Importante como vestir
Era
2009; Iuri Rincon, amigo de algumas décadas, jornalista e escritor, com
frequência marcante no meio
publicitário, na pesquisa histórica e tantas outras pétalas de muitas
cores num mesmo leque, editava para mim um livro de crônicas. Conversávamos ao
nosso modo habitual, e eu citava excrescências costumeiras nas vozes de
locutores e nos textos de jornalistas e professores, sem me esquecer de
advogados e executivos.
Ríamos,
divertidos, e em meio a isso Iuri lembrou-me: “Isso pode dar um livro, hem?”.
Sim, pode! – concordei eu. E, sem perda de tempo, corri para casa e pesquisei
meus arquivos – tenho uns poucos milhares de crônicas publicadas; não foi
difícil juntar algumas sob o mesmo tema e “fechar” um livro de 136 páginas –
recheado também de nomes esdrúxulos. Esse livro só foi publicado em 2011.
Foi
assim que surgiu “Ah, língua brasileira!”. E muita coisa acontece, todos os
dias (e em todos os jornais, em todas as revistas e todas as emissoras de tevê
e rádio, com os profissionais abusando do direito de se mostrarem desleixados e
desrespeitosas com o idioma que, em síntese, é a sua principal ferramenta de
trabalho.
Professores,
advogados e jornalistas (de todos os segmentos da Comunicação), mais do que
outros profissionais, são considerados referências pelo grande público; sendo
assim, é bom que cuidem melhor do que falam – e do que escrevem.
Intriga-me
ouvir no rádio “muito bom dia”, como se possível ou costumeiro fosse desejarmos
um “mau dia” ou, ao menos, “um dia mediano” aos nossos ouvintes, não? E os
economistas e jornalistas que repetem à exaustão a palavra “subsídio” como se,
em lugar do S, tivéssemos Z: “subzídio”(ora: sabemos que o S, precedido de
qualquer consoante, tem o seu som sibilado, ou seja, como em “aniversário”).
Os
paulistanos teimam e a “coisa” está pegando em todo o território nacional (a
tevê é muito forte!): as vogais, em seu “estado” puro e original, têm som
aberto: a, e, i, o, u... Mas paulistas pronunciam “ê” em lugar de “e”(aberto);
e exigem que, para pronunciá-la aberta, deveria ter acento. Sendo assim, o
mesmo se aplicaria ao “a”e ao “o”. E eu pergunto: por que, então, eles mesmo
mudaram o som de “extra” para “éstra”, hem?
Bem,
meu espaço está no fim; isso é conversa boa para muito tempo – e muitas linhas
escritas – mas, estou certo, podemos sempre voltar ao tema. Resumo minha
opinião num exemplo indiscutível: a língua, escrita ou falada, pede elegância,
também; e elegância não é, sempre, extravagância – é possível haver elegância
em trajes simples, desde que de boa qualidade, sem que se recorra ao luxo; na
língua a situação é a mesma.
Um
executivo, político, artista, jornalista etc. que trate com desdém a própria
língua esquece-se de que comete como que uma gafe ante seus interlocutores.
Falar é como vestir-se, e não basta ostentar ricas logomarcas se não se sabe
combinar cores e acessórios.
Em
caso de dúvida, sempre podemos recorrer a alguém que nos oriente.
* * *
4 comentários:
Gostaria que falasse mais sobre os "pecados" dos paulistas/paulistanos no que se refere as vogais abertas, Luiz.
Abraço
Não qualificaria, seriamente, como pecados, mas como características do linguajar paulistano; a Língua é dinâmica e, claro, regional. Ou chamaríamos de pecados também as pronúncias portuguesas para as vogais (em muitos casos, o A é falado como E; e em outros, o E assume um tom tão aberto que beira o som de A, por exemplo). No Centro-Oeste e no Nordeste (suponho que também no Norte), Costumamos abrir mais as vogais (ex.: có-ração) em muitos casos e fechar em outros (tumar, em lugar de tomar; cumer, em vez de comer... ). Portanto, não existe uma regra absoluta para a pronúncia, mas o dominante em cada região, concorda? O que chamamos de carpete (aquele tapete fixado, que cobre todo o piso num ambiente) o curitibano diz ser "carpê", e penhoar, para eles (de Curitiba) é "penoar"...
Gosto de saber dessas variantes e divirto-me com as diferenças.
Querido primo,
As barbaridades que vemos, escritas e faladas, atualmente, refletem muito bem o padrão de ensino do país, nossa representatividade parlamentar em todos os níveis governamentais e a falta de seriedade e revisão nos meios de comunicação escrita, e na falada, pelo menos ao vivo, é altamente ilustrativo disto tudo. Bjs. Teresa
O que tem o tema de interessante tem de interminável. É bom ler sobre isso, e eu gosto dos seus vastos conhecimentos sobre o assunto. Aos poucos vou procurando errar menos no falar e no escrever, mas as dúvidas sempre existirão para mim.
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