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sexta-feira, março 12, 2010

Fala aos mestres


Fala aos mestres


Luiz de Aquino


Até onde minha memória me permite ir, encontro falas de adultos da época a propósito de Educação. “A criança é o futuro do Brasil”, diziam os grandes, repetindo falas ouvidas no rádio e fazendo eco às vozes das professoras. Na minha pequenina Caldas Novas, um ginásio estadual se fez lá por 1963. Levou o nome do ministro da Educação, Júlio Sambaqui, mas teve a placa inaugural removida em movimento “cívico” liderado por líderes do PSD e da UDN, em indisfarçável postura áulica para com a “redentora”, ou seja, o golpe militar de 1964.

Até então, tudo se resumia ao Grupo Escolar e à Escolinha de Dona Vanda Rodrigues da Cunha, em cujo colo aprendi o abecedário e a formar sílabas, soletrar e ler e escrever. Quem tinha poder financeiro, mandava os filhos para algum colégio interno. Eu tive a sorte de ter familiares de minha mãe no Rio de Janeiro e para lá fui enviado para continuar os estudos após receber o certificado do primário.

Goiânia, em 1960, com cerca de 200 mil habitantes, dava-se ao luxo de contar com duas universidades – a Universidade de Goiás, que se tornou Universidade Católica de Goiás e que hoje é PUC, e a Universidade Federal de Goiás. Havia a Escola Superior de Educação Física, a ESEFEGO, embrião da Universidade Estadual de Goiás. E nasceu a Faculdade Anhanguera, hoje Centro Universitário. Essas instituições, berços da graduação deste nosso pequeno grande universo de profissionais, geraram condições para, hoje, o Estado de Goiás ser dotado de tantos núcleos de formação superior.

Apareceu, também, por aqui (como em todo o país), uma nova modalidade – a das instituições que se expandem sobre o território brasileiro, oferecendo cursos vários já reconhecidos, sobretudo na área de Humanas. E ainda assim o Brasil continua com carência de professores, porque a política de estímulos para a profissão não se mostra. O resultado é uma inversão de papéis: pessoas que se formam com licenciatura, mas nunca assumem suas cátedras, pois os salários são desanimadores; e profissionais de outras áreas, sem qualquer conhecimento da área pedagógica a ministrar o que chamam de aulas e sequer chegam a ser palestras sofríveis.

Resumo da pantomima: a formação de profissionais tão-somente aptos em seus segmentos de trabalho. A cultura geral sumiu. Profissionais com menos de trinta anos, hoje, não conseguem manter uma conversação com pessoas de fora do seu grupo de formação. Há vendedores, pasmem!, que sequer saber conversar com a clientela – somente com seus colegas.

No domingo, 7 de março, a poucas horas do festivo Dia Internacional da Mulher, tive a alegria de falar para cerca de cento e vinte formandos (licenciatura) de várias áreas da UVA – Universidade Estadual Vale do Acaraú. Quase nada falta para que ponham as mãos em seus diplomas e boa parte deles já exerce o ensino, tal como eu também vivi – ensinando enquanto aprendia, trocando ensinamentos e aprendizados, trocando entre os colégios e a Universidade informações preciosas, aprendendo mais que ensinando, sendo instrumentos de formação e crescimento de meninos e adolescentes.

Senti o entusiasmo daqueles jovens ensinantes, pré-professores. Lembrei-me que os militares bombeiros e policiais de todo o país estão prestes a conquistar salários expressivos, algo como R$ 4 mil para soldados e R$ 7 mil para tenentes, e sugeri-lhes que, ante a realidade atual, um salário de primeiro sargento seria boa paga para professores em todo o país.

Um sonho, não é? Mas os mais velhos que eu contam que por volta de 1950 o salário de um professor do Liceu era comparado ao de um coronel da PM. Decano de todos nós, o professor Egídio Turchi deixou de ser desembargador para lecionar no Liceu, os salários eram iguais. E outro mestre da antiga, o saudoso professor Genesco Bretas, trocou o cargo de diretor regional dos Correios pelo de professor, também.

Meu carinho aos novos professores, essa juventude entusiasmada da UVA. Espero que meus recados e experiências lhes tenham valido de algo. Abraços às professoras Maria Luiza de Carvalho, psicóloga que tão bem tratou o tema da inclusão, e Vitória Régia Landin Carrilho, reitora da UVA em Goiás.

(Afinal, os professores também precisam ser incluídos; com carinho e justiça).


Luiz de Aquino (poetaluizdeaquino@gmail.com) é escritor, membro da Academia Goiana de Letras.

8 comentários:

Lila Boni disse...

É muito bom estar aqui e te ler!!!
Mil beijos !!!!

Mara Narciso disse...

Criar o ciclo virtuoso passa pelo aumento substancial dos salários. A baixa capacitação de alguns professores, que, segundo pesquisas, são geralmente os de mais baixas notas, faz com que, cada vez mais o nivel deles caia. Muitos maus alunos vão ser professores, por que devido a baixa remuneração, não atrai os bons alunos e assim o ciclo se perpetua. Raros são aqueles brilhantes alunos que se aventuram na Pedagogia. Qualificar e cobrar resultados sim, mas principalmente pagá-los para haver melhoria do aprendizado.

Cantinho da Cris disse...

Bom dia professor Luiz, sou da escola Municpal Arcebispo Dom Emmanuel e recentimente lhe enviei um email osbre sua visita à nossa escola. Também tenho um blog, aliás, eu e a escola. Gostaria que vistasse os sites e deixasse sua opnião.
http://cris-pedagoga.blogspot.com
http://emade-sme.blogspot.com/

Linda Costa disse...

Fico feliz em saber que existe alguém preocupado com a situação dos professores. Sei que não é hipócrita como muitos.

Gostei da comparação, na verdade somos a classe menos valorizada neste país, enquanto muitos gastam com futilidades o professor gasta o pouco que ganha em cursos para dar aulas de qualidade, e mesmo assim ainda é punido pela sociedade que somente vê defeito.

São muitos os que estão doentes com problema de coluna, estressados, e perdendo a voz. São mal tratados pelos alunos e às vezes até mesmo pelos funcionários da escola e por pais de alunos que não sabem educar direito os seus filhos.

É verdade, muitos estão abandonando a profissão, não agüentam mais. Obrigada, em nome de todos os meus colegas sofredores.



Um beijo

Linda

Luiz Delfino disse...

Caríssimo poeta Luiz de Aquino,

Após longo tempo afastado do teclado – o que nos dá até uma tristeza pois no silencio, do “murmúrio interior” afloram muitas idéias – retorno ao prazer de comentar seus textos e, com eles, navegar na alma do estilo próprio de um goiano amigo.
Por alguns anos lecionei em diversas escolas de segundo grau aqui de Joinville na expectativa de aprender um pouco sobre a arte de ensinar sem nunca ter sido preparado para tamanha responsabilidade. Lembro-me que certa feita fui procurado por telefone e, sem muita conversa, já contratado; era urgente, precisavam de “professores” naquele momento. Com o tempo descobri que fazia parte de um circulo vicioso que eu mesmo combatia mas que estava inserido e não buscava resolve-lo fazendo um curso preparatório – já que sempre gostei de lecionar.
Foi uma experiência ate que dolorosa, por diversos fatores mas me forneceu dados de que , cada vez mais, a educação brasileira esta fadada à penumbra. Até mesmo as Escolas particulares que recebem alunos da classe média alta. Deus nos acuda...
No Brasil – e em muitos países regados pelo capitalismo selvagem – é bom que o nível de educação popular seja voltado aos interesses dos donos do poder para que uma mão de obra sem capacidade de discernimento seja eleita sempre que precisem. Ora, então para que ter bom professores.
A esperança é que em algum lugar alguém venha a escrever sobre o assunto; a falar, a contestar, a contradizer muitos políticos de plantão.
E você, com seu característico romantismo com a escrita é um dos homens que fazem história para que a História, um dia, seja melhor. Principalmente a História da Educação.

Forte abraço

Luiz Delfino

Marilia Nubile disse...

Excelente! Parabéns!
Um forte abraço.

Unknown disse...

A mó qui si ieu tivé nessi mêi, si aposenta eu...ah..ah..ah...ieu quéru siaposentá....
Sílvia

André Villon disse...

Quanta leveza e suavidade em suas palavras amigo poeta. Eu como professor faço coro contigo. Ainda somos a resistência e quiça seremos incluídos.