Ficha
suja, mas limpo no SPC!
Semana de correr
demais, mais que o trivial, tentando solucionar problemas, produzir textos,
abrir novos trabalhos (debalde) e pensar que a sobrevivência está mais
complicada hoje, nestes tempos de tantas maravilhas tecnológicas. Não temos
mais o encanto das noites escuras quando esperávamos que o brilho das estrelas
nos despertasse o encanto. E nas noites de luar, esses tais hormônios de
alegria e de bem-estar, capazes de nos conduzir aos sonhos. Havendo um violão e
uma bela voz e alguém a quem despertar com acordes e versos, haveria serenata.
Alguém dentre os meus leitores amigos, com peso e
coragem para pedir ou cobrar, conhece o sr. Jayme Rincón? Já lhe mandei mil
recados, notas de jornais, crônicas inteiras e acreditei que atenderia –
afinal, ele queria ser prefeito. Mas como votar num candidato a prefeito que,
como gestor de grandes obras, não consegue sequer mandar que algum subalterno
providencie as placas de identificação da GO-225, a Rodovia José J. Veiga, que
liga Pirenópolis e Corumbá de Goiás?
A vida moderna
pede noites artificialmente iluminadas. E por isso ficamos sem o cintilar das
estrelas e o luar já não nos desperta as paixões. As serenatas não há mais. Os
cantadores perderam o romance. Os poetas trocaram o declamar ao sereno pelo
dedilhar nos teclados. Mas, ah, que vontade de reviver serenatas sob um céu de
límpidas estrelas, de luar prateado e ostensivo, o corpo leve sob a ação desses
delírios românticos!
A nação se sacode em muitos pontos, muitos,
protestando contra o afastamento da Dama Gastadora. Normal... ninguém quer
perder poder e o substituto não se cerca de confiáveis. Fico intrigado: por um
cheque devolvido no sistema bancário, uma prestação com pagamento atrasado e
outras ocorrências similares um cidadão comum, pagador de impostos, pai da
família ou gerador de empregos fica com “o nome sujo”, tem seus créditos
suspensos e é olhado com desconfiança.
Claro, isso de se exigir ficha limpa é coisa “de país
com bom ordenamento jurídico” e outras falácias conceituais. Claro está que só
se aplica aos trabalhadores corretos, empregado ou patrão (que não patrocina
campanhas nem distribui propinas).
Há anos, muitos
anos, escrevi uma canção, musicada pelo saudoso José Pinto Neto, decantando uma
serenata à mulher amada...
Vejo o seu rosto moreno
mais alegre que o luar.
Faz um aceno e um sorriso (como é puro!)
se despede no escuro Ai, que
vontade de ficar!
Entre uma canção e
outra, um poeta erguia a voz e declamava versos de amor, exaltando a beleza e a
postura da amada. Buscava poemas conhecidos, ia aos românticos e aos
contemporâneos, Álvares de Azevedo e Gonçalves Dias, Castro Alves e Cassimiro, ou
recorria a Bandeira, Vinícius, Drummond, Paulo Mendes Campos, Brasigóis,
Aidenor, Joaquim Machado, Yeda Schmaltz, Sônia Elizabeth...
Mas um cidadão cheio de votos ou padrinhos – suspeito de
mandar matar, apontado como recebedor de propinas, como aliciador de
autoridades, notório praticante ativo de escravidão, peculato, desvio de verbas
públicas e outras sujeiras mais – é nomeado ministro ou líder em Casa do
Parlamento sob a justificativa “Ele ainda não é réu”.
A serenata era a
confissão sem constrangimentos do sentir e do desejo. Era a boêmia em
exercício, coisa de quem separava as horas de trabalho e estudos e se dedicava
à construção de seu futuro calcado no amor com responsabilidade. Acabou-se! O
amor não pede mais serenatas, sustenta-se nas conveniências.
Ao mesmo tempo, os
homens públicos construíam-se sob a luz das leituras e do aprendizado da
História e dos compromissos com a sociedade. Era o tempo em que política
existia para o bem-servir. Acabou-se. Quando mais suja a ficha, mais firme é a
corda do alpinismo político!
(Mas, por favor,
Jayme Rincón, mande repor as placas da Rodovia GO-225).
*****
Luiz de
Aquino é jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras.
15 comentários:
Mara Narciso disse...
A placa sumiu junto com o amor que era movido a serenatas. No rastro do sumiço das boas coisas, amontoam-se políticos não confiáveis. "O mundo é tão errado!" (John Lennon)
Esplêndida sua crônica, amigo Luiz De Aquino! Está tudo muito complicado e confuso.
Fico besta!
👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼👏🏼
👏👏👏👏Entendo perfeitamente
EITA, PRIMO, NINGUÉM ESTÁ PENSANDO NO BEM COMUM.
Exatamente assim!!!
Maravilhosa leitura, Mas não vejo nada complicado, confuso. Aliás, tudo é muito claro: existem as pessoas que trabalham, pagam impostos e são honestas. Se devem tem que pagar, ou ficam sendo torturadas por um serviço especializado em sujar seu nome, e ameaçar, como assegurar aos comerciantes que não esse cidadão não é bom pagador. E esse mesmo órgão não impede as pessoas de sonegar impostos, a ter uma movimentação bancária que não condiz com seus patrimônios e sua renda mensal. E são milhões em saldos. Para estes não há lei. Não existem cobranças nem ameaças, porque vivem fora da lei. Ao meu ver, esse serviço é um desfavor à sociedade que sustenta este país honestamente.
Verdade!
Esse é o NOSSO PAIS.
Vamos atender, senhor presidente...
Bem assim!
São eles que elaboram as leis que os elevam ao trono dos deuses, ou acima deles.
É chegada a hora, poeta, de darmos as mãos na luta contra os privilégios dos políticos. Além de altos salários, somos obrigados a ofertar-lhes auxílio moradia, tarifas postal e telefônica, gráfica, combustível, 20 funcionários, automóveis, motoristas, auxílio enxoval (roupas-pasmem!). Some-se a isto tudo, aposentadoria integral sem fator previdenciário com 8 anos de serviço(serviço???), jornada de 3 dias de trabalho por semana (sem cobrança de cumprimento de horário), recessos parlamentares (muito cansados!), IMUNIDADE PARLAMENTAR, inobservância de escolaridade e nada consta para exercício do cargo, quando os concursados têm que provar total idoneidade, e,como se não bastasse, os "presentes".
Ah, já ia me esquecendo: passagens aéreas!
Ah, poeta, ainda temos que chamá-los de EXCELÊNCIAS, independentemente da idoneidade ou formação deles, apesar de toda nossa bagagem cultural. É, no mínimo, revoltante!
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