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quarta-feira, março 14, 2007

A Poesia esquecida


A Poesia esquecida

Pois é... Nada de novo! Ou melhor: Nada, outra vez! Serei mais claro: mais um ano e o Dia Nacional da Poesia (14/03) passou em brancas nuvens, em Goiás. A vocação agropastoril da nossa sociedade, reforçada agora pelos forasteiros que aqui afluem, na esteira das especulações do agronegócio, não é pretexto: o Rio Grande do Sul é, também, um estado agropastoril, mas o exercício poético, por lá, é tão ativo quanto por aqui o são as duplas de cantores sertanejos. O que não dizer, então, do agreste nordestino? E dos sertões de Pernambuco e Paraíba e suas cercanias?

Dia Nacional da Poesia! Tem nada não, é só para festejar o aniversário de Antônio de Castro Alves, nascido há exatamente 160 anos. Não fosse ele, o processo de abolição dos escravos teria outra vertente. Mas os afro-descendentes nacionais preferem referenciar Zumbi, o dos Palmares. Não pretendo, de modo algum, negar os méritos do grande líder dos quilombos, mas omitir Castro Alves é cuspir no prato...

O povo cubano tem como seu maior herói José Martí, guerreiro e poeta. Ou seja, as reverências a Che Guevara não significam se precisava importar um herói, não. Por isso mesmo, inúmeros logradouros e bens públicos de Cuba levam nome do poeta José Martí, desde escolas até o aeroporto, além de incontáveis estátuas. Em Goiás, desconheço poeta, ou qualquer outro escriba, que tenha sido imortalizado em bronze, a não ser José J. Veiga, cujos bustos (dois exemplares), concebidos e fundidos a meu pedido e por expressa determinação do governador Marconi Perillo, aguardam há mais de sete anos para serem exibidos. Um deles ocupará lugar de honra no complexo de bibliotecas do SESC de Goiás; o outro, deverá ser instalado no espaço que leva o nome do grande contista na grandiosa biblioteca do Centro Cultural Oscar Niemeyer.

Mas Castro Alves, esquecido pela descendência dos escravos libertados por sua poesia, tende a não ir além das poucas escolas espalhadas pelo país, por uma praça e um teatro em Salvador e alguma rua por muitas cidades; mas não me surpreende se alguém, sob uma placa de esmalte azul e letras brancas, indagar: “Quem foi esse tal aí?”. É que, mesmo que alguns conselhos municipais, hoje ditos câmaras de vereadores, tenham prestado justa homenagem ao Poeta dos Escravos, a vocação é relegá-lo ao esquecimento.

Fico triste. Muito triste! Em Goiás, já tivemos autoridade cultural que se referia aos poetas locais como “uma cambada de “fiés-da-puta” (sons of a bitch, em linguagem inteligível para brasileiros letrados). Vá lá: era, então, o primeiro governo pós biônicos e os do poder não engoliam bem os poetas.Nem mesmo o secretário da Cultura. Houve também quem se referisse ao “poetariado“ goiano como “aquela corja”. A gente engole... Afinal, fazer o quê? Quando nos dão o direito de votar, tentamos exercer a melhor escolha, mas nem sempre o gosto popular empata com o nosso. Repito: fazer o quê?

Poesia não enche barriga nem urnas (dizem que “eles” dizem assim). Poesia enche as cabeças, e isso é um perigo! Que o digam os coturnos da ditadura de 1964/85; que o digam os barões do café, que perderam seus plantéis de negros escravos. E, para avivar memórias, repito aqui os versos fatais de Castro Alves em “Navio Negreiro”, numa prece apaixonada à Bandeira Nacional:

Auriverde pendão da minha terra / que a brisa do Brasil beija e balança. (....) / Antes te houvessem roto na batalha / que servires a um povo de mortalha!”.

A data passou. Sem festas, sem palestras, sem eventos em escolas. Mas o ideal da Liberdade, não. Ainda que poético.

2 comentários:

Rui Afonso disse...

Boas tardes, Luiz.

Encontrei o seu poema Mudanças, que publiquei no meu blogue, num caderno de apontamentos de uma amiga. Irei descobrir onde o encontrou. Estará publicado em livro?

Entretanto, vi o seu blogue. E passou, claro está, a fazer parte da visita diária obrigatória. Com link, claro.

Um abraço e continuação de boa escrita.

Anônimo disse...

Bom dia poeta
Já havia feito várias visitas ao seu blogger, mas hoje fazendo uma releitura de poesia esquecida, devo admitir que faz muito sentido lwmbrar Castro Alves, no dia da poesia, no entanto é triste dizer, mas é verdade a inculturação é grande no nosso país "ELES" os nossos dirigentes querem o povo inculto(...)