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domingo, julho 09, 2017

Sob a Espada de Dâmocles

Michel Temer nos traços de Jorge Braga (O Popular).






Sob a Espada de Dâmocles



Vão-se mais de dez dias da escolha, pelo presidente Michel Temer, da subprocuradora Geral da República Raquel Elias Ferreira Dodge para suceder o procurador geral Rodrigo Janot, o que colocou a Espada de Dâmocles sobre a cabeça do ocupante da principal cadeira desta malfazeja república de Floriano.

Nada de errado ao escolher o segundo nome mais votado, senão pelo compromisso espontâneo que assumiu de respeitar a escolha maior dos procuradores. Mas essa opção, perfeitamente legal e moral, não oculta a rejeição ao preferido de Janot, o subprocurador geral Nicolao Dino (que é irmão do governador do Maranhão, Flávio Dino, que se opõe a Temer). Ou seja, a mudança da promessa não compromete a escolha, apenas equivale a uma confissão de receios vários (ao que tudo indica).


Rodrigo Janot e Raquel Dodge (foto folhapolitica-org)

Sobre a conduta de Temer, duas vezes vice de Dilma Rousseff na Presidência da República, muito se ignorava, muito se especulava e as dúvidas não o recomendavam bem. É sempre inevitável compará-lo com Itamar Franco que, quando presidente, tinha por braço direito o ministro Henrique Hargreaves (da Casa Civil no governo de Itamar). O ministro, exposto em suspeita, afastou-se do cargo e declarou fazê-lo para facilitar as investigações, após as quais, sendo inocentado, retomou o posto.

Nos últimos dois anos e meio, essa história foi por demais lembrada, tantos foram os nomes de auxiliares do governo postos em evidência por suspeitas – e provas. E veio então a público a gravação de Joesley Batista, deixando à luz um pouco dos segredos de Michel Temer – não um ministro (como Geddel Vieira, Eliseu Padilha e Moreira Franco), mas o próprio presidente da República.

Ora, ora... Sempre me mantive respeitoso ao cargo e seu ocupante, ainda que discordante da linha política, dos feitos administrativos e do que nos chega como “o caráter” do homem público. Mas como respeitar o cargo quando seu próprio titular legal não o respeita? É o que nos passa o “rei da mesóclise”, o do discurso refinado dos primeiros meses (agora, seus discursos andam recheados de rancor, mágoas e ódios contra os que tomam conhecimento de suas malfadadas medidas com o dinheiro sujo das propinas e das barganhas, em prejuízo do Erário).

Em meio ao turbilhão dos fatos e das provas, ensaia Temer discursos alinhados com seu advogado Mariz, com seu assecla Marum (parecem nomes de dupla sertaneja) e outros áulicos. Viaja à Alemanha sob a borrasca das denúncias e novas ameaças, como a possível confissão, em pacto de colaboração premiada, de ninguém menos que o ex-deputado (e correligionário) Eduardo Cunha, reforçada pela mesma intenção do doleiro Lúcio Funaro, enquanto o ex-ministro Geddel Vieira se esperneia para tentar escapar da prisão.

No meio de tudo, há que se recordar o malfadado jantar com o ministro Gilmar Mendes, do STF, durante o qual – pelo que foi divulgado – escolheu-se o nome de Raquel Dodge para suceder a Rodrigo Janot. A escolha, está claro, é legítima, não fosse um leve indício – a preparadíssima subprocuradora geral costuma manifestar-se contrária a alguns atos ou medidas do procurador geral. Contudo, há mais a se considerar.

Raquel Dodge, goiana de Morrinhos, traz um belo currículo de formação escolar e práticas profissionais. O fato de discordar do chefe não faz dela alguém suspeita, alinhada com os erros que ultimamente marcam fortemente os inquilinos dos palácios brasilienses. O que se viu nos noticiários parecia apresentar ao Brasil uma pessoa capaz de alinhar-se com propósitos escusos, já que “caiu nas graças” de figuras antipatizadas pela opinião pública.

Mas que não se enganem! Ela detém uma biografia consolidada, cheia de feitos que bem a recomendam. Caso sobreviva aos feitos da Câmara dos Deputados e, talvez, do próprio Supremo Tribunal Federal, Michel Temer haverá de se decepcionar com uma profissional de sólida formação jurídica e moral. E o Brasil precisa muito de pessoas assim.

Essa é, parece-me, a Espada de Dâmocles sobre a cabeça de Temer.


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Luiz de Aquino é jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras.

3 comentários:

Sueli Soares, professora e advogada. disse...

Apenas uma palavra: irretocável! 👏👏👏

Ana Maria Taveira Miguel disse...

Luiz de Aquino, você é um brilhante comentarista político! Este seu artigo é 10!

Moema Brito disse...

Seu comentário me aliviou a alma! Tomara que sim!!! Confesso que não conheço nada do trabalho nem do posicionamento dessa senhora.