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sábado, junho 24, 2006

Copas, Conselho e Cultura

No céu quase inteiro, total azul; miúdas nuvens-carneirinho arrebanhavam-se no horizonte sul. Manhã de alegria na semana mal começada, a cidade em amarelo-ouro teimoso e feliz: esperança madura.

Pensei, curioso: quem deu à esperança a cor do verde? Esvai-se o verde, porque é junho e é seca no Planalto Central, pátria do cerrado. E o cerrado é marrom, observou Gil Perini, o contista. Busco o verde e ele é soja no chão do outrora cerrado, e a soja cai de preço, desespera o produtor.

Lembro as estradas bloqueadas pelos fazendeiros: queriam perdão de dívidas. Conseguiram, é claro. Um soldado da polícia, em Caldas Novas, orientou-me a escolher Ipameri para chegar a Goiânia e a viagem esticou-se: fiz duzentos e sessenta quilômetros, cem a mais.

Fazendeiros podem. Empregados de fazendeiros, não. É a democracia das duas medidas, a mesma que já se fez de omissa quando taxistas linchavam suspeitos. Esses podem. Depois, quando os vândalos sem terra quebraram a Câmara Federal, os mesmos que estimularam a ação dos fazendeiros gritaram sua revolta no púlpito do Congresso. Fazendeiros podem.

Volto ao verde e questiono a esperança. O verde está também na copa das árvores das ruas que os homens vestidos de verde, assalariados do departamento de Parques e Jardins de Goiânia derrubam a esmo. Goiânia perde rapidamente suas árvores desde o começo do atual governo municipal, e de nada adiantam as queixas populares. A Creche São Domingos Sávio, na Avenida Couto de Magalhães, perdeu quase todas as árvores de seu pátio, e a creche é da Prefeitura.

Verdes estão todos os canteiros onde antes havia flores de todas as cores. Cadê nossas petúnias bicolores? O prefeito não gosta de flores. Mas nós, os pagadores de impostos, gostamos. E pensar que se dizia que em Goiânia a Primavera tem doze meses!

Volto ao céu azul, outro símbolo de esperança e liberdade. Azul como o campo central da Bandeira Nacional, agora tão popularizada que está em todas as paisagens, tremulante em cada partida, agitada em cada grande jogada de Ronaldos e parceiros. Ordem e Progresso... As pessoas não lêem? Deviam.

Sem ordem e sem critério, a mesma prefeitura de Goiânia sofreu a vergonha de ter uma conferência de cultura anulada e seu Conselho Municipal de Cultura foi considerado, pois, pela Justiça, ilegítimo. Tudo porque nesta gestão municipal reinstalou-se o mau hábito do tempo do arbítrio de fazer as coisas sob o interesse dos que detém o mando e, obviamente, à revelia da Lei.

Sabemos que eles, os que detêm o mando, não se importam com essas banalidades legais. Mas deviam dar atenção à dignidade daqueles que aceitaram integrar esse Conselho. São artistas e intelectuais de boa-vontade, gente disposta ao trabalho mal remunerado de gerir a política de cultura. Mas é estranho também que esse Conselho seja presidido pelo Secretário de Cultura, vício também herdado dos tempos de arbítrio e que, num momento de insegurança, a gestão anterior definiu assim, sem pensar que fazia o gosto do atual secretário. Um Conselho que, em lugar de fiscalizar, só tem atuação para referendar atos do titular da Pasta.

Como se vê, apesar dos quatro-a-um, apesar da alegria nas ruas, da natureza benfazeja e das nossas esperanças, Goiânia caminha para a tristeza. E ainda surge um áulico a criar poema medíocre pedindo lagos artificiais.

Que venham, sim, as árvores e as flores. E o respeito às leis e à ética.

17 comentários:

Deolinda disse...

Parabéns, Luiz!
Nada mais pertinente que analisar quem pode tudo e quem não pode nada nesse país de tanta injustiça e falta de vergonha.

Quanto a anulação a CONFERENCIA MUNICIPAL DE CULTURA de Goiânia, nada mais resta aos gestores de públicos que tenham um pouco de dignidade e desfaçam todo esse embrólio que se meteram desnecessáriamente!

Anônimo disse...

Luiz querido, responda-me só as perguntas: O Instituto do Livro existe? Você saiu do Conselho Municipal de Cultura porquê? Cultura tem partido político? Você conhece Pierre Ansart? O que acha do pensamento dele a respeito da história e memória do ressentimento? Como adverte Ansart, o ressentimento não é só um conjunto de valores, é algo mais do que isso. Pensado como ferramenta analítica, o ressentimento faz parte de um sistema teórico que procura compreender as forças de oposição presentes nos diversos tipos de relações interiorizados nos indivíduos e em seus grupos: a dominação, a subordinação e a insubordinação que acompanham as revoltas políticas e sociais, aquelas que fazem história e memória. O ressentimento, desse modo, é tratado como um impulso à transformação das realidades. Toca uma questão sensível para a compreensão das relações entre os afetos e o político, entre a sociedade e o Estado.
Conhece o pensamento de Theodor Adorno sobre a indústria cultural e de como as artes podem ser manipuladas como bens culturais e vendidas como mercadoria? "Goiás é bom demais!"

Luiz de Aquino disse...

Carolina,
Não conheço Ansart nem Adorno.

Bem, o Instituto do Livro (estadual) existe, formalmente, sim, mas não vi ligação em sua pergunta.
Acha-me ressentido? Em termos, sou, sim, mas não que isso me determine a vida. Não me admito omisso, por isso comento essas malversadas ações "oficiais".

Deixei o Conselho porque não entendia ele ser formado de pessoas desligadas efetivamente do processo das políticas de cultura e por não concordar que o mesmo fosse presidido pelo secretário - senti-me como alguém que estaria ali agindo sob constrangimento.
Quando a partidos políticos e cultura... Não vejo ligação alguma, também. Há pessoas ligadas a cultura, sim, e outras não, mas os partidos políticos não se definem sequer em sua própria meta, quanto mais no que se relaciona com ações de cultura.

Obrigado por comentar.

Anônimo disse...

Luiz...
Um imenso silêncio dentro de mim. A palavra, rebelde, parece negar-se às minhas letras. Mas, ainda assim, tentei escrever algo, afinal, nossa alma carece de poesia... Meu beijo de carinho e saudade.
Beijos
Marisol

Anônimo disse...

Querido Luiz, na minha ignorancia, sempre pensei que cultura fosse tudo aquilo que uma sociedade em um dado momento fizesse transformando isto em costumes e habitos. E que um bom escritor eh aquele que sabe retratar bem e com elegante clareza, atraves de sua pena esse momento , usando eh claro ,todos os meios literarios disponiveis .
Mas lendo o comentario de Carolina Becker, cuja pessoa,infelizmente , nao tive o prazer de conhecer penso agora que sempre estive errada, e que cultura e alguma muito complicada ligada diretamente ao poder politico .Estou certa?
Assim como voce, nunca ocultei a minha angustia e aversao ao ver os detentores de poder manipular grupos , coisas, e bens publicos em detrimento da populacao. Assim parabenizo voce mais uma vez pela fala denunciadora , que vem muito bonita, clara, limpida, elegante e criativa, neste poema alegrando-nos nesta manha de domingo. Um beijo.

Anônimo disse...

Adoro tudo que escreve, amigo..
reencontrar-te foi gostoso, porque
reencontrei um poeta amigo..
Beijinhos

Deolinda disse...

Luiz, vamos fazer uma pequena aposta?Quem será Carolina Becker? Ou Pierre Ansart?
Aposto que começa com "M" e você vai de quê?
Antes que esqueça... O DM colocou a sua crônica bem oculta, para não fazer sombra a propaganda do Prefeito de Goiânia.
beijos

Luiz de Aquino disse...

Já identifiquei, Deolinda. Encontrei, no Orkut, várias Carolina Becker legítimas, e nenhuma delas era a signatária; mas a pessoa deixou muitos rastros...
rs.
Luiz de Aquino

Luiz de Aquino disse...

´PARA MARTHA NASCIMENTO:

Martha, não só o nome da signatária me soa falso como, também, seus argumentos. Por mais que transpareça boa intenção, ela tentou, sim, atrelar-me ao partido do ex-governador Marconi Perillo (este, sim, um verdadeiro realizador nas coisas da Cultura), o que não consegue (porque admiro Marconi Perillo e seus feitos, mas nada tenho a ver com seu partido); muito menos consegue provocar-me quanto à linha partidária do prefeito Iris Rezende Machado (o cortador de flores e árvores, além de podar iniciativas culturais) e não foi à toa que citou, entre seus teóricos preferidos, o filósofo Theorod Adorno (coincidentemente, tem o mesmo sobrenome do secretário Kleber Adorno). A pessoa que se oculta sob esse pseudônimo serve, de perto, o sistema administrativo da Prefeitura de Goiânia e, parece (já que se oculta) que se envergonha; eu sirvo o governo estadual e tenho certo orgulho disso, pois participo do processo de divulgação dos feitos culturais de Marconi Perillo e Alcides Rodrigues. E meu compromisso direto, como escritor e jornalista, é com a produção cultural. E no âmbito do Estado de Goiás, isso se faz a contento.

Obrigado, Martha!

Deolinda disse...

Pois é,Luiz,"Becker" “Ansart” (pretensiosa a M, hem ?) esqueceu de fazer uma leitura mais acurada das resenhas que copia da internet mas tudo bem. O que interessa a analisar que uma vez escolhido o enredo, a experiência da história costuma se resolver pela exposição dos mitos, e florescem sim, os ânimos ressentidos, incitando a coletividade, promovendo a adesão das forças sociais, convocando para a montagem da peça.
Desde que Adorno (não o filósofo, mas, o autor da tese de doutorado contestada) insultou, insinuou, censurou, desonrou, ridicularizou, intimidou, puniu, inflamou ódios recônditos, expôs a alteridade política ao grotesco, valorizou negativamente, para expressar uma idéia e efetivá-la como prática política, como resposta descobriu que a sociedade não é invulnerável e não é ordenada apenas pela força e coerção.
E neste caso, o (res) sentimento pode incitar as mudanças e para melhor.
E cultura não tem partido político e no caso de Goiás, também perdeu a vergonha quando desde os primórdios das instituições, aderiu-se a prática da troca de favores.
beijos

Anônimo disse...

Senhor Luiz; Saudações preservacionistas- De Goiânia recebo aqui no Estado de São Paulo, comentários referentes às questões do Conselho de Cultura do Municipio, e com eles a eterna irresponsabilidade do Poder Público. Meu empenho, quanto a defesa e salvaguarda do patrimôni edificado, contou sempre com minha formação da área jurídica. Solicito sua atenção para que possa me informar como obter cópias do processo que faz referencia a notícia. Sempre grato por sua atenção. O abraço antigo restaurado pelso nossos ideais. Carolino Francisco.

Luiz de Aquino disse...

Carolino Francisco,

Escreva-me para luizdeaquino@brtubo.com.br e, por e-mail, enviar-lhe-ei o material de que precisa.

Grato,
Luiz de Aquino

Anônimo disse...

Luiz de Aquino, junto-me a você na tristeza em ver ventos secos e maléficos por sobre a vida em nosso cerrado. Que carece tanto de mais liberdade, democracia, respeito ao cidadão, ao meio ambiente.
Estamos juntos!

Anônimo disse...

Luiz, depois de recuperar-me de uma maldita gripe, volto ao seu espaço e encontro o local pegando, fogo, rsrsrs...
Luiz, conconcordo com você quando diz que o cconselho Municipal de Cultura, não faria nenhum sentido, ficando sobe o mando do titular da pasta, assim sendo, creio que seria algo meio parecido com 'os porcos assados"...
Mas você Luiz, mais do que ninguém, sabe que nunca é tarde para nada,não importando com oque tenhamos deixado de viver, nem com os erros que tenhamos cometido,im-
porta menos ainda, as oportunidades que deixamos passar, e tão puoco importa também, a nossa idade, sempre estamos na hora certa, o no tempo certo de dizermos: Chegaaaa!!!!Basta!!!
chegaaa de ploiticagem, corrupção., mentiras,e safadezas.
Chega...Bastaaa!!!! Fazendeiros não pode, sindicatos não podem, políticos não podem desrespeitar as
leis, a ética,e sujar a democracia que tanto ns custou, que tantas vidas ceifou.Chegaaaaa!!!! A hora é de reflexão, e de ouvirmos o chamado para recuperarmos a ordem e a ética. Chegaaaa!!!! Vamos ouvir nossas consciências, e atenderms o chamado para que recuperemos a ordem, o respeito as instituições, e mantermos o estado de direito,posso estar enganada, e Deus queira que eu esteja, mas penso que corremos serios riscos, cruzes!!!! Mas poeta, venhamos, e con venhamos, chegaaa de tanta violência, drogas, desordem e desmandos. Chegaaaaaaa!!!!
Luiz, parabéns por mais uma bla crônica, florzinhas só com o prefssôr Nion, rsrsrs...Verdade, Goiânia com 12 prmaveras só ele consegue, e consegue lindamente, Goiânia se transformou em princesa das flores em seus mandato, rsrrs!
Se faz urgente a preservação da cultura e do meio ambiente, mas a consciêntização do ser humano vai contra os interêsses dos poderosos.
Beijo, paz, felicidades, luzes, e sucessos sempre para você!
L G.F
Luiz, você pegou pistas de Carolina? Ahh...Siô! conta para nós, rsrsrs! Florezinhas...Se contar, rsrsrs....Planterei várias para você, principalmente Petúnias, tá?
Vaiiiii...Conta, he, he, he, he, he...

Saramar disse...

Luiz, bom dia.
Não sou intelectual nem política. Porém, percebo que os Conselhos, cuja base teórica é a participação popular e o controle social são tutelados pelos governos de plantão e seus acólitos.
Creio que fez bem em sair. Não o vejo subscrevendo decretos disfarçados.

Beijos

Anônimo disse...

Luiz apareça... quero lhe mostrar umas Atas do antigo conselho, do qual a senhora Deolinda fez parte, para vc saber o que eles diziam a seu respeito...
Marley

Anônimo disse...

Luiz,

Amei o "Bom dia, Copacabana!"

"vôo para pousar aos teus olhos,
ao radar do teu sorriso."

Achei D+

Quero sugerir também (mui humildemente) um Bom dia Inhaúma, Bonsucesso, Laranjeiras...URCA!

Isso!!

Bom dia, Urca!

Se você ainda não conhece: vale a pena conhecer...
:-)

Um forte abraço carioca!!

Rosi
[]