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sábado, julho 01, 2017

Em tempo de total descrença

Quem tem medo do Lobo Mau?


Muito se fala sobre o foro privilegiado para detentores de mandato eletivo. Parlamentares são os que detém para si a gama maior de privilégios, pois podem lucubrar verdades factoides e ferir a honra e a dignidade dos cidadãos comuns sem que, por isso, sejam contestados judicialmente – como chamar os desafetos de bandidos, por exemplo. 

Os mandatários de cargos do Executivos nos três níveis são alvos da nossa constante irritação por tudo o que nos falta ou nos é tirado em nome da escassez de recursos ou da “necessidade” do aumento de impostos – bandeira essa com que o todo-poderoso ministro da Fazenda nos ameaça a cada palestra.

A Internet – essa nova “casa” (da mãe-joana) instituída em âmbito mundial – deu voz aos que, até vinte anos atrás, não sabiam onde dizer nada, onde reclamar de nada. E, com isso, nota-se que o repúdio à classe política, hoje, está se tornando uma nova unanimidade.

Dois dos juízes do maior patamar da Justiça – Teori Zavaski e Edson Facchin – foram além da letra metálica da Lei e feriram seriamente o Legislativo. O primeiro afastou do cargo e mandou prender um senador; o segundo afastou do cargo e limitou drasticamente os movimentos de outro senador – mas somente o primeiro teve, efetivamente, seu mandato cassado e suas vantagens ceifadas drasticamente. Já o segundo mereceu o retoque caprichoso de um terceiro alto magistrado, Marco Aurélio Mello. Ele “corrigiu” o “abuso” (não usou essa palavra nem se referiu diretamente a Facchin, mas não foi necessário) do colega e, ao “aplicar a lei” em respeito “aos votos do povo”, embasou seu discurso em exaltação aos méritos (?) políticos e pessoais do neto de Tancredo.

Se Facchin pecou em sua decisão, o bom senso sugere que a questão poderia ser corrigida no colegiado – ou seja, na apreciação pelo plenário de 11 ministros, e não na contestação pura e simples de um de seus iguais. Ou será que, também lá, uns são mais iguais que seus iguais?

Há incontáveis acusações contra a cúpula do PT, partido que se rege não por essa cúpula, mas pelas orientações autocráticas de um só líder. O juiz Sérgio Moro condenou o tesoureiro Vaccari, mas o regional o absolveu, limpando-lhe totalmente a ficha. Parece que o prêmio não foi bem absorvido na mídia ou nos comentários das redes sociais, mas é um indício de perdão geral para os petistas – e, pelas novas notícias, também aos do PMDB, do PSDB etc.

Fala-se que Lula, hoje, torce para que Temer continue no cargo – ele seria um anti-herói, um presidente que tenta emplacar medidas antipáticas, antipopulares, e assim pavimentar o caminho de seus adversários. Acredito, também.

A popularidade de Michel Temer, na faixa de 7%, é uma das mais baixas de que se tem notícia em todo o mundo. Ele não suportaria sequer o boato de uma consulta popular, agora. O Brasil carece de líderes. As duas casas do Congresso, as 27 assembleias estaduais e as mais de cinco mil câmaras municipais do país colecionam fatos e atos criminosos contra si – e há o consenso de que nenhuma delas escapa a uma auditoria.

O mais triste é saber que a cara de pau, hoje, não tem limites. Antes, há algumas décadas, havia um ligeiro pudor até mesmo entre esses corruptos que deixaram o seu legado para os filhos e netos (as oligarquias são as mesmas sempre, transmitem-se de pai para filho e, não raro, agregam novos segmentos familiares porque os casamentos existem para isso também). O triste é constatar que antes era tudo igual, mas o populacho não tinha acesso às informações.

E ante tudo isso, ainda há quem venha, no turbilhão de tantas más notícias, pregar a honestidade dos ditadores.

Isso é pior do que acreditar no Saci Pererê.


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Luiz de Aquino é escritor de prosa e verso, membro da Academia Goiana de Letras.

2 comentários:

Sueli Soares, professora e advogada. disse...

O acesso a mais informações, propiciado pela Internet, revela o assombroso descontentamento do povo com os seus representantes. Ponho-me, agora, a pensar na força destruidora do cupim e do fogo.

Mara Narciso disse...

As modas andam bem assim. Quando um condena ou absolve, a primeira pergunta que nos ocorre é: quanto deve ter recebido para tomar essa decisão? Estamos vendo o lamaçal se aprofundar.