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sábado, junho 20, 2015

Tudo muda... Será?

Tudo muda... Será?


Até a década de 80, cada profissão dizia-se uma classe de trabalhadores. Mas veio a redemocratização (?) e decidiu alguém que classe é toda a massa operária, aliás, todos os que de fato trabalham, e os segmentos profissionais seriam, a partir dali, categorias.

Alguém visto em ato criminoso era dito autor, ladrão, assassino, agressor etc. e tal, mas depois do “politicamente correto” a pessoa vista, testemunhada, filmada, demonstrada, confirmada só pode ser chamada de suspeito; somente após uma condenação transitada em julgado o tal pode ser qualificado como bandido.

Até há bem pouco tempo, os rios e as rodovias tinham duas margens – no caso dos rios, a direita e a esquerda; no das rodovias, considerava-se um trajeto e era comum falar-se em margem sul e margem norte, ou margens leste e oeste; agora, os coleguinhas da imprensa falam que um bar se localiza às margens da Rodovia Tal – como se a palavra margem tivesse ganhado o status de uma outra muito especial: óculos, que só se escreve e se fala no plural, com a devida concordância.

Velho virou idoso e velhice é melhor-idade. Preto agora é afrodescendente ou negro. Gordo é alguém acima do peso. Homossexual era chamado, há um século, de “desviado de conduta” e daí advém a expressão “viado” – que muita gente supõe ser uma analogia ao belo e esguio mamífero veado, mas não há nada a ver.

Decorrida apenas uma década deste século, eis que o povo nacional elege uma mulher para presidir o Brasil. Inovamos, e muita coisa mudou – dizem. Mudaram-se as cores dos ideais ou a essência e a têmpera deles? O partido da ética e das causas sociais reafirma a índole de seu antecessor e continua terceirizando e privatizando, prestigia o segmento financeiro e brinca de inserir pobres na classe média – mas poucos meses após a reeleição vemos a classe média migrar para a pobreza e o desemprego assustando muito mais que os altos índices inflacionários.

Março era o nosso mês da Poesia, porque há décadas tínhamos o aniversário de Castro Alves – 14 de Março – como Dia Nacional da Poesia. Mas alguém me escreve contando que um senador tucano – Álvaro Dias – propôs e conseguiu aprovação do Congresso, e a presidente Dilma sancionou a lei que estabelece 30 de Outubro, aniversário de nascimento de Carlos Drummond de Andrade, como Dia Nacional da Poesia.

Epa! Tudo a favor de qualquer homenagem ao poeta itaberino, orgulho de Minas e de todo o Brasil, mas porque “desomenagear” o Poeta dos Escravos? Claro, preocupa-me isso porque acreditei na informação que me foi passada, e estranho muito que os assessores do senador e da presidente não tenham atentado para isso. Se a moda pega, em breve teremos as homenagens a Rui Barbosa transferidas a outro jurista, talvez o ministro (do Supremo Tribunal Federal) Joaquim Barbosa – mas aí seria novamente substituir um baiano ilustre por um mineiro que orgulha seu Estado e a Pátria.

Estranhei muito isso, e espero sinceramente que a notícia seja mais um “fake” como tantos que rolam pelas redes sociais. Admiro, curto e me delicio enquanto aprendo nas leituras de Drummond, mas porque mudar o que vai bem? Deixemos Castro Alves como patrono do poetariado nacional e escolhamos outra homenagem para o grande poeta mineiro.

Das mudanças ainda não havidas, fico com a esperança de que troquemos o presidencialismo pelo parlamentarismo. Aí, sim, teríamos algo de mudança. Algo para de fato festejarmos.


* * *

3 comentários:

Sueli Soares disse...

Seria a esperança a última a morrer, poeta? Sempre que me assalta a pergunta, festejo a última alegria, órfã de mim.

Mara Narciso disse...

As amenizadas na linguagem podem parecer supérfluas, mas acabam não sendo. Claro que não mudam a realidade, mas sou a favor da maioria. Havia um cartão que nós, endocrinologistas entregávamos aos nossos clientes. Neles estava escrito "Sou diabético, caso esteja passando mal favor ligar para...". Foi assim durante décadas. Há uns quinze anos um representante de laboratório me entregou um cartão com o mesmo fim, onde estava escrito; "Tenho diabetes...." Compreendi que as palavras escolhidas são tudo.

Nadia Maria Vinhas disse...


Ô poeta querido... o novo sempre virá, nada do que façamos ou lutemos, ele virá, então sente-se a sombra dessa árvore que é o tempo e curta as lembranças de tudo o que fez e deixará de legado, e pense: "Fiz a minha parte". Ser esquecido dói, corrói e dá vazio, mas enfim o brasileiro tem essa característica de deixar de lado o passado maravilhoso e se fixar apenas em um presente fútil, mas que lá na frente também será passado e esquecido. Nossa triste cultura é do aqui e agora...
Que dizer?...