Língua e Matemática
As quatro disciplinas, ou matérias, que marcaram o curso primário do meu tempo definem-se pelo que há de absolutamente indispensável na vida: a comunicação, a noção de medidas, a pessoa em seu tempo e a pessoa em seu espaço. Assim, definimos Língua, Matemática, História e Geografia. Tudo o mais nasce daí; ou está contido nessas quatro matérias.
Morro de rir de pessoas (conheço várias) que afirmam não gostar dessa ou daquela disciplina. São, geralmente, pessoas muito falantes e algumas delas leitoras dedicadas de livros, jornais e revistas. Ou seja, pessoas incapazes de viver sem se comunicar e, ao ler, aplicam-se nos terrenos da Matemática, da História e da Geografia – e, sem conhecimento da Língua, não transitariam por nenhuma informação.

Durante o jogo Santos e Flamengo, na noite da última quarta-feira, Júnior, craque do Flamengo lá pelos idos da década de 1980, hoje comentarista da TV Globo, respondeu, quando lhe perguntaram se foi bom em matemática: “Muito! Tanto que virei jogador de futebol”. A ironia sugere o contrário, isto é, por não ter sido bom aluno, fez-se boleiro. Pensei: será que ninguém disse ao Júnior que o tirocínio, a velocidade, a noção de espaço e da força ao chutar, o gingado, as distâncias, o número na camisa, o horário, o tempo de jogo e os acréscimos, o placar – tudo, tudo o que os atletas fazem são medidas? Ou seja, Matemática?
Tempo de espera, datas, idades, localização, distâncias... Até mesmo a fome é um resultado matemático, uma equação entre o que se comeu, a quantidade, a constituição do alimento e o organismo que o consumiu; a natureza do corpo faz a equação e determina o momento (a hora) em que aquele corpo precisará comer novamente.
Então, volto ao leitor a que me referi. Ele lê o jornal de hoje, ou a revista da semana, do mês; quer saber dos fatos, e só faz isso porque sabe ler. Absorve-os, ao informar-se, e a tais informações agregam-se muitos, muitos números, muitas medidas. Isso está no noticiário político, no da cidade, no de esportes e no de economia. Em todos eles, os números são indispensáveis. Datas, preços, alíquotas, percentagens, projeções, tempo, horários, quantitativos vários...
Ultimamente, as autoridades e os jornalistas de vários segmentos, especialmente os de política e economia, alinham-se aos professores para empenhar-se num melhor ensino e aprendizado da Língua e da Matemática.
Claro! Sem saber a Língua, ninguém aprende nada; e quem aprender bem a Língua, está apto a aprender qualquer coisa. Dizem os pedagogos que quando aprendemos a falar já elaboramos as regras gramaticais; e, por analogia, quando aprendemos a andar já processamos o raciocínio matemático. Curiosamente, lembro-me de ter lido um texto, lá pela minha adolescência, que o processo racional da Língua é o mesmo da Matemática. Ou muito parecidos. Não sei, não posso ir além do que li, mas sei que a intuição humana nos dá bem a noção das regras fundamentais da gramática, bem como nos permite, ainda que desconheçamos números e contas, o domínio da relação entre nosso corpo e o espaço e os obstáculos do ambiente.
Mas os mestres, os jornalistas e os profissionais que trabalham a qualidade do ser humano no Brasil têm razões aos milhares para se preocupar com a Educação. Infelizmente, temos ouvido e lido horrores em falas e escritos elaborados por profissionais de nível superior em total confronto com o modo de falar correto. Ninguém exige que todo profissional de terceiro grau seja literato, apenas que tenha boa desenvoltura ao falar e escrever. Da mesma forma, os cálculos elevados ficam para matemáticos, engenheiros, economistas e contadores, mas todos precisamos conhecer coisas corriqueiras que a Matemática nos pede nos vários momentos de um dia. E muitas são as pessoas que calculam intuitivamente tudo o que se faz necessário: espaço, área, volume, tempo, juros etc.
Por essas e outras é que me divirto com os que dizem “não gosto de Matemática” ou “a Língua Portuguesa é muito difícil”. Não é, não é e não são... Difícil, realmente, é aprender com perfeição qualquer coisa. Desde jogar futebol até ensinar nas escolas.
* * *