Esta crônica faz 10 anos!
Remexer velhos
papéis ou, neste caso, fuçar nos velhos arquivos do computador – prática boa
que me enleva porque, ao reler velhos textos, viajo no meu próprio passado e
recordo muita coisa. Aqui, cito pessoas queridas que mal tenho visto, ultimamente
– afinal, esta é uma crônica escrita em 17 de agosto de 2004 – há dez anos,
pois! E publicada logo após. Agora, é revivê-la! L.deA.
O que se diz
Comprei os dois livrinhos na rodoviária da Praça
Mauá (em frente ao cais do porto), disposto a lê-los na viagem (era 1962) a
Brasília, 24 horas dentro do ônibus. Os livros: “Criança diz cada uma” e
“Histórias de rir, de sentir, de pensar...”, ambos do mesmo autor, Pedro Bloch
– médico pediatra e fonoaudiologista; jornalista; dramaturgo... Um montão de
coisa, o Pedro Bloch; um desses a quem a gente nunca fica constrangido ao chamar,
solenemente, de Doutor (assim mesmo, com todas as letras e inicial maiúscula,
porque ele merece). Para um adolescente de hoje, talvez a leitura não faça
sentido; mas, para os do meu tempo, além de alguma atividade física como
futebol, praia, beira de córrego e similares, ler era mais importante que ver
tevê, que estudar e que ir ao cinema.
O mérito de Pedro Bloch ao montar esses livros foi o
de selecionar histórias que nos fazem rir, sentir e pensar. E isso é bom
demais, gente! No fundo, o que ouvimos é a maior parte do que nos alegra ou nos
entristece; do que nos ensina; do que, enfim, nos faz crescer. Gosto de uma
roda de conversa fiada – mas com pessoas inteligentes. E a inteligência, a
gente sabe, independe da escolaridade ou da pose do sujeito.
Por isso lamentei o fechamento do Bardella; por isso
gosto da Mercearia Serve Sul; por isso gosto de estar com pessoas de boas
tiradas (meu neto Luiz Henrique, meu filho Lucas; e, entre os adultos, Xinin, o
delegado Marcelinho Pão-e-Vinho e o irascível Jorge Braga (quando está de bom
humor), o Tuti, o Fleuri Viegas e muitos outros mais).
Dia desses, no Sítio da Pá Virada – que é como o
Braga chama seu “lotifúndio” em Bela
Vista – fiquei observando o anfitrião preguiçosamente posado na rede, olhando
para a silhueta de um pinheiro muito esguio. Aliás, lá tudo é esguio, a começar
do dono e do Mestre Cuca, o Beludo, passando ainda pelo cavalo apelidado de
Promota (gorda e forte, só a vaca Rachel). Perguntei se estava preocupado com
alguma coisa.
–
Estou, sim, respondeu o JB – tá vendo esse pinheiro? (sim, eu estava). É o
Sales. Pinheiro Sales. Assim que o sol parar de lamber as galhas dele eu tomo
minha cerveja; aprendi com o João Bênio que a gente não bebe durante o dia.
Ora,
ora... Achei muito apropriada a homenagem. Primeiro, pela aparência do
pinheiro, que lembra, efetivamente, seu xará o Sales; depois pelo que ele
significa, controlando o copo do irrequieto cartunista.
Outra
frase que me fez rir foi dita por uma amiga (não conto o nome por razões
óbvias). Ao cumprimentá-la, um amigo acariciou-lhe o rosto com ambas as mãos. A
moça, divorciada há dois anos, teve uma reação engraçada: ficou séria, com voz
temerosa e lhe pediu: “Faz assim não...”. O amigo, meio sem-graça, perguntou:
“Faz mal?”, e ela, súbita:
–
Não... Faz tempo.
Um comentário:
Havia na revista Manchete uma seção com este nome "Criança fala cada uma". A gente ria. Quanto ao seu amigo, é um piadista. Gente assim costuma ser muito querida, pois alegra e diverte o ambiente, no caso, com inteligência. Já a sua amiga, não é fácil estar só. Um carinho desperta, e depois, dormir só é um castigo.
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