Duros. E sem ternura
Desde
a década de 80, camisetas com um retrato estilizado de Ernesto Guevara, com a
frase “Hay que endurecerse pero sin perder la ternura jamás”tomou conta da
juventude. Das juventudes, porque os jovens daquele tempo já emplacaram 50
anos. E há quem diga que o Chê nunca pronunciou tal frase – ela foi cunhada
sobre sua biografia e aplicada num cartaz que se tornou tão popular quanto
propaganda de coca-cola. (Alguém aí, confira se acertei na grafia; nunca
estudei castelhano).
Horário
de Verão, essa chatice (será chatura?) instituída por Getúlio Vargas e que foi, algumas vezes,
deixado de lado, continua a infernizar-nos a vida; Lula, quando presidente,
prometeu acabar com isso, mas sua ministra de Minas e Energia convenceu-o do
contrário; sendo assim, enquanto aquela ministra for presidente da República,
ou enquanto o PT governar, não nos livraremos desse incômodo.
O
argumento de Dona Dilma refere-se a uma enorme (!) economia de energia; mas os
números citados por ela são muito menores dos que atingimos naquele apagão de
2001 apenas com campanhas de racionalização. E como acontece todos os anos,
quando da vigência desse malfadado horário, os abusos continuam; e
principalmente em Brasília; e notadamente em edifícios públicos, como o
Congresso Nacional, os ministérios, o Palácio do Planalto e os palácios da
Justiça – quer dizer, em todos os poderes. Pelo que disse nesta
sexta-feira, 08/11, Alexandre Garcia (telejornal Bom Dia, Brasil, da TV
Globo), somente os prédios dos ministérios da Defesa e das Minas e Energia
cumpriam o ritual de economizar energia.
Mas,
hão de me dizer, poder é isso. Poder é isso de mandar sem dar exemplo.
Falam
em estimular o uso de bicicletas como alternativo do transporte e instrumento
de exercícios, mas aplicam nada menos que 41% de impostos sobre as “magrelas”.
Empenham-se
os organismos de segurança, de educação e de saúde (os mais citados pela
população, do Cabo Brando à nascente do Rio Moa; do Monte Caburaí ao Arroio
Chuí), mas mantém-se uma burocracia capaz de absorver grande parte dos gastos
com esses segmentos fundamentais. Orgulham-se das nossas safras astronômicas, mas
mantêm as rodovias mal construídas e mal conservadas, intransitáveis, e os
portos obsoletos, retardando o escoamento da produção e aumentando também
astronomicamente os custos de transporte.
O
quotidiano da comunicação instantânea, a trivial Internet, proporciona-nos as
redes sociais, pelas quais nos integramos ao mundo como jamais sonháramos há
vinte anos. Mas essas tais redes, formalizadas em grupos institucionalizados
nos espaços etéreos, acima das nações e de suas leis; e sobretudo acima dos
conceitos de bem e mal – como bem define minha amiga Sueli Soares, mestra e
causídica.
Vêm-me
à mente as frases iniciais da Declaração Universal dos Direitos do Homem,
datada de 1948. E recordo, também do noticiário televisivo, impresso e
radiofonizado, o escândalo da espionagem dos ianques contra o resto do mundo,
especialmente contra líderes de países amigos. O comandante de uma agência de
espionagem do tio-sam estranha a bronca de nossa presidente e da
primeira-ministra alemã; ele alega que nós – brasileiros e alemães, também
espionamos os EUA.
Tempos
árduos, duros, implacáveis. Tempos em que o jogo político, aliado ao poderio
econômico, ignora solenemente o Homem. A ternura foi para a caçamba de lixo e o
respeito ao próximo não aparece mais nem mesmo como figura de retórica.
Com
tudo isso, resta-nos ainda o que nos fortalece: o retorno ao nosso restrito
grupo de amigos (aqueles à antiga, não os “amigos” de redes sociais apenas) e à
família. Ou perdemos de vez a capacidade individual das nossas ternuras.
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Um comentário:
Li e gosti. Parabens pela verdade explicita no seu texto.
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