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sábado, maio 12, 2018

Meia Ponte do Rosário - ou, simplesmente, Pirenópolis


Poema que compus à beleza de Pirenópolis. 



Esta cidade, rodeada de montanha...
(Crônica escrita em março de 2003. Republico-a por gostar e querer, de coração. L.deA.)


Foi Isócrates de Oliveira quem cantou: “Minha cidade é rodeada de montanha / tem um rio que a banha / murmurando sem parar”. Eu, quando cantei, evoquei “manhãs alegres / sol dourado junto ao rio / e um desafio a que acompanham violões”. 

Como não evocar manhãs de sol, tardes preguiçosas, noites alegres e madrugadas românticas nesta Meia-Ponte das minas de Nossa Senhora? A do Rosário, dos Brancos e dos Pretos. A dos Pretos ruiu sob os desgastes do tempo e a fraqueza das bolsas, minguadas de recursos naquele tempo dos anos de 1940, quando os bancos faliam ante a chamada moratória pecuária. 

A dos Brancos, incendiada sob o signo de Virgem naquele fatídico 5 de setembro de 2002. E a lembrança de mim, embriagado na Festa do Divino, procissão com banda-de-couro. Inerte e bêbado, quase impedi o retorno da procissão, deixado na soleira da porta lateral, do lado da Rua Direita. 

“Manhãs de festas / acordando Meia-Ponte / ao pé do monte seus antigos casarões”. Meu canto é de saudade; saudade de mim menino, ou de mim mais moço. O murmurante Rio das Almas... “Rio das Almas / vai levando as minhas mágoas / em meio às águas / a rolar, buscando norte”. 

Foi na Ramalhuda, verão em 1952, que me afoguei pela primeira vez. Um homem gordo tirou-me do poço fundo e seu sorriso me deixou confiante. Afoguei-me muitas vezes mais, porém sem medo. Em quantos poços, quantos copos me afoguei? 

Poção da ponte, de tanta memória! Música eterna das águas velozes... Meia-Lua, Pedreiras, Lajes... Tempo matado sem pressa em tardes e manhãs de férias. Vô Luiz, meu xará de Aquino Alves, maestro e seresteiro, não se banhava em casa – só nas águas do Rio das Almas. 

Meia-Ponte Pirenópolis de serenatas e cerveja muita, cachaça e lua de prata. Meu primeiro porre... acho que foi no Bar do China, irmão de Pérsio Forzani, no casarão que, caído, deu lugar à atual Casa de Justiça. 

Antes dos porres, os amores são a mais doce lembrança. Amores furtivos às margens do rio, amores inebriantes atrás das igrejas, ao sopé dos montes, no pico do Frota entre as antenas de tevê (o som da cidade, a cidade lá longe, o ar fresco da noite e a poesia emergente). 

Serenata de metais e cordas na noite serenada. Caju batizado na casa de Wilno. Alexandre, o maestro, era um menino que tocava na banda. Meu Vô Luiz tirava notas carinhosas de um trombone e eu volitava, rumo ao passado, para encontrar meu tio Ismael, o da clarinete, e Dito de Melani, o do pistom.  

“Ai, que saudade / de acordar ao som do pinho / cá no meu ninho / e sentir a lua cheia / na serenata / que dá vida à noite calma / e leva a alma / à viola que ponteia”. Meu canto de versos ganhou roupa nova na canção de José Pinto Neto. Zé Pinto, o de Caldas Novas, meu parceiro musical, também se foi mais cedo. Foi encontrar os meia-pontenses idos antes, como meu Vô.  

E Pirenópolis, a das verônicas do Divino, das congadas e dos doces cristalizados, a do licor de jabuticaba e vinho de caju, a Pirenópolis dos meus sonhos e minhas saudades, essa que não dorme... Essa, a cidade rodeada de montanha, encimada na paisagem pelas três colinas aniladas dos gigantes Pireneus, ah, essa!... 

Minha, nossa, eterna cidade de Nossa Senhora do Rosário! Não há fogo nem enchente que te apague de nossas almas.


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Luiz de Aquino, escritor, membro da Academia Goiana de Letras.


Um comentário:

Sueli Soares, professora e advogada. disse...

Sozinha, vi um pouco. Não penso em voltar. Apreciei o luar, vagando. Abrace-a...