, Marluci!
Obrigado, ZéCarlos!

Graças a vocês, que me toleram, rsrsrsrs.

Eric Ponty disse...

Carisimo Luiz de Aquino,

Parabéns, vc é um cronista, obrigado por sua deferência a minha pessoa. Não sou nenhum charlatão das letras. Traduzi um Valéry (inédito) em português para que não paire dúvidas do meu fazer literário.

Com apreço,

Eric Ponty

Luiz de Aquino disse...

Ah, meu amigo Eric, nunca duvidei de seu talento e de sua capacidade como escritor! Não sei o que o levou a essa defensiva, mas seu trabalho responde pela sua própria dignidade!
Abraços fraternos e saudosos do

Luiz

Luiz de Aquino disse...

Zinah,

Obrigado! Espero corresponder sempre à expectativa dos leitores e estou sempre aberto à troca de opiniões.

Luiz

Conceição Bentes disse...

Sua cronica é matavilhosa, da vontade de ir atras do tempo e parabens pela marca das 60.000 visitas

bjos

Ceição Bentes

Unknown disse...

LUIZ VC ACABOU DE GANHAR MAIS UMA FÃ , FAREI VISITAS DIARIAS AO SEU BLOG .
ABRAÇO
BOM RESTINHO DE FERIADOOOOO
KATIA

KATIA disse...

LUIZ FAREI VISITAS AO SEU BLOG SEMPRE , VOCE GANHOU MAIS UMA FÃ .
BEIJOS

Anônimo disse...

Luiz,
Após a leitura de seus textos pude perceber que escreves sobre uma multiplicidade de temas com muita objetividade. A visita foi gratificante.
Quanto a referência ao vídeo com a música "Herança", também me emocionei. É lindo...

Luiz, te deixo um grande abraço e voltarei sempre!

R disse...

Parabéns pelo blog, tem um belo template e ótimos textos...

Sou acadêmico de Letras-Inglês na UFMT e há 1 ano e "escrevo" há 2. Tenho um blog com alguns textos postados e tenho recebido cascudos de incentivo para divulgar o meu espaço, então, venho humildemente à tua morada deixar um singelo link para o meu blogzinho:

http://turbilhaopsicodelico.blogspot.com

Espero sua visita, e também espero que aprecie. Se não gostar, solte o verbo. Quem escreve dá a cara aos tapas, socos, pontapés, e quem não apanha não evolui, e não tenho medo nenhum de ficar com olho(s) rôxo(s).

Obrigado.

Fabio Rocha disse...

Crítica em geral é um tema complicado mesmo... :) Abração