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domingo, outubro 14, 2007

Crer nos moços




Crer nos moços








Questiono sempre as pessoas que se dizem incrédulas, essas que se recusam a admitir que não somos apenas um ajuntamento de água e elementos químicos. Fosse assim tão simples, porque esses ingredientes não permanecem sempre iguais em seu estado natural, feito mercadorias na prateleira dos armazéns? Ah, dirão, é que há a química... Permanecer em estado natural é do campo da física; mas esses elementos, quando se juntam, interagem e geram novas coisas...



Ah, tá bom! Entendi. E as idéias? E o raciocínio? Nesse momento, qualquer resposta radical materialista torna-se exemplo nítido de preguiça mental. E ao materialista fica, então, muito bem aplicado, esse próprio conceito: matéria.



Falava para uma platéia de estudantes, na última quarta-feira, no Colégio Pedro II, Unidade Tijuca. Entre um e outro poema, contei-lhes casos do meu tempo de estudante, de professores notáveis, do costumes e atitudes. Eram alunos de uma ampla faixa, isto é, de sexto ano até os que se preparam para o vestibular, três estrelinhas no emblema. Rimos juntos e aprendemos juntos: eles, ao me ouvirem; eu, apenas por conviver. Conviver com os moços é algo que não se define facilmente. Alguém me disse, há bem uns vinte anos, que até os quarenta anos, aprendemos com os mais velhos; depois disso, aprendemos com os mais novos.



Num intervalo de cinqüenta anos, que é a diferença entre mim e os mais novos daqueles meninos, tudo muda. De tudo o que tenho lembrança, entendi que o que mais me marcava era a timidez ante os mais velhos. Ou mesmo entre meninos que não me eram familiares. Essa timidez desapareceu: o menino de hoje é livre e solto, diz o que quer sem peias, sem meias palavras. “Gostei muito de seus poemas. A partir de hoje, você é meu ídolo”, disse um garoto do sexto ano. Comoveu-me, o menino. Uma garotinha, também do sexto ano e já com alguns poemas na bagagem que sedimenta, talvez, a poetisa das próximas décadas, a uma observação minha sobre a decantada onda de violência que assola o Rio (e, enfatizei eu, toda a humanidade), comentou com sabedoria: “Violência existe em todo lugar e em todos os tempos”. Também era do sexto ano (e percebi que eram aqueles, os do sexto ano, os que mais se manifestavam).



Eu não quis contar nada de novo a eles, no campo da violência do bicho homem contra o homem; isso está nos jornais e nas tevês, está diante de nossos olhos além da vidraça da janela do ônibus, ou da moldura das nossas janelas; não disse nada, também, sobre a violência do ser humano contra a Natureza (afinal, Carlos Minc me antecedeu). Falei de poesia, de esperança, de fé nas pessoas e na capacidade humana de vencer desafios. Temos o péssimo defeito de cobrar perfeição e lamentar falhas; mas a perfeição é um sonho utópico que jamais aconteceu na história da humanidade.



Agora, algumas horas após esse encontro, ainda destrincho as palavras e cenas, tento separar pequenas peças, rejuntar tudo e processar o meu aprendizado. Eles, naquela idade, não se preocupam com isso, pois têm tempo. E, com ele (o tempo), muito o que ver, ouvir, ler, pensar... O que eles vivem agora são sedimentos de uma formação; em mim, tudo isso vira saudade imediatamente após.





Mas não é só saudade, não... Fica um sentimento profundo de gratidão: ao menino que fui ontem, aos mestres do meu tempo e a esses garotos e garotas de uniforme. E, entre eles, aqueles professores alegres e valorosos (agora, novos amigos).





11 comentários:

Anônimo disse...

Que lindo, meu amigo! Sei bem como é - estou sempre visitando escolas! É como um renascimento.
Urda Alice Klueger

Anônimo disse...

cada um de nós, a seu tempo, pode alcançar as maravilhas do platô mais alto e transcender pelo momento, pela vivencia... a vida não é espetacular? =)

Sinvaline disse...

Menino que palavras sábias, lindas, suaves, me emocionei!
Falar de poesia, de esperança, de fé no homem para crianças que quase nao vêem esse lado, pois as enxurradas de informaçoes falam diferente. A tv mostra a violencia contra a dignidade do homem. Só sua sensibilidade para mostrar outro lado poeticamente falando..
Parabéns meu amigo, gosto mais de voce depois de ler essa.
beijão
sinva

Mara Narciso disse...

Luiz,

De fato o texto foi curto, pois mal começou a reflexão e já termina o espaço.

O que me chamou a atenção foi o fato de você falar do passado sem ser saudosista. Considerar que no seu tempo era bom, sem achar que hoje não o é. Gostei também do título e da valorização dos novos que te acolhem e te valorizam.

Essa troca tem duas mãos e achei bom que tenha deixado isso claro: temos muito a aprender sim.

Madalena Barranco disse...

Luiz, querido amigo, adorei comparar suas fotos de menino mais novo com a do menino... Sua imagem por fora cresceu, mas a interna, permaneceu com a poesia intocada. A prova disso é que os "meninos" que lhe ouviram, entenderam o sentido de sua poesia, que é linguagem universal. Beijos.

Unknown disse...

Ah, se essa geração conseguisse o prazer raro de se embrigar de poesia...

Andreia Rezende

Anônimo disse...

Querido Luiz Aquino, já li a sua crônica no blog . Adorei.
Assim como diz que adorou a convivência com os alunos e professores , nós também adoramos passar aquele dia juntos.
Espero que no fim do ano provavelmente dia 06/12 estejamos juntos novamente para finalizarmos as comemorações do Jubileu.

Fátima Maria Barroso Monte (Assit. de Direção, CPII Tijuca)

Anônimo disse...

Querido primo
Já escrevi um comentário dentro de seu blog, mas como não entendo muito do funcionamento desta máquina seguem mais algumas palavras:
- fiquei muito sensibilisada com suas palavras, impressões, etc., que refletem o sentimento/sensações/emoções que vivenciamos interiormente ao ter um contato próximo com os mais jovens , descrevendo e fazerem com que possam imaginar como era antes do computador.... e mostrar que o futuro existe e que será diferente para cada um de nós.
Beijos,
Teresa

Anônimo disse...

Meu poetaço,

A beleza do passado refletiu-se no futuro ,que de tão brilhante ,trouxe lágrimas aos olhos de quem viveu no CPII.
Nós,as raízes e aprendizes do saber do Colégio Padrão, contamos ao presente, através de suas palavras faladas e aqui escritas, o sabor do amor e da quietude interior de ter vivido e crescido nesse tempo.
Parabéns com louvor!(e não poderia ser diferente!).

Anônimo disse...

realmente pude me deliciar com seus textos peomas e etc. Que complexidade de universo, rico e dinâmico.

Realmente essas imagens me fez retornar e ao mesmo tempo re-e-fletir
sobre mundo.

Um grande abraço,

João Colagem
colagemoãoJ

Cacau Macedo disse...

Oi amigo....adorei seu blog. Gostaria muito q vc visitasse o meu tbm e q se possível divulgasse ao seus amigos.... obrigada ! bjos!

http://cacaupoemaspoesias.blogspot.com/