Acinte
à liberdade
Vejam a página especial "Jorge Braga vs Censura" em https://www.facebook.com/pages/Jorge-Braga-vs-Censura/1526336870988696?fref=ts
A pirracinha exercida
pelo prefeito de Goiânia contra o cartunista Jorge Braga ganhou corpo além do
piti. O alcaide, que se projetou por ser vice de Iris Rezende Machado,
assumindo a cadeira quando o titular renunciou, sob o guarda-chuva do grande líder,
elegeu-se em mandato próprio. Foi o que bastou para que, uma vez no tablado, se
sentisse a Estátua da Liberdade. Ou o Cristo Redentor.
O sucesso
subiu-lhe tanto que passou a desconhecer pessoas a quem chamava pelo nome –
como eu (certamente, dirá que nunca me viu nem ouvir falar em mim, e isso não
me surpreende). Arrogante, ou petulante, exige desculpas por ter sido chamado
de Sargento Garcia pelo chargista de O Popular. E daí? Seu sobrenome é Garcia,
sua origem é espanhola e ele tem, sim, postura de sargento de caricatura –
menos simpático que o Sargento Tainha de um gibi fora de circulação, o Recruta
Zero, mas de fato mais próximo do eterno inimigo do Zorro.
Foi muito infeliz
o prefeito com mais esse rompante de autoridade. Aceitasse a crítica ou a piada
e tudo seria passado antes das seis da tarde – hora em que os boêmios costumam
deixar os afazeres da sobrevivência para, de fato, viverem. Jorge Braga é um boêmio,
eu sei bem. Já dividimos milhares de horas de bares e bate-papo, somos
parceiros desde o meu livro de estreia, há quase 40 anos, acompanhei-o em
várias de suas publicações, como revisor e autor de textos, ele compartilhava a
minha família – não me refiro à que constitui, mas a de minha origem – a ponto
de ter cama cativa na casa de meus pais.
Centenas de
manifestações favoráveis ao desenhista vieram de todos os cantos do Brasil.
Somente em Goiás ele foi discretamente tachado por alguns colegas como sectário
ou algo parecido, pois (como disse o prefeito) ele poupa o governador de Goiás.
Mas um dos que assim o qualificaram ressaltou ser este um direito dele – fazer escolhas.
Concordo.
Jorge Braga
desfruta de um prestígio invejável, para muitos. Tem a simpatia e o apoio de
Ziraldo, que o trata como filho. Várias vezes trouxe o autor do Menino
Maluquinho a Goiás, como também trouxe aqui Paulo Caruso, Ique, Luiz Fernando
Veríssimo, Gougon, Jaguar e o saudoso e muito querido Henfil. Conheci todos esses
ídolos do cartum e da inteligência nacional, pessoas que – mesmo professando
ideologias diferentes – tiveram em comum a luta pela independência, pela
liberdade de expressão e pelo fim do arbítrio que manchou nossa história por
mais de vinte anos.
Além das pessoas
do traço, muitos da música, das letras, das artes plásticas, do teatro etc. e
tal pugnaram sistematicamente pela volta à democracia. E muitos são os que,
ocultados sob as saias de suas mães e o rigor de seus pais que não queriam seus
filhos envolvidos com comunistas, surgiram depois de “o dia raiar / sem lhe
pedir licença” – como cantou Chico Buarque – apareceram do nada e posam de
democratas.
Só que estes
democratas de improviso, sem formação ao rigor do arbítrio (democratas de
ouvir-dizer) alcançaram posições de destaque e agem como quem busca o poder tal
como (repito) ouviram dizer que era, no tempo dos coturnos.
Um dos que lutaram
por esta liberdade democrática é o poeta Brasigóis Felício, de quem colhi um
pequeno e versátil texto, feito agora há pouco. Leiam:
“Político implicar com ou perseguir humoristas e chargistas,
cercear o riso, obstruir a alegria da sátira, e a necessidade da crítica é uma
fria sem tamanho. Insofismável demonstração de intolerância e burrice. Quanto à
crônica, gênero esnobado por quem não consegue praticá-lo com mínima
competência e sensibilidade, é como a poesia: ninguém tem necessidade, não tem
utilidade alguma, mas os leitores inteligentes não conseguem passar uma visita
costumeira a este parnaso inefável onde jornalismo e poesia dão um biscoito
fino para manhãs ou tardes”.
E, como Vinícius
de Morais, dou os trâmites por findos (em O Dia da Criação).
* * *
Luiz de
Aquino é jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras.
9 comentários:
Dom Luiz De Aquino Alves Neto, excelente, essa crônica, embora o nome desse imbecil não merecesse tamanho protesto, em face a tamanha burrice. Ele só será lembrado, futuramente, pelo péssimo mandato exercido à sombra do Iris e pela incompetência em cristalizar seu nome como político.
Muito boa, Luiz, Como o alcaide foi ingênuo!!!! Nesta época atual, em que o mundo todo se revoltou com o atentado ao C.H., admira-me que alguém tenha coragem de se manifestar contra uma charge, como a do Jorge Braga.. Acredito que nosso prefeito esteja arrependido. Baita gol contra.
Grande Luiz de Aquino. Como sempre, um texto sem correções ou acréscimos. A crítica no justo tamanho. Jorge Braga é quem merece ser respeitado pelo Prefeito.
Excelente seu texto.
Quando a gente vê, mais um disparate desses papagaios de piratas, ser respondido com tamanha lisura e competência, sentimos renovar a nossa fé no futuro dos nossos netos. Seu brilho é norte pra todos nos, meu amigo.
Meu poeta!
Luiz, um "Um Cravo bem Temperado".Aproveito o título que Bach deu a uma de suas perfeitas composições musicais e venho falar não apenas de Acinte à liberdade como também das crônicas que ultimamente o têm inspirado. Crítico, observador, atual,tudo na dose certa, prendendo a atenção de quem o lê e se vê tentado a se render aos seus argumentos "bem temperados".
Luiz de Aquino,
obrigado pela sua crônica, que me pôs a par de uma dessas besteiras que ocorrem, de vez em quando, em Goiás. Estou solidário com Jorge Braga, a quem admiro e a quem devo alguas exclentes caricaturas. Abraço do Gilberto Mendonça Teles
É preciso manter a coerência como crítico e como criticado. Dentro dos limites do bom-senso, as sátiras são bem-vindas.
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