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sábado, maio 08, 2010

Mães são árvores...

Respeito é bom, Venerando merece!

Venerando entrega-me um diploma, pela Associação Goiana de Imprensa (1991)


* * *


Quero falar de Dona Custodia, a mãe de hoje.

É que, ao longo de vinte e seis anos, Venerando de Freitas Borges ocupou uma importante cadeira numa instituição representativa classista de Goiás. Claro deve ficar que a cadeira, no caso, não é o objeto de assento, apenas, mas o símbolo, ou seja, uma metáfora para o cargo. Digo isso porque vou me referir ao seu atual sucessor e o jovem poderá argumentar que a cadeira é outra, já que os móveis foram trocados há algum tempo (ou alguma bobagem dessa natureza).


Venerando tinha vinte e seis anos de idade (os números aqui citados repetem-se por uma feliz coincidência), mereceu um convite ímpar do construtor de Goiânia, Pedro Ludovico Teixeira: queria-o prefeito da nova capital de Goiás. Era 1937 e o jovem professor e contador já prestara um serviço relevante ao Estado: a auditoria para encerramento (ou seja lá que título se dê ao fato) do município de Campinas. Ele seria o pioneiro no cargo. Consta que, ao fim da audiência, em tom jocoso, Pedro recomendou-lhe: “Não roube muito”. Ato contínuo, Venerando, peremptório, desistiu do cargo. Pedro esclareceu tratar-se de mera brincadeira (difícil de se crer, por se tratar de Pedro...).


Aqueles primeiros passos na vida pública, destacando-o como o primeiro prefeito de Goiânia, ofuscam as inúmeras outras funções futuras, de importância ainda maior, nas décadas seguintes. Sucedeu Pedro Ludovico na Academia Goiana de Letras, na cadeira hoje ocupada pelo poeta Kleber Adorno.Destacou-se no mundo maçônico nacional e na vida socialda cidade e do Estado, teve cargos federais de realce. Sua vida motiva um livro, a sua biografia ansiosamente aguardada pelos amantes da História e pelos admiradores do velho mestre. Ainda em vida, ele viu seu nome ser colocado em placas em pelo menos três vias da cidade que governou.


Esse último cargo, na tal entidade, bem o referenda. Os idealizadores do livro procuraram o novel diretor da famosa instituição (omito o nome por respeitá-la por demais; já o jovem diretor atual há de convencer-me a respeitá-lo nessa cadeira). Demonstrando ignorar, ou, pior ainda, não reconhecer nem respeitar a vida de seu antecessor, o moço disse, repetidas vezes, não ver qualquer justificativa para que a entidade custeie a honraria.


O pobre moço não percebe que, ao menosprezar Venerando de Freitas Borges, assina a confissão de não ver importância no cargo que ocupa. E se assim pensa, penso eu que ele não merece tal lugar. Que se passe o pires, ou melhor, um chapéu de grande copa para que nós, os admiradores de Venerando, o enchamos com nossas notas de dez reais. Só que, com isso, a tal instituição, sim, é que ficará envergonhada (e ela não merece, creiam!).


Neste ponto da minha escrita, liga-me uma leitora. Quer saber se falarei de mães neste segundo domingo de maio. Não, disse-lhe eu, estou justamente falando de um homem importante. Ela faz que se rende, mas noto-lhe na voz a decepção. Esclareço-lhe que, ao enfatizar a vida de um homem como Venerando, obviamente reconhecemos o peso da autoridade e da doçura de uma mãe que soube criar e educar.


A mãe do homem que hoje ocupa aquela cadeira não teve a mesma ventura. Mas não lhe atribuo falha; prefiro imaginar que ela tentou fazer do filho alguém igualmente expressivo, mas outros fatores o conduziram a um desvio de trajeto de vida. Ou o erro, neste caso, fica por conta de quem o convidou, indicou ou elegeu para a função que, com tanta dignidade e honradez, foi marcada pela presença indelével de Venerando, o filho de Dona Custodia Carolina Borges.




Estátua de Venerando diante do Paço
Municipal, em Goiânia


* * *


Luiz de Aquino é escritor brasileiro, nascido em Caldas
Novas, vivente em Goiânia
e cidadão
honorário de
Pirenópolis (tudo em Goiás).

E-mail: poetaluizdeaquino@gmail.com.

6 comentários:

Irinéa MRibeiro disse...

Obrigada por essas palavras...
enterneceram essa mãe aqui!

Marília Núbile disse...

Belíssima crônica! Quanta maturidade literária , sem áquelas coisas de "avental todo sujo de ovo." Parabéns! E um fortíssimo abraço.

Duda Lima disse...

Poeta, as palavras colocadas uma ao lado das outra soam como o contiunum das águas que caem em uma cachoeria. Basta um olhar...ficamos ali parados. A impressão é de que as palavras, como as águas da cachoeira, aquecem, lubrificam, limpam por fora e por dentro. É um alívio. Uma mágica doce e permanente, algo como quero mais. Você é o mago das palavras. Creia, creio.... sinceramente.

Um grande abraço
Saudações a todas as mães deste planeta.

Duda e Veri

Mara Narciso disse...

Muitas pessoas não são dignas das mães que tiveram e nem dos cargos que ocupam. Encontrou mais uma briga desta vez. Os prós e os contras se manifestarão, e os retornos mostrarão que você não fala ao léu. Mas o livro sobre Venerando sairá. E quem sabe a entidade acabará arcando com os custos?

Stella Rincon disse...

Que cacetada, Luiz. Amei sua audácia.
Beijos
Stella

Sueli Soares disse...

Luiz

Minha esperença é que, quando tiver que partir da Terra, tenha conhecido pelo menos mais algumas mães iguais a sua homenageada. Poucos como vc são capazes de tamanha sensibilidade.