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sábado, maio 07, 2011

Gerações heterogêneas


Gerações heterogêneas


Manhã  de quinta-feira, a primeira de maio neste 2011. O século, parece, resolveu começar, pois já agimos com os olhos no futuro, em lugar de remoer o passado como se o tentássemos consertar. A obsessão pelo perfeito, dizem uns, é a meta megalômana do Homem que quer ser deus. Nossa missão é a de corrigir desvios, aparar arestas, lixar o áspero e esmaltar o fosco.

Mania estranha, essa, a de consertar o que nos parece torto ou errado. As coisas são como são e não nos cabe mudá-las: o que está feito, feito está. Mas nós temos isso: temos de dar um pouco de luz às trevas. Depurar o ar. Despoluir as águas. Educar os pequenos. Edificar o cidadão na personalidade de cada moço (obviamente, uso o masculino como raça, não como gênero).

Liga-me uma jovem poetisa, estudante de Letras; idealista, a moça se preocupa com a Educação, coisa que não diz muito respeito a algumas autoridades. “Os professores vão se manifestar na frente da Secretaria da Educação”, diz-me a jovem. Entendo que ela alude a um artigo meu, publicado na segunda-feira, 25 de abril, texto esse que senão mereceu atenção da Secretaria da Educação do Estado – o secretário deixou-nos sem resposta; sua assessoria de imprensa esticou a quaresma, fazendo silêncio. Professores do Estado, e alguns municipais, apoiaram meu texto, telefonaram-me, comentaram comigo nas escolas, escreveram.

Fosse há quarenta anos – o tempo em que eu era universitário – e os centros e diretórios acadêmicos teriam se manifestado contrários ao fechamento puro e simples de salas de leituras, bibliotecas, laboratórios de informática e outras iniciativas extra-classes. Sempre soubemos que educação e ensino não se dá somente na sala de aula.

Coincidentemente, um e-mail me traz um PPS, montagem em texto e fotos, em que o escriba, da minha geração, analisa os tempos de nós jovens e o de agora. Dentre tantas frases ótimas, pincei esta: “Eu pertenço a uma geração que estudava pra ficar culta e vencer na vida. Não pra ficar esperta e ganhar a vida”. O autor é José Roberto Palladino (não resisti e bolei o trocadilho: esse José Roberto não nasceu “pá ladino... Ih, ficou infame! – para usar uma expressão da nossa geração).

Movimento de professores contra o retrocesso nas escolas. Poeta intuitivo a proclamar pelas ruas sua superioridade (?) sobre todos os mortais, comuns e incomuns; a morte do Bin Laden a matar nossa sede de sangue; o casamento do príncipe William a preencher carências afetivas, amorosas e até mesmo sexuais de milhões de imbecis pelo mundo afora, agora; a inflação ameaçadora sobre nossas cabeças, corroendo nossos bolsos; a barbárie nos estádios e nas ruas.

Volto ao umbigo e cuido de letras. É por elas que expresso meus sentimentos, acentuo a sensibilidade dos meus sentidos, expresso-me em amor e brabeza, aplaudo e protesto.

Vejo a Festa Literária de Pirenópolis, finalmente, chegar a Goiás, com o governo estadual abraçando a causa – enfim, Pirenópolis começa a voltar para Goiás, para alegria do prefeito Nivaldo Lima, bem acolhido pelo governador Marconi Perillo, homem de ação e decisões (ano que vem, certamente haverá mais escritores goianos no decorrer dos eventos).

Manhã feliz, aquela de quarta-feira no Palácio das Esmeraldas. Tempo de encontrar gente nossa, parentes e amigos pirenopolinos; de conviver com as organizadoras brasilienses; de prestigiar Gilberto Mendonça Teles – o mais notável dentre os goianos atuais. E de encontrar Olímpio Jayme, ele que, com o inestimável auxílio do escritor Luiz Alberto de Queiroz, trouxe-nos o livro
“Olímpio Jayme – política e violência em tempos de chumbo”.

O livro é um belíssimo documentário, com artigos de notáveis personalidades da vida pública goiana desde a década de 1940 aos nossos dias. Farta e rica documentação fotográfica mostram Olímpio desde seus tempos de aluno liceano, quando presidiu o Grêmio Félix de Bulhões, formando-se em 1946 – o ano do centenário do tradicional educandário fundado pelo Barão de Ramalho.

Folheio esse livro; recordo a voz e a fala da jovem Ana Cristina, poetisa e aluna de Letras (PUC); recito a frase de José Roberto Palladino; analiso a vida turbulenta e conflituosa de Olímpio Jayme, covardemente cassado pelo AI-5, numa atitude do presidente general para agradar o  governador, magoado com o talento político superior de seu adversário.

Realmente... A nossa geração, a dos nascidos nas décadas anteriores ao golpe militar, é diferente.

O que há com a safra atual, hem?

* * *

Luiz de Aquino é jornalista e escritor.

6 comentários:

Maria Dulce Loyola Teixeira disse...

Luiz, realmente, existem duas comunidades brasileiras (sem exageros) a que viveu antes da Ditadura e a depois dela. Ainda, ontem conversando com uma pessoa que considero "pé ladino", fiquei absmada com a confissão dela, mas depois entendi. Ela afirmava que foi saber que podiam votar para Presidente já na faculdade, porque era proibido falar do passado democrático do Brasil.

Klaudiana Rodovalho disse...

A Educação, neste momento, passa por transformações perigosas. A inversão de valores, como já conversamos, traz a impressão de que escola , professor, livros são elementos dispensáveis. Mas reafirmo sempre que toda esta tecnologia existe porque num passado recente pessoas de visão e com oportunidade de terem acesso ao conhecimento produduziram mais conhecimento para chegarmos ao estágio em que estamos. Como existiria calculadora sem termos tido anteriormente a teoria dos logarítmos? Alguém se dispos a ter garra e desenvolvê-la.
Hoje entendo a importância da geração anterior à ditadura, tem uma energia contagiante para buscar o melhor por tudo que prentende fazer. São pessoas de pensamento positivo, que não se intimidam com qualquer contratempo. Buscam vencer e crescer em qualquer tempo, são pessoas de qualquer tempo. Compreendem as novas tecnologias e as utilizam para se desenvolverem sempre. O segredo dessa geração é este, não acreditam que chegou a hora de parar, não se escondem do mundo, pelo contrário, continuam a transformá-lo.
Sou uma professora jovem, em início de carreira, mas tive a grata oprotunidade de conhecer pessoas tão especiais, que têm me ensinado e mostrado a necessidade de não desanimar diante desta confusão em que se encontra a educação. Será que fecharão nossas bbliotecas? Será que nossos laboratórios de informática ficarão abandonados? Onde eu trabalho, o Lyceu de Goiânia, a dúvida também grita entre nós, causa insegurança e toda a comunidade Lyceana segue atônita diante de tanta incerteza.
Autoridades, quem lhes pede explicações são pessoas sérias, honestas, cultas, que fazem da Educação sua vida! Até quando a Educação será apenas política, apenas tema de palanques, até quando?!
Klaudiane Rodovalho

Benevides de Almeida disse...

Luiz de Aquino,
Não vejo suas crônicas no blog, por ser onde elas correm o risco de ter um sentido de vulgarização. Eu as leio no jornal, porque aí, sim, há uma identificação real do seu talento do qual muitos de nossa convivência comum morrem de inveja.
Além disso, é mais nostálgico. Qualquer um pode criar um blog e escrever a besteira que quiser. Já no jornal, não: tem que ter bagagem para ser uma articulista permanente como você o é. Quem não tem competência, que escreva sua opinião para a seção Carta do Leitor. Eu até sugeriria ao amigo que só postasse sua crônicas no blog depois de publicadas no jornal. Desculpe-me pela ousadia dessa intromissão.

Lauro Henrique de Oliveira disse...

Parabéns pelo texto Gerações Heterogêneas!
Fico muito triste em constatar o quanto os nossos jovens andam perdidos na sociedade dita como "moderna", e ainda mais em ver como Goiás tem sofrido constantes retrocessos na Educação, sou professor da rede Estadual de Educação e infelizmente no colégio que trabalho não está funcionando nem a biblioteca e muito menos o laboratório de informática, e pensar que eram há pouco tempo os espaço mais frequentados pelos nossos alunos!
Um grande abraço!

Lauro Henrique de Oliveira

Mara Narciso disse...

Sim, Luiz, somos diferentes em tudo, pois tivemos outras experiências e desafios, mas não concordo com sua opinião de que fomos melhores. Discordo porque jovem é curioso, aprende fácil, tem boa memória, desbrava campos estranhos com facilidade. Os de hoje são quase outra gente. Para mim as exceções reforçam a regra.

Anônimo disse...

Preferido poeta, A safra atual, qd bem criados...digo," Filhos bem criados, prazeres dobrados"...já dizia minha falecida mãe!"...Abraços fraternais para vc e sua bela família. E então qd será o lançamento do próximo livro?...Nós, seus leitores assíduos, estamos aguardando anciosos!.Ireci Maria.