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quarta-feira, outubro 03, 2018

Eleições e pesquisas


Batom nas pesquisas



O noticiário da tevê, no albor deste 2 de outubro, trazia a madorra das falas desnecessárias a tentar narrar os dramas intermináveis do transporte urbano, a persistência dos roubos em que bandidos em motos qualificam trabalhadores como vagabundos e continuam, os repórteres, a dramatizar, com a desfaçatez dos canastrões, a angústia das dores do povo esquecido que, agora, é visto como massa votante – porém, sem a dignidade de cidadão que clama por respeito.

“Será sepultada a menininha de quatro anos, vítima de tiros que matadores a mando de alguém num presídio desferiram ao matar, também, o tio da criança”. “A agenda dos candidatos a governador...”. “No terminal Padre Pelágio os passageiros sofrem...”. Pronto. E daí? Ah!, falta falar de acidentes: “Na BR-060, um idoso foi atropelado”...

Esqueço a tevê e abro o jornal, releio o artigo Retrato de Goiás sem retoques políticos, de Batista Custódio (edição de segunda-feira, 01/09). Batista faz análise da campanha para o governo de Goiás, mas desliza para a História e destaca os quatro grandes líderes dos últimos 100 anos no Estado, esses que “fizeram” seus sucessores sem sequer perceber que estes tomavam assento na inevitável continuidade das gerações, renovando o fazer político e exercendo sua liderança, um a um, cada qual a seu tempo, que a máquina do tempo não pede combustíveis, não exige lubrificantes, não sofre oxidação nem sofre panes.

Alguns estragos, porém, acontecem no decurso das práticas humanas, e o tempo os absorve sem dar mostras das avarias. Qualquer dano se transforma em subsídios para os dias, semanas e anos pósteros, que o passado não tem reparos, não carece de revisões.

A cada líder no exercício de seu mandato ou de sua direção há de estar preparado para os embates, os desafios e os rigores do posto ante a massa votante e exigente de feitos. Ao bom político é importante prevenir-se, pois, como li em algum lugar, nos últimos dias, a palavra pronunciada não tem rascunho. Um bom líder há de ter bons assessores – pessoas aptas a mostrar-lhe os riscos dos desvios, as falsetas iminentes, o perigo das más interpretações e o perigo das péssimas companhias.

Batista Custódio começou assim: “Todo chefe de governo é circulado de corruptos. Eles vão se aproximando na doçura dos elogios e irão distanciando Suas Excelências dos amigos sinceros na opinião. Fazem-se de serviçais aos governadores e servem-se da servidão do governo a eles”.

Estes são os áulicos, os que se barbeiam duas vezes ao dia e se perfumam várias vezes. Não duvidam que decorem frases inteiras de algum autor pouco lembrado, e as repetem sempre que têm oportunidade, procurando impressionar seus ouvintes e, sobretudo, o governador.

Batista continua: “Tornam-se eminências pardas dos bastidores íntimos dos governadores e viram (cada um) homem-forte do governo. Aparentemente amáveis, são mais perigosos que um escorpião furtivo na discrição da cama. Até as primeiras-damas se valem da sua aprovação prévia nos pedidos ao marido”.

Faltou dizer, Batista, o quanto cada valete desse baralho exercita para mascarar-se de competência, fingindo exercer o papel para o qual foi contratado, mas que, na realidade, praticam somente aquilo a que se propõe: “Fazer negócios” (entre aspas, porque é a frase pronunciada por um desses, recentemente, a propósito do que realmente faz em sua pasta). Em negócios há sempre alguém que lucra; nos governos, lucra o contratado, lucra quem o contratou e perde o Erário – sempre!

Mas o articulista Batista Custódio bem os define: “Levam vantagem até nos prejuízos, ora com uma ternura de santo, ora com a finura de um espinho, roubam no governo e furtam do governador. Trancam segredos e guardam com eles as chaves que fazem do governador seu prisioneiro inlibertável no inconfessável”.

Quanto à cadeia dos quatro grandes homens deste pouco mais de um século (de 1909 até estes dias), Batista demonstra como cada um formou o continuador de seu papel na História de Goiás da seguinte forma:

“Antônio Ramos Caiado entregou Goiás mais evoluído do que recebeu o estado. Pedro Ludovico transmitiu Goiás mais modernizado do que entrou o Estado. Iris Rezende engrandeceu Goiás mais do que o estado que lhe fora passado. Marconi Perillo trouxe Goiás para o futuro mais universalizado do que buscou o estado ali no presente”.

Para mim, excelente síntese de 100 anos da nossa história em apenas cinco linhas. Outros houve nesse interregno – e até mesmo a liderança de Totó Caiado em Goiás se deu sem que o líder exercesse o governo do Estado; ele preferia ser senador na Capital Federal, ali, sem dúvida, a vitrina era mais ampla. Totó deságua, pois, em Pedro Ludovico, que preserva as divergências e rejeições com o grupo que lhe fora adverso; e o poder de Pedro é bruscamente quebrado pela onda do golpe militar de 1964, que, por sua vez, sofre a entrada fulgurante de Iris em 1982 para, em 1998, o cetro simbólico ir parar nas mãos do moço Marconi.

E esta semana, ou melhor, estes quatro dias que antecedem as eleições podem equivaler, como preconiza o autor do artigo, a abertura para um novo momento. O resultado virá, sem dúvida, da vontade soberana do eleitorado, sem chance para armações desastrosas que, noutras épocas, marcaram a vida eleitoral brasileira, mas que, nem assim, conseguiram impedir que essa mesma vontade popular determinasse os novos rumos.

Enquanto isso, vivemos a dança dos números das incontáveis pesquisas. Sequer temos tempo para analisar uma, a seguinte já nos é chegada e confundem nossos cálculos e tentativas de prognósticos. E são tantas essas pesquisas de intenções de votos que a manipulação salta aos olhos.

A sondagem encomendada por grupos interessados em resultados (e até mesmo por candidatos) chega-nos com vícios e falácias. Ora é um candidato de prestígio intermediário destacando-se como possível eleito, ora é um dos mais prestigiados sendo deslocado para o Z-4 – parafraseando a linguagem do futebol.

E esses maquiadores das planilhas supõem-nos bobos a acreditar em tudo o que nos chega. Ora, nós não cremos sequer em suas promessas, como acreditar nessas máscaras que, a rigor, não passam de meros batons em tons dégradés?

Volto aos áulicos de gabinete, pessoas que inevitavelmente passam também pelos comitês de campanha, e de novo recorro aos conceitos do Batista Custódio: “Governador não se dá bem com intelectual pensador e de caráter inquestionável no verdadeiro. Pessoas assim são éticas, não servem para as fofocas brindadas nas adegas inebriantes de poder nos celestes do envaidecimento vulgar”.

E, ainda e novamente, do mesmo artigo:

“O bajulador é um mestre que disfarça as aparências. Maquia-se ao gosto dos engodos. O vulgo vê-os como puxa-sacos. Isso é o apelido. O nome no passaporte na alfândega das altezas é puxa-vaidades. O único jeito de flagrar sua identidade é vasculhá-los no semblante. São os homens com cara de mulher puta, ou de moça de convento, ou de garbo imperial”.

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Luiz de Aquino, especial para o DM
                                                                      

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