Fui escolhido, na Academia Goiana de Letras, para saudar o estudante Aurélio Sampaio Carrilho de Castro Póvoa, o vencedor do concurso “Soletrando”, do programa Caldeirão do Huck, na TV Globo. E do discurso, pincei este trecho:
“Quem aprende bem a língua, aprende qualquer coisa. Já disse, e disse isso no tempo em que fazia faculdade, há uns quarenta anos, que os vestibulares deviam se constituir apenas numa boa prova de Língua Portuguesa, com avaliação de gramática: ortografia, regência, concordância... E, para consagrar essa avaliação, de modo a se notar que o aluno candidato não colou, uma redação. A redação demonstra se o cidadão tem raciocínio lógico; se desenvolve suas idéias de modo claro; se é criativo. Com um pouco mais de sensibilidade, o avaliador poderá perceber, na redação, até mesmo lampejos do caráter do candidato”.
Sou avesso às competições, senão as esportivas. Mas sei que a gente compete todos os dias, embora prefira não ter nas disputas determinantes em tudo e para tudo. Gosto é de imaginar as sociedades futuras pautadas nas relações solidárias:
“Defendo, por isso, a grade curricular do Ensino Médio voltada muito mais para a formação humanística do cidadão. Ciências biológicas e exatas, no Ensino Médio, deviam centrar-se na vida quotidiana: biologia voltada para a Higiene e a Saúde; matemática e física com análises e aplicações na prática de todos os mortais comuns, em lugares de fórmulas mirabolantes (...)”.
Dá para se notar que, ao preparar a fala, fiquei no óbvio: senti que devia falar de educação e, inevitavelmente, de cidadania. É que, mesmo tendo visto apenas dois programas (o primeiro e o último), pude sentir que o concurso no Caldeirão do Huck saiu do trivial. Soletrar é algo meio que titibitati, chato, etc.; mas a produção soube bem conduzir a coisa e não houve enfado. Além do mais, a presença de um professor de excelente gabarito fez subir bem a qualidade (pena que o mesmo não consiga erradicar errinhos triviais da parte de alguns jornalistas e apresentadores da tevê como “há dez anos atrás”, entre outros).
O lado positivo, nisso aí, foi demonstrar que há ainda, no Brasil, ilhas de qualidade no falido ensino público. E que, com vontade e alguns recursos, é possível restaurar essa qualidade. Afinal, os professores da rede privada são, em boa parte, os mesmos do ensino público. Com as verbas devidamente entregues e aplicadas com critério, voltar-se-á ao tempo em que bons alunos iam para as escolas públicas; os fracos teriam de pagar. Talvez acontecesse boicote à rede pública. Então, com a disposição de fazer valer direitos, as ruas seriam poucas para as manifestações legítimas de resistência.
Isso também é cidadania.
E, diante do quadro emergencial que exige do Estado Brasileiro uma educação pública de alta qualidade, para que tenhamos, em poucas décadas, uma Nação da mais alta qualidade social, vou além: apelo para as autoridades da Educação e o Congresso Nacional para que modifiquem, com urgência, o perfil do ensino médio:
“Defendo também uma medida urgentíssima ante as autoridades da Educação brasileira: que todos os cursos superiores nacionais, civis e militares, sejam acrescidos de disciplinas pedagógicas, de modo a conceder, a todo portador de diploma superior, o grau de licenciatura. Esta Nação precisa de professores. E todos nós podemos e devemos ser professores. Exigem-nos diplomas que nos habilitem profissionalmente, mas é preciso até mesmo ‘diplomar’ os pais, pois são estes os primeiros educadores”.
Vale a pena pensar nisso.
9 comentários:
Caro Luiz,
Obrigado pela sua visita e comentário.
Da "vista de olhos" que dei ao seu blog, vi que é uma pessoa das letras. O que ainda mais me leva a apreciar e a agradecer o seu comentário (não tenho qualquer formação literária - sou engenheiro - e escrevo apenas para me divertir).
Deste seu post, há um parágrafo que se poderia aplicar a Portugal:
"...há ainda, no Brasil, ilhas de qualidade no falido ensino público. E que, com vontade e alguns recursos, é possível restaurar essa qualidade. Afinal, os professores da rede privada são, em boa parte, os mesmos do ensino público."
Achei também que a sua proposta das disciplinas pedagógicas, sendo inusitada, faz todo o sentido. Porque mesmo no mundo do trabalho industrial, onde me situo, esse saber será muito útil.
Bom final de semana.
Abraço.
Caro poeta Luiz de Aquino,
boa tarde/noite.
Estou com VC em sua palavras ao vencedor do soletrando -Aurélio_
Ele mereceu vencer e, ao saudá-lo, vc escreveu o básico mas, tocou naquilo que mais precisamos hoje aqui no Brasil: EDUCAÇÃO DE QUALIDADE.Não às fórmulas que nunca mais se usa. Não ao ensino de várias matérias sem nenhum nexo entre si e que nada ensinam para a vida.
O cidadão precisa ter espírito e senso crítico, coisa que nossas escolas não estão proporcionando aos alunos.
Li comentários de vários "educadores" condenando o quadro "SOLETRANDO" do programa "Caldeirão do HUCK" -será que alguns deles deram alguma contribuição maior para a educação que não seja criticar ?? Eu duvido ...
Abraço para VC.
Continue a defender uma educação de qualidade para nossos jovens porque só ai o Brasil realmente terá futuro !
Lenita Naves
Querido Luiz, a importância de saber expressar-se pelas letras confere compreensão a qualquer matéria, seja da área de humanas, exatas ou biológicas. Sou a favor de um ensino que tenha a amada "língua pátria" em alta consideração. Ainda bem que há gente das belas letras, assim como você, pela cultura brasileira!Beijos.
Ah, parabéns Luiz, por prestigiar esse menino, que é um orgulho para o país! Quem sabe agora que "deram a partida", aparecem mais concursos desse tipo? Beijos.
Palmas para Luiz de Aquino e seu homenageado. Você tem idéias e sabe como ninguém colocá-las na tela. Aprovo a sua reprovação a nossa grade curricular,e a falta de praticidade dos conteúdos dos cursos fundamental e médio. Apreciei muito a sugestão do estudo da Pedagogia em todos os cursos superiores.
De fato tudo começa com a educação, embora alguns defendam a saúde em primeiro lugar,porém sou mais a educação, pois com conhecimento automaticamente teremos melhores maneiras de alcançarmos a saúde.
PS: Fiquei atenta ao uso da mesóclise, recurso que você não gosta muito, mas ficou bem colocado até para sofisticar a homenagem.
Mara Narciso
Luiz
Educação para nós, brasileiros, hoje, está no nível do sonho de um possível retorno aos modelos educacionais bem sucedidos do passado, dos salários dignos recebidos pelos professores e da aprovação em massa pelas escolas públicas de alta qualidade que atendiam de forma satisfatória as necessidades do indivíduo, preparando-o
de forma surpreendente para um futuro totalmente imprevisível.
Inacreditável, mas hoje, as escolas particulares, aplicando os mesmos projetos pedagógicos de outrora , estão aí obtendo igual sucesso que era sim, privilégio da rede pública.
Seu texto é mais um alerta e mesmo um registro de toda a decadência da nossa Educação que um dia, foi prioridade neste país.
Parabéns a você e ao menino Aurélio.
Beijos,
Maris Stella
17/06/2007
Olá Poeta,
Gostei imensamente deste texto, "Educação e crescimento",onde, mais uma vez, pegando gancho, demonstra sua eterna preocupação com a formação do cidadão. Parabéns! Outrossim informo-lhe de que adquiri alguns livros seus na Livraria e Editora Cultura Goiana. Todos são ótimos,porém, a meu ver, cito "A noite dormiu mais cedo" com o conto, "A descoberta", como o que mais me impressionou. No mais aproveito para lhe augurar as maiores felicidades nos seus empreendimentos literários. Grande abraço!
Maurílio Alves Neto
maurilioafa@bol.com.br
Olá Luiz
Concordo plenamente que o conhecimento do idioma e a sua utilização correta é condição indispensável para a conclusão e o recebimento do diploma em qualquer curso.
Infelizmente eu não me lembro de ter tido um professor de português que eu possa ter considerado BOM. E olha que até um deles depois foi eleito para a Academia Brasileira de Letras.
Quanto ao ensino fornecido na maioria das escolas públicas é sem comentários....!
by_isa
Isa, eu tive a sorte de ter encontrado alguns bons professores de Português, sim. Felizmente!
Obrigado por comentar; e saiba que seu comentário empata com meu momento, que é questionar professores. Sempre gostei muito de professores, mas os maus professores andam aí pela ordem de 70% dos profissionais no ensino. E são eles que impedem a melhoria da Educação no País, pública e privada; e são eles que impedem, em todos os níveis, medidas que possam elevar a qualidade do Ensino, pois, se o ensino melhorar, eles perdem seus empregos.
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