Páginas

sexta-feira, outubro 03, 2014

Essa coisa de rabo


Essa coisa de rabo



Enfim, chegou! É certo que em algumas das Unidades Federativas haverá outro sufrágio; é quase certo que o mesmo acontecerá no plano nacional, com o inquilino do Palácio da Alvorada sendo escolhido no final deste mês; mas a grande maioria dos candidatos deste ano, os que disputam cargos parlamentares nas duas Casas federais e nas Assembléias regionais descansarão a partir de segunda-feira – uns felizes, outros já pensando no próximo pleito.

Na maioria dos países por este mundo afora que realizam eleições o dito sufrágio é feito de modo voluntário, isto é, o eleitor não é obrigado a comparecer ao local de votação. Uma vez diante da urna, cabe-nos escolher em quem votar, abster (votar em branco) ou protestar (anular o voto). De minha parte, não consigo me imaginar não votando.

Esta campanha decepcionou-me. Pela realidade que vivemos, pelo empenho nas disputas pelos cargos – mormente os do Executivo dos dois níveis – e por imaginar que o eleitor de agora exige mais, esperei idéias e propostas para apreciarmos e, assim, escolhermos os nomes que marcaríamos no mínimo teclado. Mas o que vimos...

E pensar que nunca nos comunicamos tanto! Além do rádio, da tevê e da mídia impressa, temos hoje as redes sociais via Internet. Mas vimos candidatos (policiais) prometendo acabar de vez com a violência, mostrar algemas e pistolas, escolher números que lembram calibres e mesmo algemas e assegurar que mudará a lei para punir menores.

Acho também que é preciso conter essa garotada imberbe que furta, rouba, ameaça e mata! Mas isso é perfeitamente possível, basta que se alterem algumas dispositivos do Estatuto da Criança e do Adolescente; como está, nós vimos esta semana, as autoridades não podem sequer intervir onde a família falhou – refiro-me aos meninos de nove anos, da Grande Goiânia, ambos com incontáveis passagens pelos Conselhos Tutelares; podem sequer ser internados para tratamento, pois o ECA o impede; e, em segundo lugar, essas crianças “não aceitam” ser tratadas.

Milhares e milhares de candidatos foram ouvidos em todo o Brasil nestes dois meses de propaganda que dizem ser “gratuita” – gratuito é esse eufemismo; alguém paga por isso e, é claro, a conta é paga por quem não está à ponta da mesa, mas em torno dela: o contribuinte. E contribuinte é muito mais que eleitor – é o cidadão brasileiro que consome qualquer coisa!

A propaganda, em Goiás, em cerca de 80% de tudo o que ouvimos, foi deplorável; no que toca a candidatos a deputados, melhor se ficássemos na legislação de Armando Falcão, lembram-se? Os candidatos eram “mostrados” na tevê em fotos 3x4 e uma voz-padrão lia seu mini-currículo – algo de três linhas, apenas.

Mas os debates... Ah, esses foram antológicos pelo pior! A nação inteira viu aquele candidato Fidélix vociferar contra homossexuais, “em defesa da família” e corroborando teses dignas do deputado Bolsonaro, o pai; mas Fidélix superou seu ídolo, que comete baixarias e descamba para o folclórico; o candidato à Presidência deixou aceso o estopim do ódio e do preconceito.

E no plano local, um professor do Entorno, de voz fina e péssimo português, em dado momento acusou todos os demais candidatos de terem “rabo preso” e só ele que não... Ao generalizar, talvez ele tenha escapado de um processo por agressão moral, mas deixou no ar uma dúvida: estava ele fazendo apologia ao rabo solto?

Uma possível vítima de Fidélix.


* * *

4 comentários:

José Fernandes disse...

Excelente, a sua crônica, Dom Luiz de Aquino! O fecho foi simplesmente ótimo. Parabéns!

Mara Narciso disse...

Personagens bizarros, outros folclóricos. A lista de candidatos pode até não representar a todos, mas que tenta, tenta.

Nadia Reis disse...


Olá Luiz, o seu posicionamento foi perfeito diante do teatro de horrores que foi a campanha eleitoral desse ano, e que não houve criteríos de seriedade, levando o eleitor a ficar sem saber o devido rumo que tomará nosso país nos próximos anos.
Aproveitando se me permitir, deixarei um desabafo:
Como dizem... sou filhote da Ditadura, acho que o tempo que passei sem votar, sem ter esse engajamento nas causas políticas, fez de mim, apesar de relutar, de levantar a bandeira da não aceitação ao regime, ele mexeu com minha cabeça, fui o que chamam pseud-revoltada, mas que na verdade minha mente foi lavada, fazendo com que me tornasse descrente das mudanças, amedrontada, mesmo criticando as campanhas, os candidatos, mesmo tenho opiniões, me sinto uma revoltada tolida, mas como? dirão alguns, há a democracia, podemos xingar a Presidente, falar o que quisermos de quem está no poder, votar, ir as ruas protestar, mas lá no fundo nós os “tais filhotes”, ainda estamos presos e amordaçados, desesperançados .
O professor de história Luid Gabizzi, que hoje deu uma palestra na UFRJ, referiu-se a não fidelidade do brasileiro aos partidos políticos, dizendo que são mais fiéis ao seus times de futebol, deu como exemplo ele e sua família: disse ser vascaíno, seu pai, seu avó, e seu filho, e fez um desafio perguntando quem esteve fiel ao longo dos anos a um só partido, e disse que ele mesmo nessa eleição votaria em três candidatos de três partidos diferentes, e acho que muitos também o farão, aquilo me deu um tristeza, caramba!!!, somos uns patetas, nada existe de sério.
Ainda em suas citações comparou nosso país a uma rocha, que não se move nunca, sempre as situações se repetem, nada muda, e o que ele disse coincidiu com a pichação que li na parede do teatro João Caetano hoje à tarde, VOTEM EM QUEM QUISER, O BRASIL NÃO VAI MUDAR NUNCA.
Que desalento...

Ana Maria Taveira disse...

Oi, Luiz!

Como tudo que você escreve sua crônica traz o olhar investigativo do jornalista que busca incessantemente a realidade do cotidiano, outro olhar paciente e observador do cronista político que usa toda a sua criatividade para reunir e retratar os fatos, sem deixar de se posicionar com muita verdade. Já li de você crônicas falando de árvores, aniversários, amizades, sentimentos, perdas, datas - às vezes delicado,outras contundente, sempre com a bandeira da verdade. Admiro-o. Parabéns pela crônica, mais uma vez.