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sexta-feira, fevereiro 13, 2009

Dia de chorinho. E lágrimas!

Luiz de Aquino

 

Perdi a conta das vezes em que louvei as sextas-feiras, enfocando as noitadas de chorinho na calçada do Grande Hotel. Boa música, excelentes instrumentistas e a chance de encontrarmos velhos amigos dos tempos em que o Grande Hotel era, realmente, um hotel. O ambiente era tão bom e saudável que, aos poucos, os universitários e, depois, os adolescentes elegeram o lugar como ponto de encontro.

Certa vez, já ao final da função, uma agente da SMT liberou a pista para os ônibus quando ainda havia muita gente por ali, expondo-os ao risco de atropelamento. Reclamei, e a moça fardada acenou para um sargento da PM; felizmente, o militar percebeu que eu não a desacatava, ou eu poderia ter levado um murro na cara e ser algemado, como aconteceu com o estudante que festejava aprovação no vestibular, terça-feira última, no Parque Vaca Brava.

Pois bem. Há meses que não vou ao chorinho do Grande Hotel. É que, da última vez, senti por lá o peso da infiltração de agentes policiais, pois o consumo de maconha era notório. Como eu, muitos companheiros de mais idade (alguns com a idade de meu pai, ou pouco mais) passaram a evitar aquela festa. Na minha primeira ausência, ou seja, dia 8 de agosto de 2008, um moço de vinte anos, estudante de Direito, foi assassinado no trajeto entre o Grande Hotel e o Goiânia Ouro, onde ocorria um xou com o fantástico Luiz Melodia.

Eric, carioca, viera para Goiás com a mãe, Dona Regina, em busca de qualidade de vida, isto é, fugiam das balas perdidas na Cidade Maravilhosa. Aqui, ao ver um amigo sendo assaltado, tentou interferir e foi golpeado à faca por um dos assaltantes. Ato contínuo, enquanto Eric perdia a vida no asfalto da Rua 3, seus algozes refugiavam-se na casa da namorada de um deles (um apartamento no Edifício Sofia).

A PM chegou a tempo de ouvir a informação dos amigos de Eric: os bandidos estavam naquele (indicavam) apartamento. Mas um dos militares alegou não poder prosseguir, pois não tinham mandado judicial. Poxa, gente! Um homicídio acabara de acontecer, os dois bandidos envolvidos estavam ali, ao alcance, era flagrante! Mas...

Um sujeito foi preso estes dias, em Goiânia. Ele é o tal que enfiou a faca em Eric. Seu advogado, logicamente, tenta um hábeas corpus para o facínora. A mãe de Eric clama por justiça. Hoje, no começo da noite, ela vai ao Grande Hotel, onde sequer acontece o chorinho. Vai levar suas lágrimas de mãe que perdeu o único filho varão, um moço feliz, estudante e trabalhador. Do Grande Hotel, seguirá até o Goiânia Ouro, cumprindo o mesmo trajeto do filho. Vai ver os jovens freqüentadores da noite no centro histórico.

Esperemos que o assassino de Eric não tenha conseguido a liberdade. E que outros marginais não interrompam sua caminhada. E que nenhum tenente da PM, sem o esperado preparo emocional para a função, obstaculize sua marcha em busca de Justiça.

 

Luiz de Aquino é escritor, membro da Academia Goiana de Letras. E-mail: poetaluizdeaquino@gmail.com

4 comentários:

Mara Narciso disse...

John Lennon resumiu as injustiças humanas numa frase que pode ser traduzida de forma livre assim: " O mundo é tão errado!" Isso foi na música "Imagine". Quando fico embasbacada, sem palavras, e como não consigo de forma alguma não me pronunciar, falo ao mundo esse lamento. Tornou-se clichê reclamar da banalização da violência e da morte por acaso, numa intervenção em assalto. A toda hora acontece algo assim. Ouvimos, sabemos, mas não dá para não nos indignarmos. Precisamos fazer algo, mas o quê?

Efigênia Coutinho ( Mallemont ) disse...

Numa sexta feira super ensolarada, depois de uma praia muito gostosa, chegar em casa tomar um delicioso banho de espumas, com aromas de benjoim, e depois abrir o Micro, e ler suas crônicas, é ter um final gloriosos de sexta feira. QUERO O FIM DOS CARIMBOS, é uma realidade urgente, resta-me cumprimentar você, desejando um bom fim de semana, com admiração,
Efigênia Coutinho

Anônimo disse...

E o chorinho entrou pra crônica assim como Poncio Pilatos entrou pro Credo, mas concorgo com você que o público-alvo foi completamente afastado... e com ele a coordenadora aqui. Beijos!!!

Marley

Anônimo disse...

Li suas três últimas crônicas. Todas mostram a seriedade com que expõe as opiniões. Gosto muito de pensar e sentir com você, porque nos assuntos há propostas para a nossa comunidade, há resgate de fatos idos. E há sentimento, emoções, o compadecer-se com o outro.
MEUS VALORES INTOCÁVEIS: é nossa obrigação o cuidar de nossos valores e riquezas.
QUERO O FIM DOS CARIMBOS: concordo, Lu, chega, chega de tanta burocracia.
DIA DE CHORO E LÁGRIMAS: até quando, tanta dor, tanta miséria humana! Um dia, li em uma lápide "Que dor, meu filho!" Depois, um conto meu levou esse nome,
quando contei a história de uma mulher e sua grande perda.
Até! Um beijão.
Maria Helena