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quarta-feira, julho 11, 2007

Um poema de Chico Perna

ABOIO (*)



Francisco Perna Filho



Oh, Jerusalém!

A Palestina sangra na menina dos teus olhos.

E pálida fica a tarde aturdida pelos canhões

amortecidos nos corpos espalhados pelo rio dos meus sentimentos.



Sentir o arranque do carro,

a distância da bala consumida pelo peito inocente da menina que

[vende flores em Copacabana.


Praga se faz aqui,

E em toda primavera nos sentimos invadidos

pelos soldados da incompreensão,

que marcham enraivecidos como os canhões na Praça Vermelha;

como os pássaros nas torres gêmeas;

quando as suas caras pálidas transbordam incertezas,

soldados que estão na própria máquina que conduzem.

Deuses do próprio umbigo,

amaldiçoados em rastros de ferro e fogo.




Famintos,

Os governantes desconhecem as águas na quais se banham.

Infelizes, não se comovem com o aboio da terra maltratada,

estriada, ressequida.


Infames, são a pura erva que mata o gado que somos.

Muitas outras dores passam a largo,

E não há remédio que possa acalmá-las.

Muitos outros gritos repercutem,

Como a mulher que grita desesperada

Pelas ruas de Bagdá.



Cavalos marcham em disparada.

Fora os ídolos!

Somente a idéia dos reis em marcha,

Os santos quebrados a cada um que se desfaz.


As aldeias estão às escuras,

A estrela não brilha mais,

E os homens gravitam no velho ábaco.


Olvidados o grito da terra,

Os sons metálicos das dores milenares,

e a menina órfã é rasgada como brinquedo de exploradores,

tão sedentos como os senhores da guerra.

Cravam-nas, as lanças, fardo de suas misérias capitalistas,

no corpo ingênuo da menina

de pernas finas,

bracinhos frágeis,

ventre deformado,

gestando o martírio de cana e etanol.


Oh, malditos!

Cearão a lama que produzem,

Nadarão nos tanques dos seus martírios.

Depois, embriagados chorarão a fome

A miséria da alma,

Os sons da fúria de uma cegueira ensaiada.


Oh, infames!

Visionários da própria destruição.

Acestarão os seus olhos para além do que podem entender,

E não enxergarão nada mais do que terra degradada,

Silêncio em decomposição,

Saudade e desmantelo

Na dor profunda do cerrado que se desintegra.


Ei boi! Ei boi! Ei boi!


(*) 3º lugar no Festival SESI de Artes - 2007

2 comentários:

Madalena Barranco disse...

Querido Luiz, sensível poesia - história de uma realidade que "quebra" nas esquinas de nossos olhos leitores... Parabéns pelo prêmio, mas por mim, você teria ganhado o primeiro lugar. Beijos.

Luiz de Aquino disse...

Obrigado, Madalena!

Reafirmo: o poema é do professor Chico Perna.