Moema C. S. Olival, Aidenor Aires, Miguel Joge, Prof. Rogério Santana e Luiz de Aquino - AGL, 22/10/2015 |
Ainda
de escritores centenários
De repente,
chegamos à última semana do décimo mês de 2015 e parece, sob a ótica política e
econômica, que o carnaval ainda não chegou – se levarmos a sério a máxima de
que o ano só começa após a quarta-feira de Cinzas. Mas o ano se acaba, sim,
para o cidadão comum, o que vive de salários e que deve prestações, luta para
quitar contas de água, luz, condomínio, impostos e comida – e não falei de
segurança e saúde.
Desde o ano
passado, venho me empenhando em homenagear – e nisso vai a intenção de
preservar suas memórias – quatro grandes escritores goianos que viram a luz no
ano 15 do século passado. Os nossos quatro centenários são José J. Veiga (2 de
fevereiro), Eli Brasiliense (18 de abril), Bernardo Elis (15 de novembro) e
Carmo Bernardes (2 de dezembro).
Bernardo Elis |
Conclamei o
governador Marconi Perillo a apoiar-nos nessa empreitada. Obviamente, a missão
é, pela natureza e pelo seccionamento da máquina estatal, da competência da
Cultura – mas os órgãos capazes não se animaram. A Academia Goiana de Letras
fez a sua parte ao acatar minha propositura e na última quinta-feira, 22 de
outubro, encerrou-se a programação, estendida desde o início do ano. A seu
tempo, o poeta Aidenor Aires proferiu palestra sobre Eli Brasiliense, que o
antecedeu na Cadeira; eu próprio falei de Carmo Bernardes, de quem sou sucessor
na Academia; José Fernandes discorreu brilhantemente sobre a obra de José J.
Veiga e, a convite da Academia, o professor Rogério Santana, da UFG, discorreu
sobre Bernardo Elis, num estudo em que demonstrou pontos de encontro e
paralelismo entre a obra bernardiana e a do autor de Tropas e Boiadas (o
vila-boense Hugo de Carvalho Ramos).
José J. Veiga e eu, na Feira Hippie (Av. Goiás), em 1982 |
Concluída a fala
do prof. Rogério, o coordenador da sessão, Miguel Jorge, abriu uma Mesa
Redonda, convocando-me para falar sobre José J. Veiga e seu acervo, instalado
no SESC de Goiás, por iniciativa minha e a gratificante acolhida pelo diretor-geral
Giuglio Cysneiros, numa ação que envolveu a poetisa Sônia Maria Santos, seu
marido José Evaristo dos Santos (presidente da Fecomércio). Discorri sobre
minhas andanças, por oito anos, em busca de onde instalar o acervo do escritor
de Os Cavalinhos de Platiplanto. O resultado, estou convicto, veio à altura do
valor de José Veiga.
Eli Brasiliense |
A Acadêmica
Moema de Castro e Silva Olival mostrou, por sua vez, um belo estudo sobre a obra
Uma Sombra no Fundo do Rio, de Eli Brasiliense Ribeiro. Ela enfatizou a
plasticidade narradora do autor, pois a linguagem dá-nos uma visão
cinematográfica da história. E Aidenor Aires encerrou o evento em excelente
narração da personalidade de Carmo Bernardes. O autor de Jurubatuba tinha
incrível facilidade narradora, vindo do ofício panfletário de cunho político na
juventude, o que o conduziu ao jornalismo. Nessa profissão, Carmo publicou
contos e crônicas até mesmo em caráter diário. Tão profícuo, acabou romancista
com premiações locais, nacionais e até mesmo pela Casa de Las Americas, de
Havana (Cuba). Sua obra é rica de vocabulário sertanista, roceiro; e atende
ainda a estudos naturalistas e documentários de vivências várias, tanto no
campo quanto na cidade.
Carmo Bernardes |
O fecho, porém,
enfatizado tanto pelo professor Rogério quanto pelo poeta Aidenor, deixa-nos angustiados
– a Companhia das Letras, editora que se incumbe de republicar a obra de José
J. Veiga, reedita-o com o propósito de assegurar a continuidade de sua
divulgação. Mas Eli, Bernardo e Carmo carecem de tratamento similar.
Nesse fecho, em
aparte, enfatizei o fato denunciado pelo próprio Aidenor Aires há mais de 30
anos – sempre tiramos edições de mil livros (alguns até muito menos), e muitos
autores sofreram a tristeza do encalhe. O poeta, numa entrevista, denunciou: “Somos
muitos os escritores e não lemos nossos companheiros; se o fizéssemos, nossas
obras se esgotariam no lançamento”. E recordei que não somos lidos nem mesmo em
família, pois muitos são os parentes que inserem nossos livros em estantes sem
sequer os abrir.
E um confrade
acrescentou, irônico: “Podiam ao menos pagar-nos o custo do livro”.
***
Luiz de
Aquino é jornalista e escritor, membro da Academia Goiana de Letras.
3 comentários:
Quisera ser um drone (disfarçado de mosquitinho) e sobrevoar a sessão, observando atentamente o semblante dos seus membros, ao tecer os comentários que você narra. Que alma magnífica têm os que vivem da palavra pela palavra!👏👏👏
Caro poeta Luis de Aquino,
sem rasgação de seda, que não temos talento para isto, cumprimento-o pelo trabalho que vem fazendo de promoção de nossos escritores centenários. Você, com sua facilidade narrativa, bom contador de causos, contribui para desmistificar a figura de José Veiga, tido como escritor hermético, portanto difícil. A aproximaão com sua pessoa, a iluminação de sua figura humana instrui e pavimenta a estrada do leitor para oconhecimento de sua obra. Parabéns. Fico honrado de participar deste momento. Sei que estamos chamando a atenção para pessoas que não foram líderes políticos, empresariais, nem religiosos. Dedicaram-se à tarefa voluntária e árdua de falar pelos outros. Carregaram uma procuração ínsita de retratar paisagens, seres humanos e bichos, dramas de opressão, vida e morte. Não se pode negar a eles a permanência como raízes e troncos de nossa construção literária. Goiás, e o Centro Oeste não se reconheceriam no futuro sem as faces que Eli, Veiga, Carmo e Bernardo pintaram. Além de recordarmos o centenário de seus nascimentos, não se faria melhor justiça do que apoiar edições nacionais de suas obras, a exemplo do que está ocorrendo com J. Veiga. Se o mercado não está disposto a investir no livro fisico, avassalado pela industria do best seller, é preciso avançar no espaço virtual. O e-book, aos poucos, vai-se impondo como opção fácil de leitura. Ainda que a correta utilização do meio se sujeite ao respeito pelos direitos atorais e ao suporte de empreendedores privados ou à ação de governos. De qualquer forma, neste mundo, neste momento unico de apogeu da comunicação, não podemos concordar com a submissão ao silêncio de vozes que são vozes de multidões, como ocorrem ser as poderosas vozes de nossos escritores centenários.
Abraços,
Aidenor Aires
Escritor
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O encalhe é um fato escondido de forma pessoal, mas vivido por quase todos os autores.
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