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sábado, agosto 04, 2012

Ir e vir; e aprender?


Ir e vir; e aprender?


Pronto! Por cerca de uma semana, embasados em razões legítimas, os caminhoneiros brasileiros pararam nas estradas com seus máquinas poderosas. E o governo nacional resolveu negociar, e negociou sem falsetas, conseguindo o fim da greve.

Há mais de cem dias os setenta mil – sim: 70.000 – professores das universidades federais brasileiras estão em greve por razões também justas, mas o governo do Brasil faz de conta que não sabe disso.

Agentes da Vigilância Sanitária nacional também estão parados – a epidemia de dengue que se expanda e o resto que se exploda! Fiscais da Receita Federal também cruzaram os braços; a mulher presidente da República – essa que violenta a gramática ao assinar diploma legal forçando a feminilização (?) de um substantivo comum de dois gêneros – encontra uma solução “sábia”: convocar agentes estaduais e municipais do mesmo segmento para substituir os federais em greve. Mas não combinou isso com os grevistas e estes retém algo de trivial – as senhas que possibilitam o funcionamento de seus sistemas de trabalho.

Os grevistas estão com as chaves do cofre, do almoxarifado, da cozinha e até do banheiro, senhora presidente! Tal como os caminhoneiros tinham as cancelas das rodovias. Os professores... Ah, professores são outra história! A senhora sabe que eles nada valem, que se contentam com muito pouco, que não trancam o sistema de arrecadação, não tolhem o abastecimento, não deixam defuntos na rua por longas horas, na madrugada ou sob o sol.

Professores, senhora presidente, servem apenas para formar cidadãos, arejar mentes, oferecer mão de obra especializada; e quem precisa disso? Cidadãos arejados são péssimos eleitores, acabam votando de acordo com suas convicções bem formadas e isso não fortalece seu governo nem sua sucessão. Mão de obra especializada o governo manda buscar lá-fora, sai mais barato do que as situações que os cidadãos bem-formados (e bem informados) hão de causar para o sistema.

Há uns poucos anos, meu pai, já na casa dos 85, com a saúde delicada a exigir sempre algum cuidado, precisou vir de Caldas Novas para tratamento. Fui buscá-lo, de carro. Não demorei mais que uns trinta minutos em sua casa, retornando com urgência a Goiânia. Mas ao alcançar a estrada, no trecho entre a cidade e o posto da PM Rodoviária, uma patrulha de soldados do destacamento ou quartel de Caldas Novas dava segurança a um grupo de fazendeiros que colocara máquinas agrícolas na pista. Um sargento explicou-me que eu não poderia passar, pois os produtores rurais faziam um protesto.

Poxa! E o direito de ir-e-vir, que é garantido na Constituição federal, como fica? E o sargento: “Meu senhor, estou cumprindo ordens”. Um fazendeiro aproximou-se, fortalecendo a autoridade do sargento e estufando o peito: “Este movimento é liderado pelo deputado Fulano”. Era, sim. O jeito foi voltar, seguir para Ipameri, numa volta de cem quilômetros e noventa minutos a mais. Nem mesmo a idade e o aspecto doentio de meu pai sensibilizou o fazendeiro – gente de Caldas Novas, conhecido velho – e o sargento.
Como se vê, governos têm sempre pesos e medidas diferenciados. As universidades federais em greve, em todo o país, há mais de cem dias, são coisa inexpressiva. Os professores precisam fazer um pacto com os caminhoneiros, os lixeiros e o segmento policial encarregado de recolher mortos pelas ruas. Assim, talvez, a senhora presidente se sensibilize.


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4 comentários:

Sueli Soares disse...

Queria ver greve de jogadores de futebol, "cantores" sertanejos, profissionais do "séquiço" e outros... Talvez a "presidenta" se sensibilizasse!

Mara Narciso disse...

Quando nos sentimos injustiçados, é coisa sem conserto. Imagino como deve ter sido essa volta (dar a volta)numa viagem de volta levando um pai ancião e doente. Vejamos o lado positivo da resolução rápida da greve dos caminhoneiros: caso o Governo tenha aprendido,as próximas greves terão curta duração. Todas medidas com o mesmo relógio.E que assim seja.

Noemi JA disse...

Gostei da crônica, muito bem pensada......respondendo a sua pergunta: porque educação nesse país de "presidenta" é irrelevante.
Obrigada pela lembrança. Abraços

Mirian Oliveira disse...

Texto de fôlego, Luiz. Vou repassar para meus contatos. Um abraço direto de Brasília.