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quarta-feira, julho 29, 2009

Regina Viana

Regina Viana, a Deus...


Luiz de Aquino


Naquele tempo de eu-menino, uma pessoa já era quase velha na casa dos trinta anos. Talvez tenha vindo de Balzac a primeira defesa da mulher madura, por exemplo. Nos meus quarenta e sete anos, Bernardo Elis chamou-me de jovem e, ato contínuo, questionou-me se eu era ainda um jovem. Foi a primeira vez que me dei conta de que o envelhecimento estava adiado.

Manhã de quinta-feira, 23 de julho, Sandra me telefona e, entre soluços, tenta contar que Regina se foi. Sim, esclareceu ela, Regina Viana. Entendi que a amiga chegou ao ápice da dor, justo ela que vencera tantos outros momentos. Nenhum novo fato se deu para precipitar o desfecho, apenas o somatório das angústias superara o nível de tolerância.

Conheci-a durante a campanha política de 1982. Era a primeira campanha com sabor (ou consciência) de liberdade desde aquele fatídico primeiro de abril de 1964. Não nos bastava derrotar o regime do arbítrio, mas demonstrar a intensidade da insatisfação popular, e isso se deu. Deu-se também aqui em Goiás.

Desde então, firmou-se entre nós uma bela amizade. E amizade nunca vem só, por isso tornamo-nos um grupo amplo e feliz, com os percalços naturais nas relações entre as pessoas. E Regina era um pólo, ou o centro da circunferência.

Algumas vezes, descobríamos amigos comuns, como Cláudio André, o poeta pintor. Em Pirenópolis, que Regina e a mana Stela escolheram, achamos mais pontos de ligação de nossos passados em comum. Stela radicou-se lá, Regina também construiu sua casa... Por tempos, editou o jornal O Pireneus, onde publiquei boa parte das minhas crônicas (por estes dias, cuido de selecionar textos sobre Pirenópolis, com vistas a um novo livro). Foi também em O Pireneus que Lucas, meu filho, ao lado de sua amiga Clara Luna (ele, então, ainda infante, e ela no começo da adolescência) exercitaram-se como jornalistas mirins, entrevistando José Mendonça Teles.

Pedro

Lucas, aos seis anos, encontrou em Pedro, então com doze, o primeiro “amigo grande”. Pedro, filho de Regina, mudou-se para o plano superior aos quinze anos. Desde então, a mãe se vestiu da tristeza da ausência, traje de alma de que mãe alguma se desfaz. As dores de mãe foram mais fortes que o advento do avonato: uma semana antes nasceu Lavínia, filha de Carol. As fotos estão no Orkut, em sua página que se mantém aberta e ativa, como Regina Viana. Ou seja, nem mesmo essa passagem precocemente forçada a afasta de nós.

Regina, Lavínia e Carol

Regina, você não esperou... Festejou a chegada de Lavínia, sim, fez belas fotos (copiei aquela das quatro gerações, entre outras) e partiu. Nem me permitiu levar o Gabriel para conhecer a futura namorada. Também não gostei da última visita, essa que lhe fiz naquele final de tarde, na capelinha onde você parecia dormir em paz (finalmente em paz), enquanto a dor se expandia em nós.

E você, recém chegada à casa dos cinquent’anos, tão jovem...

Enfim, Regina, ficamos todos com caras de patetas inúteis. Em mim ficaram muitas perguntas, muitas intenções de conversas inacabáveis, aquelas que desenvolvíamos em torno de bons goles de cerveja e boa verve. Espere por nós, então. Pouco a pouco, vamos nos reunindo outra vez, do lado daí.




Luiz de Aquino (poetaluizdeaquino@gmail.com) é escritor e jornalista, membro da Academia Goiana de Letras.

15 comentários:

Lúcia Melo disse...

Amigo Luiz,

Vc é especial! Embora não tenha conhecido Regina e vc, pessoalmente, fiquei c/voz embargada c/singela homenagem que prestou à Regina. Deu pra sentir o cenário, a prova/amizade etc.

Tenha uma boa 4ª-feira, embora sem a presença de sua amigona Regina, as 4ªs-feiras já não sejam as mesmas, né ?

Bjs,

Lúcia Melo

Simone Arantes disse...

Nossa Luiz, que linda homenagem! Onde ela estiver, estará grata e feliz por suas lindas palavras.
Como sempre, parece que vc se supera a cada dia com seu dom de traduzir emoções.

Mara Narciso disse...

Embora fale do passamento da sua amiga, vejo que a fé, a esperança e bom relacionamento com a morte são as tônicas do seu texto. Assunto pesado e maneira leve de lidar com o fim nosso de cada dia. Achei muito bonita a maneira como você abordou a perda do filho dela. É amor e saudade para nunca acabar.

Dalcione Gomes disse...

Querido, não conheci Regina Viana, mas pela bela homenagem, percebo que era uma grande pessoa. Agradável sua maneira de dizer que nosso destido é o mesmo que de todas as pessoas; rico, pobre, branco, preto... "Pouco a pouco vamos nos reunindo outra vez, do lado daí".

Conforto aos corações que sofrem essa perda!

Unknown disse...

conheci a Rê por um periodo muito curto, mas foi o suficiente para ver nela uma pessoa extremamente carinhosa,amorosa, sempre tive o maior carinho por ela e com certeza continuo tendo, ela mora do meu ladinho esquerdo, descanse em paz minha amiga querida, gostei e gosto muito de vc. beijo carinhoso pra vc onde quer que esteja.

Andiara Louza disse...

ADOREI A CRONICA PARA REGINA VIANA,COMO É BOM MARCAR A VIDA DE UM AMIGO COM ESTA TERNURA. PARABÉNS

Sônia Marise Teixeira Silva de Souza Campos disse...

Linda. Emocionada e triste. Você é afetuoso com suas amigas. E lhes manda palavras-flores tal qual um cavalheiro à moda antiga. Bonito isso. Quando as homenageia, não é lacônico, não. Não sei se, quando as lê, o é, sempre. Comigo, tem sido meio silente, viu? Nem um comentariozinho das minhas conversas. do jornal, do VV , do livrinho...Veja bem: não espero crítica literária, esses papos. Mas um comentario, mesmo que contendo alguma crítica ou opinião seria bem-vindo. Tô meio besta hoje. Liga não. Nem responda , se lhe der na telha.
bj

Luiz de Aquino disse...

Pode ser, querida Sônia, devo mesmo estar em falta. Não comentei seu livro, que li de um fôlego e retornei para curtir por partes. Achei-o com boa qualidade literária, um tanto intimista (ou familiar) no tocante ao tema. Não sou de críticas, por não ser crítico.
Talvez me falte ante você pelas respostas breves, imediatas ou sucintas, mas isso não reduz nossa amizade. Se quer saber, a cobrança sua é a mesma da Regina, ou seja, não lhe tenho amor menor, talvez eu peque mesmo como amigo.
Agora, permita-me, quero resumir este momento no menor número de palavras. Mara Narciso comentou, linhas acima, sobre o meu modo de falar quando de eventuais ausências de amigos queridos. Eu preferia não ter escrito nada disso. Sinto que serão muito poucos os que lamentarão minha ausência, e eu preferia ter um velório de muitas pessoas.

Sílvia Neves disse...

Luiz.. eu li sua cronica hoje e me senti tão emocionada e pude perceber seu real carinho por ela... Que pessoa dinamica e linda era ela... Como pode, né????

Vânia Moreira Diniz disse...

Luiz,
Emocionei-me sinceramente com sua narrativa. Embora não a tenha conhecido sei que Regina está num lugar de muita paz. Seria injusto se isso não acontecesse.
Meu carinho, meu amigo,nesse momento muito difícil.
Minha amizade e admiração sempre grande.
Beijos
Vânia

Isto disse...

Doutor Luiz, não conheço a homenageada. Porém, já sei que onde esta moça estiver estará sorrindo largamente de felicidade por estas suas palavras, que há tempos, marcam as vidas das pessoas de bom censo.

Abraço

Marcos Carneiro

Unknown disse...

Luiz, muito obrigada pela homenagem feita para a minha mãe. Obrigada pela amizade e eterno carinho. Tenho certeza que aonde ela estiver esta muito feliz por saber de enorme amizade.
Carol

Leida disse...

Luiz, mesmo não conhecendo Regina Viana senti por suas palavras e alguns dos comentários que ela foi e sempre será especial.Poeta,sua homenagem a ela prestada como prova de AMIZADE e grande carinho é divina, leve, linda e suave. Voce descreve e lida com a temida, dolorosa, triste e inevitável PASSAGEM com segurança, sabeadoria e fé . Regina, ja em outro PLANO, deve estar muito feliz pelo ENCONTRO com seu filho PEDRO e com sua homenagem.Linda, linda. Li-a, segurando lágrimas que teimavam em rolar.


Parabéns, muita luz e paz!

Leida Gomes França

Luiz de Aquino disse...

Comentários postados no blog "Discutindo Literatura Crônicas" (http://discutindoliteraturacronicas.blogspot.com/2009/07/regina-viana.html#comments):



3 comentários:

Luciana Pessanha disse...
Luiz, meus sentimentos. Sua crônica nos aproxima da Regina viva, ela nos parece tão próxima!
Abraços, amigo

29 de Julho de 2009 16:32
Efigênia Coutinho disse...
Luiz, sua crônica , deixa nossos olhos marejados, é um momento dolorido e doloroso a perda duma pessoa amiga.
Meus sentimentos,
Efigênia Coutinho

29 de Julho de 2009 16:53
Prosa & Verso disse...
Que bela crônica, que linda homenagem de despedida à uma grande amiga!
Receba, Luiz, meu forte abraço.
Maria Lucia

30 de Julho de 2009 15:16

Maria Helena Chein disse...

Lu, li a crônica Calçadas, Viaturas e Máscaras. Você dá uma sacudida nesses assuntos tão sérios, reais e os joga para fora. E concordamos com você, cronista que fala pelos que acham, pelos que têm certeza e pelos que já se manifestaram mesmo que de uma forma menos contundente.
Agora, a crônica sobre sua amiga que se foi e que antes viu o seu filho voar para sempre, essa partiu o coração. Meu coração sempre se parte quando tomo conhecimento de tristeza assim. Bela e triste crônica.

Bjs.
Lena