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domingo, fevereiro 07, 2021

Vida

 

Epígrafe do livro Isso de Nós (1990): 

Uma rosa,
uma prosa
e me desfrutas!

* * * * * * * * * ** * * * * * * *


Vida

 

A força da corda
não força a sorte
nem corta o cachaço.

 

Na força da corda
o corte da forca
não solta o sanhaço.

 

Na lida e no eito
a liça e o feito
enfeitam o que faço.

 

No peito, no cio,
a vida no fio
que escorre frio
e morre no leito.

 

* * *  

Poeta Luiz de Aquino



sábado, fevereiro 06, 2021

Falar do tempo

 Falar do tempo

  

Falar do tempo,
das flores e dos ventos.
Das cores da chita, das rugas
em tecidos anarrugas,
dos pelos nas peles
de mamíferos exóticos.


Ilustr.: Roos


Falaram-me coisas
também que não cabem
nos poucos conceitos
que me foram ditos, como
a textura do pomo
do pecado que mora ao lado,
a inconveniente semente
da coisa incoesa
do amor, essa incerteza.

 

Futebol, desemprego, ruas
e becos, política e preços
nas estantes, folhas
de livros e arbustos,
a vida dos outros, a vida
que não nos é dada
e por isso é mistério...

 

Conversa de bar.
Falas vazias para evitar falar 
de amor e carência.

* * * 

Poeta Luiz de Aquino, da Academia Goiana de Letras.

sexta-feira, fevereiro 05, 2021

Cancioneiro

Cancioneiro

  

A letra A não tem meu nome,
Raul. Sou de virgem
Penso sons, faço imagens.

 

É que me valho de imagens alheias
forjadas no pó
do passado fenício.

A letra, Chico, eu tiro de gol:
só sei chutar quando escrevo. 
Ou falo.

 

Falo... Falo? Ou cérebro. 
Dizem de mim 
que não penso: “Mente”.

 

(Conservatória, RJ, 28/04/07)

* * *

Luiz de Aquino, poeta. Da Academia Goiana de Letras.

 


quinta-feira, fevereiro 04, 2021

Inconsciente

 

Inconsciente

 

Olha, fugir desta chuva
é buscar incertezas.
Fugir deste olhar
que criei pra você
é perder-se demais.

 

Momentos nossos,
surgidos do íntimo de nós dois
são pedras estranhas
em meio ao cascalho
quase inútil.
Existir outro alguém
é mero acidente.
Meus braços, cheios de abraços,
estavam aqui, sob a chuva e o sol
e a frieza dos dias só se quebrava
ao calor de meus olhos
à busca dos seus.

 

Agora,
quando você se perder
entre outros braços, quando
o sumo de um falo estranho
espumar em seus lábios,
cuidado!
Pode ser que aconteça
de meu nome surgir
num esgar de orgasmo,
gerando conflitos
desagradáveis

 * * *

Poeta Luiz de Aquino, da Academia Goiana de Letras.

quarta-feira, fevereiro 03, 2021

Poeta



Poeta

 

Se eu tiver, minha amiga,
que dizer num momento
a essência de tudo o que vi
e vivi
nos dias todos da angustiante existência,
pode ser que engane
ao definir problemas
ditos existenciais.

 

— De repente,
existo entre tantos
escolhidos pela sorte
para serem felizes.

 

Eu, com as limitações todas
da vida humilde,
tive de ser um dentre muitos
a sobreviver.

 

Talvez seja isso
o mistério indizível
de me tornar poeta
menor
pra cantar madrugadas
sem colunas
sociais.

Ilustração: Dinéia Dutra, 1984

 

* * *

Poeta Luiz de Aquino, da Academia Goiana de Letras.

O amor, bolas!

 O amor, bolas!

 

Amores são assim:
comuns, mágicos, diferentes,
depende de como chegam
ou se anunciam.

Amores novos, os de primeira vista.
Amor de tédio, os de conveniência 
de política ou patrimônio.

Rejeito amor de arranjo:
gosto mesmo é da surpresa do olhar,
do susto que me dá
um toque imprevisível
e não recuso o amor
da mulher comprometida.

Gosto do risco de vida
e do prazer da amada
que não se sente amada
na transa banal do quotidiano
em alcova trivial.

Gosto mesmo é do amor de surpresa.
Esse amor que chega sem aviso e, 
súbito, esvai-se e vai-se
sem dizer adeus.

Gosto mesmo é do amor
que não me espera chegar,
não pede o da feira
e não reclama das crianças
que nunca vieram.

Amor só presta
quando se acaba depressa.

 

* * *


Poeta Luiz de Aquino, da Academia Goiana de Letras.

segunda-feira, fevereiro 01, 2021

Moi je t'aime

Olhem só a ostentação! Por nímia gentileza do saudoso poeta e artista plástico francês M. Yvan Avenas, meu poema Eu te amo  ficou assim: 


Moi je t'aime


Moi je t'aime
de la façon innocente
de celui qui se sent poupée de chiffon
quand je te caresse
quand je te berce
pour faire dormir les petits mensonges.


Moi je t' aime de rêves
et d' espoir, je r aime éveillé
et orné de ta présence
dans les heures tristes,
pour qu' elles soient moins tristes.


J' aime ta voix et tes yeux
et tes mains amies,
et celles fraternelles que je refuse,
d' amoureuse tendresse,
d' affection et de passion.


Je t’aime distante
dans l' image-désir
d'être toujours proche.


Je t' aime en comptant les jours,
les jours qui manquent
pour que tu sois réelle : en couleurs,
en touches et en odeurs.


Moi je t' aime trop,
moi je t'aime beaucoup.
Et encore plus.




Autor: Luiz de Aquino 

Tradução: M. Yvan Avenas (poeta e artista plástico francês)